Valor econômico, v.19, n.4729, 12/04/2019. Especial, p. A12

 

Bolsonaro assina 18 atos ao celebrar 100 dias de governo 

Fábio Pupo

Carla Araújo 

Fabio Murakawa 

12/04/2019

 

 

Em uma cerimônia para 400 convidados no Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro assinou 18 atos para marcar os cem dias de governo, entre eles um novo projeto de lei de autonomia do Banco Central. Nas 35 metas que haviam sido fixadas pelo governo para o período havia uma sugestão genérica relacionada ao tema com a previsão de "seguir o modelo vigente em economias avançadas, garantindo a independência do Banco Central".

Apesar de esperado também para a marca dos 100 dias, o 13º do Bolsa Família ainda não possui um instrumento legal para ser validado. A medida, que é uma promessa de campanha de Bolsonaro, ainda não foi assinada, mas mesmo assim Bolsonaro usou o Twitter para exaltar a "oficialização" da 13ª parcela dos beneficiários do programa.

Segundo o Planalto, o pagamento terá um impacto fiscal de R$ 2,58 bilhões. O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que o governo vai reservar a quantia por meio de uma reunião futura da Junta de Execução Orçamentária (que reúne Casa Civil e Ministério da Economia).

O governo ainda estuda qual o instrumento jurídico adequado para cumprir a promessa. Uma opção é editar uma medida provisória em outubro para que o pagamento possa ser feito ainda em 2019. Segundo o Ministério da Cidadania, caso a reforma da previdência seja votada até outubro, a ideia é instituir o pagamento do benefício por Projeto de Lei. Caso contrário, a iniciativa acontecerá por uma medida provisória.

Apesar de destacar que conseguiu cumprir as 35 metas propostas para os três primeiros meses do governo, há ações que ainda estão em fase muito incipiente, como a redução de tarifas do Mercosul, a reestruturação da EBC e o sistema anticorrupção, em relação ao qual a Controladoria-Geral da União (CGU) ainda está elaborando um diagnóstico da situação e em interlocução com outros órgãos.

Em um discurso de pouco mais de cinco minutos, Bolsonaro não detalhou os atos e as ações do governo. Preferiu repetir que não sabe o que fez para estar na Presidência da República e afirmou que pede orientações a Deus para governar.

"E eu pergunto a Deus de vez em quando: 'O que eu fiz para estar aqui?' E eu peço a ele mais do que sabedoria, eu peço força, coragem e determinação para que nós bem possamos juntos cumprir essa missão com esse país maravilhoso chamado Brasil. Nós temos que acreditar em nosso país e nós acreditamos nele", afirmou.

Além do PL de autonomia do BC, entre os atos assinados está o chamado "revogaço", com a anulação de 250 decretos de administrações passadas considerados já "implicitamente revogados ou com a eficácia ou validade prejudicada".

De acordo com o Planalto, a medida visa "reduzir a base normativa brasileira" e "faz parte de um processo contínuo da Casa Civil que irá revogar tudo que for considerado desnecessário e, então, garantir a democratização do acesso à legislação ao cidadão". Dos 250 decretos revogados, 98 são do Ministério da Economia e 80 do Ministério da Defesa.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que "o governo foi realista, humilde e trabalhador" ao elencar 35 metas para os primeiros cem dias de governo. O ministro disse isso ao responder se o governo havia sido ambicioso ao estipular esse volume de objetivos, nem todos eles cumpridos.

"A única ambição que o governo tem é fazer os brasileiros e brasileiras mais felizes", disse. "Primeiro, andando seguro, daí o projeto de lei anticrime do ministro Moro", afirmou. "Depois, ter emprego. [...] A outra coisa importante é fazer o Brasil prosperar."

Após a cerimônia no Palácio do Planalto, o ministro da Casa Civil disse a jornalistas que o governo está aprendendo a construir um novo caminho de relacionamento com o Parlamento. "Quem não quer o toma lá dá cá é a população brasileira", disse Onyx. "Essa transição está sendo do bem. Todos os 12 líderes de partidos que vieram conversar com o presidente disseram: 'nós não queremos cargo'", afirmou. "Ou seja, nós temos um novo momento. Vamos encontrar um caminho em que os parlamentares se sintam respeitados."

