O Estado de São Paulo, n. 46002, 29/09/2019. Política, p.A8

 

Aras afirma que atitude de Janot é ‘inaceitável’

 

 

 

Rafael Moraes Moura

Idiana Tomazelli

29/09/2019

 

 

Procurador-geral diz que Ministério Público está acima dos desvios de seus integrantes

 

Rafael Moraes Moura

Idiana Tomazelli / BRASÍLIA

 

EVARISTO SA / AFP - 25/09/2019

Fake news. O novo procurador-geral da República, Augusto Aras, deve rever posição da PGR sobre o inquérito no Supremo

 

O novo procurador-geral da República, Augusto Aras, classificou em nota como “inaceitáveis” as atitudes do ex-PGR Rodrigo Janot, que revelou ao Estado ter ido armado ao Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de matar a tiros o ministro Gilmar Mendes. Apesar disso, o recém-nomeado ao posto máximo do Ministério Público Federal (MPF) afirmou que o fato “não tem o condão de macular” a instituição.

“O Ministério Público Federal é uma instituição que está acima dos eventuais desvios praticados por qualquer um de seus ex-integrantes”, diz Aras no comunicado. O novo procurador-geral afirma ainda confiar nos colegas, “homens e mulheres dotados de qualificação técnica e denodo no exercício de sua atividade funcional”.

Segundo Aras, o MPF continuará cumprindo “com rigor” sua missão. “Os erros de um único ex-procurador não têm o condão de macular o MP e seus membros”, afirma a nota.

As declarações do novo ocupante da cadeira que já foi de Janot se somam às críticas até mesmo de ex-auxiliares do antigo PGR. Ex-secretário-geral do MPF na gestão de Janot, o procurador regional da República Blal Dalloul disse ao Estadão/Broadcast que as declarações do ex-chefe são “uma das páginas tristes para a história do Ministério Público, e sua revelação nada traz de positivo”.

Janot disse ao Estado que, no momento mais tenso de sua passagem pelo cargo, ingressou armado no Supremo para matar Gilmar. “Não ia ser ameaça, não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar) e depois me suicidar”, afirmou o ex-PGR. Anteontem, o Supremo determinou buscas em endereços de Janot e uma pistola foi apreendida. Ele teve o porte de arma suspenso, foi proibido de entrar na Corte de se aproximar de ministros do tribunal.

“Estou realmente chocado com essa revelação. Não imaginava que tal situação tivesse acontecido, e minha formação não admitiria conhecimento sem veemente discordância”, disse Dalloul, que ficou em terceiro lugar na lista tríplice da categoria para a escolha do novo procurador-geral – ignorada pelo presidente Jair Bolsonaro, que indicou Aras. “É preciso perdoar e amar muito mais. Inclusive por e pela instituição tão maior do que qualquer das suas pessoas”, acrescentou.

 

Reação. A declaração do ex-chefe chocou não apenas Dalloul, como também outros ex-auxiliares ouvidos pela reportagem. A reação entre as pessoas que compuseram a equipe do ex-procurador-geral e até de quem permaneceu como amigo após a gestão foi péssima.

O fato está sendo tratado como indigno e inaceitável. Um desses integrantes disse ao Estado que já havia escutado um comentário de Janot de que tinha apenas pensado em matar o ministro do Supremo, mas entendeu que era uma bravata. Para ele, o fato de a declaração ter vindo no contexto de venda de livro é ainda pior, mais vergonhoso. Até o motivo, crítica à filha, foi citado como “ridículo”.

Outro ex-auxiliar de Janot disse estar preocupado com os reflexos das declarações do exchefe na “institucionalidade” do Ministério Público. Para ele, o ex-procurador-geral agiu “de forma incompatível com o estágio civilizacional”.

A operação de buscas nos endereços do Janot foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no Supremo para apurar ofensas, ameaças e fake news contra integrantes do STF. Em entrevista ao Estado em maio, Aras sinalizou que iria rever a posição da sua antecessora, Raquel Dodge, sobre o inquérito. Ao contestar o fato de as investigações ocorrerem sem o acompanhamento do Ministério Público, Raquel pediu o arquivamento do caso, mas acabou ignorada.

 

Efeito

“Os erros de um único ex-procurador não têm o condão de macular o Ministério Público e seus membros.”

Augusto Aras

PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA