Valor econômico, v.19, n.4698, 26/02/2019. Política, p. A8

 

Maia crítica aumento de tempo de contribuição e justifica atraso na CCJ 

Carolina Freitas 

Marcelo Ribeiro 

Raphael Di Cunto 

26/02/2019

 

 

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou o trecho da proposta de reforma da Previdência que aumenta de 15 para 20 anos o tempo mínimo de contribuição para que um trabalhador possa se aposentar. A medida está prevista no texto enviado na semana passada ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro. "O aumento é muito duro para o brasileiro mais simples, é muito pesado na base da sociedade", afirmou Maia em evento em São Paulo, promovido pela Fundação Getulio Vargas e pelo jornal "Folha de S.Paulo". "Se 70% dos brasileiros já não conseguem cumprir os 15 anos e se aposentam com um salário mínimo, imagina fazendo essa mudança muito rápida de 15 para 20."

Maia deixou claro ontem que, para aprovar a reforma, o governo vai ter de flexibilizar a proposta e limitá-la aos pontos com "apoio majoritário". A questão do tempo mínimo de contribuição vem se somar a outras já apontadas como sensíveis pelo presidente da Câmara, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a aposentadoria rural. A fala de Maia em São Paulo foi pela manhã. À tarde, o ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou Maia para uma reunião. Na sequência do encontro com Guedes, Maia convocou os líderes para uma reunião reservada sobre Previdência, na segunda-feira pós-carnaval.

O deputado pressionou o governo para que envie o quanto antes para a Câmara o projeto de lei com as alterações para a aposentadoria das Forças Armadas. Ontem à tarde em Brasília, Maia negou que condicione a instalação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na Câmara -a primeira por onde a reforma tramita- à chegada na Casa do PL dos militares. A instalação, porém, esperada para esta semana, ficou para depois do carnaval. "A eleição dos presidentes das comissões não se dará amanhã [hoje], porque eu não consegui fechar a parte de baixo das comissões. Por isso, atrasou", disse Maia em Brasília.

Segundo ele, "o governo ainda não está organizado na CCJ para aprovar a admissibilidade da PEC". Na palestra em São Paulo, Maia criticou a forma como o governo pretende construir maioria para votar a Previdência, por meio de bancadas temáticas. Para o deputado "as bancadas temáticas são mais caras que os partidos" porque a agenda desses grupos temáticos se concentra na manutenção e ampliação de benefícios fiscais.

Em São Paulo, Maia falou sobre a resistência dos parlamentares em analisar a PEC sem conhecer o PL dos militares. "Atrasa de fato a tramitação da emenda constitucional, porque há uma compreensão no parlamento de que todos os setores da sociedade precisam estar incluídos na reforma", afirmou. Ele garantiu que só votará o texto dos militares depois da PEC da Previdência.

Maia disse ver possibilidade de aprovação da reforma da Previdência no início de maio na Câmara. Ele vinha colocando como prazo junho, ao passo que o Presidente do Senado, Davi Alcolumbre, falava em abril. Sobre o descompasso nos cronogramas, disse: "Final de abril ou início de junho é parecido. Ele [Alcolumbre] está no início de maio e eu, no final de maio. Fico com o otimismo de Alcolumbre [aprovação no início de maio]."

Maia disse sentir a mesma percepção sobre a necessidade de mudanças no texto do governo por parte de outros líderes na Câmara. Segundo ele, tratam-se de pontos de apelo social usados "com muita competência" pelos partidos de esquerda para confrontar a reforma da Previdência. "O importante é retirar o que, do ponto fiscal, não está ajudando e, do ponto de vista político, está contaminando", afirmou.

Para o presidente da Câmara, o déficit na aposentadoria rural se resolveria com combate a fraudes no sistema. Já a proposta para o BPC "é um risco". "Está mais inviabilizando a aprovação da reforma do que ajudando o brasileiro fora do sistema", disse. O presidente da Câmara avalia que esses dois pontos contaminam o debate com governadores de partidos de esquerda, como PT e PSB. Ele citou como exemplo os governadores da Bahia, Rui Costa (PT); do Ceará, Camilo Santana (PT); de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB); e do Piauí, Wellington Dias (PT). "Esses governadores têm muita compreensão da importância da votação e querem participar. BPC e aposentadoria rural tiram força desses governadores na base dos seus partidos. Eles perdem a condição de ajudar porque a pressão com esses dois temas acaba ficando muito forte", afirmou Maia.

O presidente da Câmara, deputado há 21 anos, fez um alerta ao governo Bolsonaro, sobre a importância de arregimentar votos pela Previdência na oposição. Até agora, o Planalto patina na articulação política pela reforma. "Os governadores do Nordeste têm votos que o governo não têm. Hoje os partidos de oposição têm número maior de deputados do que na legislatura passada. São 140. Se você perder um partido de 30, 40 deputados, acabou. Fica muito difícil aprovar", disse Maia. "Se conseguirmos 20 votos da oposição, nossa chance de aprovar a Previdência aumenta muito."