Para o ministro, "o Congresso é feito de homens e mulheres que amam o Brasil". "Temos clareza de que tudo o que ele [presidente Jair Bolsonaro] quer fazer depende da autorização do Congresso brasileiro, que legitimamente representa a nossa sociedade", afirmou.

Bolsonaro assinou também um decreto que institui a Política Nacional de Alfabetização. O texto estabelece diretrizes para futuras ações e programas do governo que terão como objetivo uma "drástica redução do analfabetismo, em território brasileiro, no âmbito das diferentes etapas e modalidades da educação básica".

Há ainda um decreto que aprova a nova Política Nacional de Drogas. O texto distribuído pelo governo afirma que o ato tem por objetivo estabelecer uma nova política "a partir das conclusões do Grupo Técnico Interministerial instituído pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad)".

O governo também assinou um projeto de lei que altera a legislação ligada ao Bolsa Atleta. O projeto não foi divulgado em detalhes por enquanto. Mas o governo afirmou em texto que a o texto da lei está "sendo aprimorado, com a finalidade de expandir o alcance do programa para o pleno desenvolvimento das capacidades esportivas de seus beneficiários".

Na lista de atos assinados, ainda está uma proposta de decreto que muda dois instrumentos previstos na legislação ambiental: o processo sancionador ambiental e o programa de conversão de multa simples em serviço de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. Segundo o governo, o objetivo é "tornar a cobrança mais ágil".

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Presidente assina proposta que prevê autonomia do BC

Carla Araújo

Fábio Pupo

Fabio Murakawa 

Fabio Graner 

Raphael Di Cunto 

12/04/2019

 

 

Aguardado com expectativa pelo mercado e prometido pelo presidente Jair Bolsonaro, o projeto de lei complementar sobre a autonomia do Banco Central foi assinado ontem de manhã pelo presidente no evento que marcou os cem dias do governo. Esperado para sair em edição extra do "Diário Oficial" ainda ontem, até o início da noite, porém, o texto não havia sido publicado.

Segundo fontes do governo, problemas na fórmula de lucro do BC e também relacionadas ao Orçamento estariam atrasando a publicação do texto. A Casa Civil, no entanto, nega divergências e diz que o texto estava em ajustes finais burocráticos e que seria publicado, no máximo, no "Diário Oficial da União" de hoje.

O projeto não prevê o status de ministro para o presidente da autoridade monetária, mas "algumas garantias" serão conferidas aos dirigentes, informou o subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Jorge Oliveira. Pela proposta, o mandato do presidente do BC será de quatro anos, com uma possível recondução para mais quatro anos.

Na exposição de motivos do projeto, o governo argumenta que, "para assegurar que o Banco Central continue desempenhando esse papel de maneira robusta e com segurança jurídica, mostra-se necessário consagrar em lei a situação de facto hoje existente, na qual a autoridade monetária goza de autonomia operacional e técnica para cumprir as metas de inflação definidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)".

Em tese, a autonomia elimina a possibilidade de interferência política nas decisões do BC. Segundo o atual presidente da autoridade, Roberto Campos Neto, a obtenção da autonomia formal é uma das prioridades de sua gestão, por possibilitar que a taxa de juros estrutural seja menor, com as mesmas condições financeiras.

Conforme havia antecipado o Valor, o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, explicou que a decisão em criar um novo projeto de lei voltado à autonomia do BC foi para evitar que o texto que já tramita no Congresso fosse questionado juridicamente. A avaliação do Planalto é que poderia ser acusado um "vício de iniciativa" se a autoria fosse do Legislativo, já que existe um dispositivo constitucional que determina que temas como a autonomia da autoridade monetária devem ser propostos pelo presidente da República.

