O Estado de São Paulo, n. 45998, 25/09/2019. Política, p. A12

 

Moro elogia e Doria critica fala na ONU

Thiago Faria

Paula Reverbel

25/09/2019

 

 

NA TRIBUNA DAS NAÇÕES UNIDAS / Citado, ministro da Justiça classifica discurso de Bolsonaro como ‘assertivo’; governador de SP diz que o texto foi ‘inadequado’ e ‘inoportuno’

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) – dois nomes já cotados para a disputa presidencial de 2022 –, emitiram opiniões opostas sobre o discurso do presidente Jair Bolsonaro na 74.ª Assembleia-Geral das Nações Unidas, ontem. Citado pelo presidente, Moro classificou o discurso como “assertivo”. Já Doria afirmou que o texto lido por Bolsonaro foi inadequado” e “inoportuno”.

O ministro da Justiça elogiou a abordagem de temas como “soberania, liberdade, democracia, abertura econômica, preservação da Amazônia, oportunidades e desenvolvimento para a população brasileira”. Moro se manifestou ontem em seu perfil no Twitter. “Na ONU, PR @jairbolsonaro reitera ao mundo seu compromisso contra o crime e a corrupção”, escreveu o ex-juiz da Lava Jato.

No discurso, Bolsonaro creditou a Moro o julgamento e a punição de “presidentes socialistas que me antecederam”, a quem ele acusou de desviar “centenas de bilhões de dólares comprando parte da mídia e do Parlamento”. Quando era juiz federal de Curitiba, Moro sentenciou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que hoje cumpre pena. O petista já discursou na ONU em 2003, 2004, 2006, 2007, 2008 e 2009.

Durante entrevista coletiva ontem em São Paulo, o governador João Doria disse que o discurso de Bolsonaro não teve “referências que pudessem trazer respeitabilidade e confiança ao Brasil, no plano ambiental, no plano econômico e no plano político”. “Lamento que o presidente tenha perdido mais uma oportunidade para o Brasil”, declarou o governador, para quem a fala do presidente brasileiro estava carente de “bom senso” e “humildade”.

Para a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, candidata derrotada nas três últimas eleições presidenciais, Bolsonaro tentou “negar a realidade dos fatos”. Para Marina, o presidente “atacou os povos indígenas ao contestar a liderança do cacique Raoni, como se fosse peça de manobra de governos estrangeiros, e sugeriu o absurdo de que as queimadas na Amazônia podem ter sido causadas por uma prática cultural dos índios e das populações locais”.

Congresso. O discurso do presidente em Nova York dividiu opiniões no Congresso. Para parlamentares alinhados ao governo, a fala de Bolsonaro foi “própria de estadistas”, enquanto opositores demonstraram desconforto com o tom adotado na assembleia da ONU.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) classificou o discurso como “deplorável”. Para ele, Bolsonaro errou gravemente ao atacar povos indígenas. “Envergonhou o Brasil, rompeu a tradição multilateral brasileira, atacou nações amigas do Brasil tradicionalmente, como a França. Se colocou sujeito aos Estados Unidos e não teve a reciprocidade no discurso seguinte, de Donald Trump.”

O PT divulgou nota em que classificou o discurso como “de um deprimente espetáculo”. “O Partido dos Trabalhadores teve a honra e a responsabilidade de levar dois presidentes à ONU e ambos – Lula e Dilma Rousseff – proclamaram na Assembleia-Geral os valores da paz, do diálogo entre povos”, diz o texto. No lugar disso, segundo o comunicado, “Bolsonaro despeja seu ódio virulento”.

Já o deputado Marco Feliciano (Podemos-SP), aliado do presidente, avaliou o pronunciamento como “histórico”. “Nosso Brasil entrou, definitivamente, para o grupo das nações que ditam os rumos da humanidade!”, escreveu o parlamentar em seu perfil no Twitter. 

Impressões

“Discurso assertivo, pontos essenciais, soberania, liberdade, democracia, abertura econômica, preservação da Amazônia, oportunidades. (Bolsonaro) reitera ao mundo seu compromisso contra o crime e a corrupção”

Sérgio Moro

MINISTRO DA JUSTIÇA

“Primeiro, inadequado. Segundo, inoportuno. Terceiro, sem referências que pudessem trazer respeitabilidade e confiança ao Brasil no plano ambiental, econômico e político. Quarto, péssima repercussão internacional.”

João Doria

GOVERNADOR DE SÃO PAULO

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Discurso histórico, diz Orleans e Bragança

Pedro Venceslau

25/09/2019

 

 

Vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara diz que ONU luta contra ‘Deus, pátria e família’

Avaliação. Orleans e Bragança: fala foi ‘objetiva e direta’

Primeiro vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara e descendente da antiga família real brasileira, o deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP) classificou como “histórico” o discurso feito ontem, em Nova York, pelo presidente Jair Bolsonaro durante a abertura da 74.ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Foi um discurso histórico que teve como base Deus, pátria e família. Isso é novidade para a ONU, que luta contra esses conceitos. Foi um discurso que defendeu o combate pela soberania”, afirmou o parlamentar do PSL ao Estado.

Na pré-campanha eleitoral de 2018, o hoje deputado chegou a ser anunciado como candidato a vice na chapa de Jair Bolsonaro. Mais tarde, também foi cotado para ser ministro das Relações Exteriores.

Na avaliação do parlamentar, a fala do presidente na ONU não foi agressiva, como avaliaram alguns especialistas. “O discurso foi uma ruptura com tudo o que escutamos no contexto da ONU: uma fala objetiva e direta.”

