O Estado de São Paulo, n. 46055, 21/11/2019. Política, p. A8

 

CCJ da Câmara aprova prisão em segunda instância

Renato Onofre

Patrik Camporez

Pedro Caramuru

Daniel Weterman

21/11/2019

 

 

Proposta que altera dois artigos da Constituição passou por 50 votos a 12 e ainda precisa ser votada em Plenário e no Senado

Gabinete. Após a votação na CCJ, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, visitou Rodrigo Maia na Câmara para discutir o momento do cumprimento de pena

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou por 50 votos a 12 a proposta que permite a prisão de quem for condenado em segunda instância. O texto, agora, será analisado por uma comissão especial. Depois, tem de ser votado em plenário em dois turnos e passar pelo mesmo rito no Senado.

Logo após a aprovação, o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro, se encontrou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Num gesto político, ele agradeceu aos parlamentares pelo empenho na votação.

“Minhas congratulações à Câmara. É importante para o nosso sistema de justiça criminal que tenha um fim no processo em um prazo razoável. Que absolva o inocente, mas que o culpado, quando reconhecido como tal, seja efetivamente punido”, disse o ministro, ao deixar o gabinete de Maia.

No início do mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que qualquer condenado só deve começar a cumprir pena quando a sentença transitar em julgado, ou seja, quando não houver mais nenhum recurso a ser avaliado. Um dos beneficiados pelo julgamento foi o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deixou a prisão em Curitiba, onde cumpria pena de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, no último dia 8.

Ao terminar o julgamento, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, afirmou que o Congresso poderia modificar o entendimento por meio de uma emenda à Constituição, pois, na opinião dele, esse artigo não é uma cláusula pétrea, o que significa que ela pode ser modificada por decisão do Parlamento.

Recursos. A PEC aprovada na CCJ ontem foi apresentada pelo deputado Alex Manente (Cidadania-SP) e modifica os artigos 102 e 105 da Constituição Federal. Se for aprovado, o texto acaba com os recursos extraordinário, apresentado ao STF, e o especial, apresentado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). De acordo com o texto, o réu só poderá recorrer até a segunda instância e, depois disso, o processo será considerado transitado em julgado.

Esta é a segunda matéria sobre o assunto apresentada pelo parlamentar, que seguiu orientação de Maia. O presidente da Câmara alertou para o risco de que, ao contrário de Toffoli, alguns ministros do Supremo poderiam interpretar que a presunção da inocência é uma cláusula pétrea e não poderia ser alterada por meio de uma PEC.

No Twitter, Manente comemorou o andamento do projeto: “Aprovamos na CCJ da Câmara após condenação em 2ª ou única instância! Grande dia”. A relatora do projeto, Caroline de Toni (PSL-SC), também celebrou a aprovação. Na rede social, escreveu: “Com muita luta conseguimos dar na CCJ uma resposta à sociedade que não aguenta mais viver no país da impunidade!”

Visita. O andamento da PEC da segunda instância na Câmara foi um dos assuntos tratados por Moro durante sua visita ao gabinete de Maia, no fim do dia. “Ainda estamos debatendo. Não tenho nenhuma novidade para relatar deste ponto. Só registrar minha congratulação à CCJ, que aprovou a volta da prisão em segunda instância”.

Na avaliação de Moro, a retomada da prisão em segunda instância é necessária para diminuir a sensação de impunidade no País. “É fundamental termos um processo mais célere e isso depende da execução em segunda instância. Então, minhas congratulações à Câmara. Previsão de reunião do grupo amanhã. A pauta da Câmara a ela pertence. O presidente Rodrigo Maia já se manifestou no sentido de aprovação neste ano.”

Senado. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado também se reuniu ontem para avaliar um projeto de lei que altera o entendimento de prisão após condenação em segunda instância. Um pedido de vista coletiva adiou a votação do projeto do senador Lasier Martins (Podemos-RS), que altera o Código de Processo Penal para determinar que ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou após decisão de órgão colegiado.

A proposta deve voltar para a pauta do colegiado no dia 27. A senadora Juíza Selma (PSLMT), relatora da proposta, apresentou parecer favorável ao projeto propondo um texto formulado por parlamentares com Moro. O conteúdo mexe em três artigos do Código de Processo Penal e depende da aprovação de maioria simples na CCJ e no plenário. Pelo menos 43 senadores já se manifestaram publicamente a favor de uma alteração da lei para permitir a prisão em segunda instância.

Reações

“É importante para o nosso sistema que tenha um fim no processo em um prazo razoável. Que absolva o inocente, mas que o culpado seja efetivamente punido.”

Sérgio Moro

MINISTRO DA JUSTIÇA E DA SEGURANÇA PÚBLICA

“Com muita luta conseguimos dar na CCJ uma resposta à sociedade que não aguenta mais viver no país da impunidade.”

Caroline de Toni (PSL-SC)

RELATORA DO PROJETO

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Decano reage a pedidos de impeachment

Rafael Moraes Moura

Breno Pires

21/11/2019

 

 

Celso de Mello vê ‘fanatismo’ nas representações contra integrantes da Corte enviadas ao Senado

Ministro. Celso de Mello é um dos alvos da Corte

Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) há mais tempo no cargo, 30 anos, Celso de Mello afirmou ao Estado enxergar “fanatismo, obscurantismo, fundamentalismo e o caráter profundamente retrógrado” entre deputados federais que pediram o impeachment dele próprio e de outros três magistrados do tribunal por terem votado para equiparar homofobia ao crime de racismo.

Conforme edição de ontem do Estado, o número de pedidos de impeachment contra ministros do Supremo apresentados ao Senado em 2019 já superou o recorde anual – são 14, cinco a mais do que em 2018. O principal alvo neste ano é o presidente da Corte, Dias Toffoli, com 7 representações.

Uma dessas representações contra ministros – assinada por 11 deputados, majoritariamente do PSL – é a que pede a destituição de Celso de Mello, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes, por “conduta incompatível com a dignidade e o decoro do cargo”, apontando que “legislam no lugar dos parlamentares”, “em desacordo com a separação dos poderes”.

Celso de Mello definiu o pedido como “esdrúxulo”, sem fundamentação jurídica adequada, e reagiu aos parlamentares. “O comportamento desses denunciantes, que parecem ser apologistas do ‘pensamento único’, resulta de uma visão totalitária e obscurantista que não tolera nem admite posições contrárias à sua distorcida e retrógrada visão de mundo”, afirmou.

Decano do Supremo, o ministro tornou-se o principal portavoz em defesa da instituição diante de ataques disparados contra ministros do tribunal. Manifestações no último domingo pediram o impeachment do ministro Gilmar Mendes e do ministro Toffoli.

“Eis a que ponto chegaram o fanatismo, o obscurantismo, o fundamentalismo e o caráter profundamente retrógrado de tais denunciantes, considerado o fato de que se revela inacreditável acusar-se um Juiz pelo exercício regular (e legítimo) da atividade jurisdicional.”

Os 14 pedidos de impeachment contra ministros do Supremo apresentados em 2019 não tiveram sequência dada pelo Presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Cabe a ele dar início à tramitação ou arquivá-los. Alcolumbre tem resistido à pressão para pautar os processos e adota um discurso de conciliação para evitar embates com o Supremo.