O ministro salientou que o texto redigido pelo Executivo é "muito semelhante" ao já negociado na Câmara dos Deputados. No Congresso, ambos devem ser apensados. "Esse projeto vale para corrigir um problema de vício de iniciativa e seguramente vai haver um apensamento para agilizar a tramitação. Interessa ao Brasil que haja um guardião das metas, independentemente de governo", disse Onyx.

Candidato derrotado à Presidência em 2018 e pré-candidato ao cargo em 2022, Ciro Gomes (PDT) disse ontem que a população não deve aceitar o projeto de autonomia do BC. "É o caso de a gente ir para a rua quebrar tudo", disse. O pedetista afirmou ainda que o projeto será "entregar para a banca privada" a decisão sobre a taxa de juros e política monetária e que isso será muito danoso para o país. "Isso é a violenta e definitiva entrega da nação a três bancos", acusou.

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Ensino domiciliar será examinado em projeto de lei 

Carla Araújo

Fábio Pupo

Fabio Murakawa 

12/04/2019

 

 

O presidente Jair Bolsonaro assinou ontem um projeto de lei (PL) para regulamentar o ensino domiciliar. Inicialmente, a ideia do governo era usar uma medida provisória para o tema, mas, segundo fontes, além de minimizar possíveis questionamentos jurídicos com o PL, a ideia foi evitar problemas para a tramitação da reforma da Previdência, já que MPs podem trancar a pauta do Congresso. Dos 18 atos assinados ontem pelo presidente não há nenhuma MP.

O projeto de ensino domiciliar constava nas metas dos 100 dias de governo do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que coordenou a formulação da proposta, em conjunto com técnicos do Ministério da Educação. O PL assinado por Bolsonaro prevê que o estudante matriculado em educação domiciliar será submetido, para fins de certificação da aprendizagem, a uma avaliação anual sob a gestão do Ministério da Educação. "As avaliações anuais serão aplicadas a partir do 2º ano do ensino fundamental, preferencialmente no mês de outubro", diz o texto.

Em setembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, por não haver lei regulamentando a prática, os pais não podem tirar os filhos da escolha para ensiná-los em casa. O relator, ministro Luís Roberto Barroso, foi o único a entender que o "homeschooling" era compatível com a Constituição, mesmo sem lei aprovada no Congresso, mas foi vencido. A maioria dos ministros, porém, admitiu que a prática poderá se tornar válida se for aprovada uma lei que permita avaliar não só o aprendizado, mas também a socialização do estudante educado em casa.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que alterou o instrumento jurídico para a proposta do ensino em casa, pois os assuntos que envolvem educação "são complexos" e o governo se preocupou com possíveis obstáculos no Congresso, como "enfrentamento da visão de esquerda que existe no Parlamento". Para ele, a proposta terá "bastante obstáculo" porque a oposição pode usar de todos artifícios regimentais "que eu como oposição usei muito".

Onyx afirmou que foi uma medida de segurança porque a MP tinha riscos. "E as famílias que optaram por este método? E as crianças que são o mais importante vão ficam sem salvaguarda? Vão ficar sem ano escolar? Foi uma medida de segurança. O objetivo era dar a escolha aos pais, mas a MP tinha riscos".

Para a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, o governo entende que o direito dos pais decidir sobre a educação dos seus filhos "é uma questão de direitos humanos.

"É plena a liberdade de opção dos pais ou dos responsáveis legais entre a educação escolar e a educação domiciliar, nos termos do disposto nesta lei", diz o texto. "É dever dos pais ou dos responsáveis legais que optarem pela educação domiciliar assegurar a convivência familiar e comunitária", completa.

O projeto assegura a isonomia de direitos entre os estudantes em educação escolar e os estudantes em educação domiciliar. "Fica assegurada aos estudantes em educação domiciliar a participação em concursos, competições, avaliações nacionais instituídas pelo Ministério da Educação", diz o texto.

Os responsáveis legais não poderão optar pela educação domiciliar ou perderão o direito à opção quando o estudante for reprovado nas avaliações anuais e nas provas de recuperação, em dois anos consecutivos ou em três anos não consecutivos.