Orleans e Bragança também sustentou a tese de que a esquerda ainda mantém uma forte influência no continente e, por conta disso, precisa ser combatida – fazendo coro com Bolsonaro, segundo o qual o Brasil esteve próximo, no passado recente, de se tornar um país socialista.

“Meu país esteve muito próximo do socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção generalizada, grave recessão econômica, altas taxas de criminalidade e ataques ininterruptos aos valores familiares e religiosos que formam nossas tradições”, afirmou o presidente brasileiro, em trecho inicial do discurso lido na abertura do encontro da ONU.

‘Mentalidade’. Segundo o deputado do PSL, ainda existiria no Brasil uma “mentalidade socialista hegemônica e progressista” nas escolas, clubes e universidades.

“A elite brasileira se tornou progressista e socialista”, afirmou ele. “Os países mais livres têm o mesmo problema em comum: a influência do socialismo de Estado que leva a um freio da atividade econômica,” disse o deputado.

Amazônia. Sobre o trecho do discurso de Jair Bolsonaro que tratou da Amazônia, o deputado do PSL sustentou que as queimadas existem, mas estariam sob controle e não teriam registrado crescimento na comparação com anos anteriores. “Isso não é um fato relevante. Houve incêndios criminosos. Mas fica a dúvida: foi motivação política ou a iniciativa de fazendeiros locais? O fato é que não há crise ambiental no Brasil”, disse ele.

Em sua fala na ONU, Bolsonaro afirmou que tem “compromisso solene” com a proteção da Amazônia e da floresta, que é maior do que toda a Europa Ocidental e “permanece praticamente intocada”.

Ele elogiou ainda a aproximação política do Palácio do Planalto com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “O discurso de Bolsonaro estava em consonância com o do presidente Trump. Ambos defendem os valores da consciência cristã. A maioria das nações que nascem criadas com valores cristãos valoriza a família, a lei e a ordem.”

‘Novidade’

“Foi um discurso histórico que teve como base Deus, pátria e família. Isso é novidade para a ONU.”

Luiz Philippe de O. e Bragança

DEPUTADO (PSL-SP)

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'Fala mostra nova modelagem política e ideológica do País'

Juliana Braga

25/09/2019

 

 

O senador Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da comissão que avaliará a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) à Embaixada do Brasil em Washington, afirmou que o discurso do presidente Jair Bolsonaro na ONU demonstrou “uma nova modelagem política e ideológica do Brasil”.

“Defendeu a soberania nacional, dizendo que os problemas relativos ao Brasil quem deve cuidar são os brasileiros, que tem gente capacitada e pronta para resolver e apresentar as soluções”, disse Trad. “Certeza de que o Brasil vive um novo momento e conseguirá, através do estreitamento das relações diplomáticas, advir novos relacionamentos comerciais para o desenvolvimento da nossa gente.”

O senador, que acompanha a comitiva do presidente em Nova York, comanda a Comissão de Relações Exteriores no Senado, que sabatinará Eduardo. Trad disse que não tratou desse assunto na viagem.

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Amazônia pauta 'vatapá da Fafá'

Pedro Venceslau

Cecília Ramos

25/09/2019

 

 

Fáfá de Belém / Cantora quer levar ‘grito’ para Círio de Nazaré

Anfitriã. Fafá de Belém, na cozinha de seu apartamento

Principal referência do movimento Diretas Já, amiga de políticos de várias colorações partidárias, a cantora Fafá de Belém quer agora transformar a defesa da Amazônia em um grito de guerra dos milhões de fiéis do Círio de Nazaré, uma das maiores festas religiosas do mundo que acontece em outubro na capital paraense.

Anteontem, esse foi o tom do tradicional “vatapá da Fafá”, banquete de comidas e bebidas típicas que ela oferece uma vez por ano a convidados em seu apartamento em São Paulo. Entre patas de caranguejo, cumbucas de tacacá e drinks com cupuaçu, a cantora ressaltou que este ano o Círio acontece quando a Amazônia está “no centro do mundo”. Há nove anos Fafá se tornou uma espécie de madrinha e garota-propaganda do Círio, quando freta um barco para levar políticos e celebridades na procissão fluvial.

Questionada sobre seu voto em 2018, Fafá garante que não votou em Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial. Em tempo: o então candidato do PSL ganhou de Fernando Haddad (PT) em Belém. “Pelo amor de Deus, né? Eu não votei em ninguém. Olhei aquele quadro e falei: Não dá pra mim”, disse, evitando críticas mais diretas ao presidente.

A cantora costuma ser cuidadosa ao falar de políticos e ecumênica nas amizades com o poder. Em uma mesa da sua sala repousa em destaque o livro Marimbondos de Fogo, de José Sarney. Helder Barbalho (MDB), governador do Pará, um dos patrocinadores da sua “Varanda de Nazaré”, é chamado por ela de “Helderzinho”. “Eu o conheci com 3 anos, quando Jader (Barbalho) foi candidato em 1982”, afirmou.

Fafá disse que foi “muito perseguida” depois da campanha de Tancredo Neves “pela direita e pela esquerda juntas”. “Eu não fecho com quem não acredito. Por isso que eu olho e vejo um vazio de fundamento tanto para Bolsonaro quanto para o cara que é contra ele. O desmatamento da Amazônia vem de muito tempo. O MST desmatou muito. Então a culpa é do Bolsonaro? Não vejo que a culpa é dele. Ele deixou que queimassem em homenagem a ele.”

Se pisa em ovos ao falar de Bolsonaro, Fafá é contundente ao criticar o PT e o ex-presidente Lula. “Eu me sinto traída pelo Lula. Ele era a esperança. No segundo mandato tinha no governo todos aqueles que lutamos para tirar nas Diretas. Essa é a grande decepção”, afirmou.