O Estado de São Paulo, n. 45992, 19/09/2019. Economia, p. B3

 

Com juro menor, renda fixa vira 'seguro'

Renato Jukitas

Márcia de Chiara

19/09/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Para ganhar dinheiro, investidor terá de abrir mão de liquidez ou assumir riscos, com produtos como ações, apontam analistas

A queda na taxa de juros Selic, que ontem registrou novo piso histórico, forçará o aplicador brasileiro, habituado à renda fixa, a fazer escolhas mais difíceis, se não quiser ver o patrimônio andando de lado. Para conseguir algum ganho, de acordo com especialistas, ele terá de abrir mão da liquidez (deixando o dinheiro aportado por mais tempo no mercado financeiro) ou assumir riscos extras para sua carteira, com produtos como ações e fundos imobiliários – sujeitos a oscilações e não isentos de prejuízos.

Para o superintendente de portfólios de investimento do Itaú Unibanco, Victor Vietti, o que agora sobra para o investidor pessoa física é uma carteira com opções cada vez mais enxutas (e similares) dentro da renda fixa, aquele investimento em que o dinheiro é aplicado com uma garantia mínima de retorno após um determinado tempo. “A renda fixa sempre terá mercado, mas a gente está recomendando aplicação em Bolsa desde o final de 2018”, diz.

Produtos como CDBs, fundos DI e poupança, na opinião da coordenadora do curso de economia do Insper, Juliana Inhasz, vão virar uma espécie de “seguro” para o patrimônio do investidor. “Esquece essa história de ganhar dinheiro com o CDB. Essas aplicações servem para repor as perdas com inflação, variações cambiais.”

Já Gilberto Abreu, diretor de investimentos do banco Santander, diz que o investidor deve aprender a olhar para o mercado financeiro evitando fazer comparações com o passado. “É um mundo novo, e ainda bem. Renda fixa paga pouco no mundo inteiro. O que acontecia no Brasil era uma incorreção do nosso mercado.”

Em simulação para o Estado, a economista Paula Sauer, professora da ESPM e planejadora financeira da Planejar, chama atenção para o bom resultado projetado para os produtos com vencimento de longo prazo (acima de cinco anos). Destaque para as Letras de Crédito (tanto imobiliárias, as LCIs, quanto de agronegócio, LCAs). “O que garante o bom resultado desses produtos é a isenção do Imposto de Renda. E, mesmo assim, o porcentual de CDI que serve de remuneração para as letras está atrelado ao prazo. Quanto maior o prazo sem mexer no dinheiro, melhor a remuneração”, observa.

Dados do buscador de investimentos Yubb apontam que, dos cerca de 1 mil LCAs e LCIs lançados recentemente, só 2% (171 produtos) apresentam retorno acima de 114% do CDI. “As letras poderiam ser classificadas como boas alternativas. Mas como elas são títulos lançados por empresas para financiar projetos de investimentos, e hoje eles estão escassos, está mais difícil encontrar esse papel no mercado”, conta Bernardo Pascowitch, do Yubb.

Caderneta. Com a nova queda na Selic, a poupança, principal destino do dinheiro do brasileiro, perdeu atração. O investimento, que até então rendia 4,20% ao ano, superando assim boa parte dos fundos de renda fixa, recuou para 3,85%, um pouco acima da inflação, estimada em 3,60% pelo último relatório do Banco Central. Os fundos DI, que administram uma carteira de renda fixa, também ficaram para trás. Alguns deles, em função da taxa de administração, chegam perder para a inflação por quase 1 ponto porcentual. Já no Tesouro Direto, os títulos de curto prazo atrelados à Selic ficam muito próximos à poupança. A recomendação aqui, mais uma vez, são títulos de médio e longo prazo, acima de 12 meses, atrelados à inflação.

DE OLHO NAS RENDAS FIXAS E VARIÁVEIS

CDB

Atenção à oferta de banco médio

Assim como as opções de renda fixa, os CDBs estão em queda livre, acompanhando o movimento da Selic. No entanto, títulos vendidos pelos bancos de médio e pequeno portes ainda superam a inflação e ficam na dianteiras entre as opções com garantia do FGC para aportes de até R$ 250 mil.

POUPANÇA

Empate técnico com a inflação

Queridinha do brasileiro, o investimento, que rendia 4,20% ao ano, superando assim boa parte dos fundos de renda fixa comercializados pelo mercado, recuou para 3,85%, um pouco acima da inflação que, segundo o último relatório do Banco Central, foi estimada em 3,60%.

LCI e LCA

Bom retorno, mas difícil de ver

O resultado projetado para as Letras de Crédito Imobiliárias e do Agronegócio (LCAs) parece atraente, mas o porcentual de CDI que serve de remuneração para as letras está atrelado ao prazo. Outro ponto: esse é um produto difícil de encontrar no mercado financeiro.

FUNDO DI

Caro e com um baixo retorno

Apesar do movimento recente de algumas empresas que reduziram as taxas dos fundos de renda fixa atrelados ao CDI, ainda há no mercado um volume majoritário de opções que cobram taxas de administração acima do 1%, o que faz com que muitos percam para a inflação.

TESOURO DIRETO

Títulos estão em queda livre

O retorno dos três tipos de papel do Tesouro Direto (Selic, IPCA e os prefixados) estão em queda, acompanhando o movimento de cortes da taxa Selic. Os mais indicados são os de longo prazo (mais de 12 meses), atrelados ao índice oficial de inflação, o IPCA.

AÇÕES

Bolsa lidera as recomendações

A Selic mais baixa reduz o custo financeiro das empresas, o que anima o mercado por uma melhora no ambiente de negócios. Esse é um dos porquês das ações liderarem as recomendações dos gestores. Setor, no entanto, tem forte oscilação e o investidor precisa ter apetite para o risco.

FUNDOS IMOBILIÁRIOS

Queda nos juros favorece setor

A queda da Selic impulsiona o crédito habitacional, o que faz dos fundos de imóveis uma opção atraente. No ano, o índice com os principais fundos registra alta de 13%, 24,42% nos últimos 12 meses, com baixa oscilação. Mercado, contudo, é complexo.

FUNDOS MULTIMERCADO

Porta de entrada para o risco

Em agosto, os fundos de multimercado (que misturam renda fixa a renda variável no mesmo pote) captaram, líquidos, R$ 6,2 bilhões. Segundo os especialistas, o resultado é motivado por brasileiros que começam a experimentar um pouco mais de risco.