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Líder do governo diz que reforma pode ficar para o 2º semestre 

Cristian Klein

Cristiane Agostine 

12/04/2019

 

 

Ao lado do presidente Jair Bolsonaro, o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO) afirmou ontem que a aprovação da reforma da Previdência no Congresso pode ficar só para o segundo semestre deste ano. Bolsonaro e o parlamentar defenderam a aprovação da proposta que altera a aposentadoria durante um pronunciamento transmitido ao vivo pelo Facebook.

O deputado disse que o governo espera "votar e aprovar" na próxima semana, no dia 16 ou 17, o relatório sobre a reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Em seguida, o texto deve seguir para a Comissão Especial que tratará do tema e para o plenário. "A nossa intenção é que a gente consiga aprovar a nova Previdência nas duas Casas no máximo no fim deste semestre, no início do semestre que vem, para que os reflexos fiscais dessa aprovação se deem ainda neste ano", afirmou Major Vitor Hugo.

O presidente vinculou a continuidade do pagamento das aposentadorias à aprovação da reforma da Previdência. "Somente com a nova Previdência você que já está aposentado pode ter certeza de que vai receber sua aposentadoria até os últimos dias de sua vida. E para quem está no mercado de trabalho ainda é a certeza de que você, quando for se aposentar, vai receber os seus proventos de aposentadoria. Somente dessa forma", afirmou. "Por isso nós precisamos aprovar a nova Previdência." A reforma da Previdência foi o último tema tratado por Bolsonaro em sua transmissão de quase 36 minutos pela rede social e o presidente gastou menos de 30 segundos sobre o tema.

Mais cedo, no Rio, para uma plateia de 120 pastores "pesos-pesados", que diziam representar 90% dos evangélicos do país, Bolsonaro sequer falou da reforma da Previdência. O encontro serviu de prestação de contas. O presidente afirmou que a promessa de campanha de transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém está mantida, mas que será necessário tempo. "Assumi aquele compromisso. E obviamente queremos concluir esse compromisso. Mas, como um bom casamento, vamos ter que namorar, ficar noivo, e, no meu caso, ver se a noiva realmente me merece, e partir para o casamento", disse, durante a reunião anual do Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos do Brasil (Cimeb).

O encontro da cúpula evangélica teve como mestre de cerimônia o pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que vem cobrando a transferência da embaixada para Jerusalém. A promessa, porém, esbarra na reação de países árabes, que ameaçam interromper a compra de produtos de exportação do Brasil, sobretudo a carne.

Bolsonaro afirmou que também está em contato com estes países e relatou um jantar que teve anteontem com "embaixadores muçulmanos", a convite da ministra da Agricultura Teresa Cristina. "São países que mantêm negócios bilionários conosco. Eu falei que esse nosso relacionamento comercial seja fortalecido e, mais ainda, se transforme cada vez mais em paz e amor", disse.

Ao Valor, depois do almoço, Malafaia afirmou que confia no cumprimento da promessa de mudança da embaixada, mas pontuou que a prioridade dos evangélicos, atualmente, não são assuntos religiosos ou a pauta de valores. "A prioridade agora são estas questões da reforma da Previdência, do emprego, isso afeta todo mundo. Estamos preocupados com o que está acontecendo no país. Agenda moral a gente decide no Congresso, não precisa de presidente. Na outra legislatura, com a força conservadora menor, [os progressistas] não conseguiram aprovar nada. É agora que vão?", disse.

O pastor disse que, em conversa com Bolsonaro, o presidente demonstrou preocupação em "consertar o Brasil". "Ele me falou: 'Silas, se não houver uma reforma da Previdência, daqui a pouco não vai ter dinheiro para nada". No almoço, Bolsonaro reencontrou o ex-senador Magno Malta, braço-direito na campanha mas excluído do ministério. "Espero encontrar brevemente com ele e que nós nunca mais nos afastemos", disse. Também estavam presentes os presidente do Senado, Davi Alcolumbre, do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, e o governador do Rio, Wilson Witzel.