Correio braziliense, n. 20502, 09/07/2019. Economia, p. 7

 

Previsão de novos cortes

Thaís Moura

09/07/2019

 

 

Conjuntura » Secretário de Fazenda do Ministério da Economia afirma que muitas pastas “não têm números” para chegar até dezembro e que é necessário rever gastos. Governo deve reduzir a projeção de crescimento do PIB

O governo deverá anunciar um novo contingenciamento — bloqueio de repasses a órgãos públicos — até o fim do mês, de acordo com o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues. Segundo ele, “uma quantidade considerável de ministérios não tem números suficientes para chegar até dezembro”, e, por isso, será necessário rever os gastos públicos para evitar um aumento no rombo fiscal. No entanto, não foi revelado o tamanho do novo corte, muito menos as áreas que serão atingidas.

O contingenciamento deverá ser anunciado com o Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, programado para até o dia 22, segundo o secretário. Ele confirmou também que a pasta deve rever a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2019, na quinta-feira. Atualmente, está em 1,6%, quase o dobro da atual mediana das estimativas do mercado, de 0,82%. “O valor está deslocado das estimativas de mercado. Reduziremos essa projeção para algo entre 0,8% e 1,2%”, disse. Rodrigues participou ontem de um seminário sobre contas públicas organizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) em Brasília.

Ao justificar o novo corte e a redução da previsão de crescimento da economia, Rodrigues afirmou que, “como a despesa pública continua com um valor próximo do que havia sido programado”, é provável que o Ministério da Economia sofra uma pressão fiscal. “Quando a variação do PIB é declinante, as receitas também, em média, declinam”, explicou.

O corte de despesas é necessário para evitar aumento no rombo das contas públicas. A meta fiscal deste ano, prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), permite deficit primário do governo federal de até R$ 139 bilhões. Este é o sexto ano consecutivo em que as contas da União estão no vermelho.  “Temos um deficit primário do governo federal muito grande. Os estados e os municípios estão com dificuldades fiscais. Assim, o financiamento público fica com gargalo. O nível de investimento deste ano deve ficar muito baixo, teremos uma performance similar à do ano passado em relação ao financiamento, quando o valor foi o menor da série histórica”, afirmou o secretário.

Fontes privadas

Como forma de manter recursos de serviços e órgãos públicos, ele propõe que o país adote mais fontes privadas de investimento. “No segundo semestre, teremos, por determinação do ministro Paulo Guedes (Economia), o anúncio de uma série de medidas que trabalharão em prol disso.”

De acordo com o secretário, o governo deve anunciar algumas medidas para evitar mais cortes e cobrir parte do valor que precisará ser contingenciado, como o uso de reservas orçamentárias (atualmente em R$ 1,5 bilhão), estratégia adotada no último relatório. Sem dar mais detalhes sobre o uso de reservas, o secretário negou futuras elevações na carga tributária. “Zero elevação de impostos”, garantiu. Nesse sentido, o secretário da Fazenda também propôs o aumento da contribuição privada e redução do crédito de bancos públicos. Segundo ele, é possível que a Caixa Econômica Federal tenha R$ 20 milhões no total devolvidos em instrumentos híbridos.

“A proposta do governo é de uma liberal democracia, com a propriedade privada sendo atendida. Por isso, temos que atender a alguns princípios, como o tratamento do crédito. Entendemos que o crédito deve ser fortemente reformatado no sentido de termos um financiamento privado muito mais proeminente do que o público, para aumentar as contribuições privadas. Hoje, o total de crédito como percentual do PIB do país é de 47%. A esperança é que, até o fim do governo, isso esteja em 50% ou em 60%”, disse. A estimativa do secretário é de um crescimento do deficit primário nos próximos três anos, caso as medidas colocadas não sejam estabelecidas.

Frase

"O nível de investimento deste ano deve ficar muito baixo, teremos uma performance similar à do ano passado”

Waldery Rodrigues, secretário de Fazenda do Ministério da Economia

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Incentivo à oferta

09/07/2019

 

 

 

 

Reduzir o enorme rombo fiscal das contas públicas passa pela retomada do crescimento da economia e pela melhoria dos gastos públicos. Sugestões para atingir esse objetivo foram debatidas ontem durante o seminário do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).

Além do secretário de Fazenda, Waldery Rodrigues, participaram do evento Rodrigo Orair, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), Hélio Tollini, consultor na Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, e os pesquisadores associados do Ibre-FGV e professores da Universidade de Brasília (UnB), Nelson Barbosa e Manoel Pires.

Rodrigues entende que a economia deve ser incentivada, pelo lado da oferta, e não pela demanda. “Devemos incentivar a oferta e combater a má alocação, porque isso implica improdutividade”, afirmou. Em contraponto, Barbosa reforçou que há um problema forte de demanda no país. “Temos um desemprego elevado, capacidade ociosa elevada na indústria, inflação no piso da meta. Nossa economia sofre insuficiências de demanda. E é possível que o governo faça mais de duas coisas ao mesmo tempo, como aprovar reformas, melhorar a legislação e atuar na demanda do curto prazo”, argumentou o ex-ministro da Fazenda, defendendo redução na taxa básica de juros (Selic), atualmente em 6,5% ao ano.

Para Barbosa, “a reforma da Previdência está acabando com todo estoque de argumentos do Banco Central para não reduzir as taxas”. Ele propôs que o governo Jair Bolsonaro crie uma “PEC do Investimento”, que libere uma conta fixa por quatro anos para ser realocada em infraestrutura, transportes, desenvolvimento urbano, pavimentação e habitação, que, segundo ele, são os principais geradores de empregos.

Helio Tollini aproveitou o seminário para discorrer sobre os instrumentos fiscais adotados por países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como a Suécia, e propor novas medidas para o Brasil nesse sentido. “O que os países da OCDE fazem diante de crises fiscais é trabalhar com um cenário associado ao médio prazo. E por que trabalhar com o médio prazo e não com o curto, como é feito aqui? Porque a grande maioria de decisões relativas a despesas públicas têm impactos que vão além de um ano”, afirmou o consultor legislativo. (TM)