Correio braziliense, n. 20482, 19/06/2019. Economia, p. 6

 

Devolução do BNDES segura dívida pública

Hamilton Ferrari

19/06/2019

 

 

Conjuntura » Desde 2015, banco de fomento transferiu R$ 339 bilhões para o Tesouro. Isso permitiu que o débito bruto do governo esteja em 78,8% do PIB, em vez de 84,2%. Especialistas alertam que dinheiro é finito é que é preciso aprovar a reforma previdenciária

Sem a devolução de recursos do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Tesouro Nacional, a dívida bruta federal estaria em 84,2% do Produto Interno Bruto (PIB), frente aos atuais 78,8%. De 2008 a 2014, a estatal recebeu dinheiro do governo para fomentar o crescimento econômico e, desde então, devolve anualmente parte do que foi aplicado para minimizar os danos causados às contas públicas. No fim do último mês, a União recebeu R$ 30 bilhões do banco de desenvolvimento. O Ministério da Economia trabalha para obter mais R$ 70 bilhões até o fim de 2019.

Com o último repasse feito, o BNDES transferiu R$ 339 bilhões ao Tesouro de 2015 até agora. Isso diminui a expansão da dívida bruta nos últimos anos. O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse, há duas semanas, que o governo está empenhado em cumprir a promessa de campanha de “despedalar” os bancos públicos e anunciou, em conjunto com o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, a devolução de R$ 3 bilhões ao Tesouro.

Caberá ao novo presidente do BNDES, Gustavo Montezano, a missão de ajudar o governo federal a fechar as contas. A legislação brasileira ainda não tem um limite aprovado para o estoque de dívida, mas a reversão da trajetória de endividamento é essencial para o reequilíbrio fiscal. O orçamento está sendo sufocado por gastos previdenciários e pela folha de pagamento dos servidores. No ano passado, o governo desembolsou R$ 1,351 trilhão ao todo, sendo R$ 586 bilhões para pagar aposentadorias e pensões e R$ 294 bilhões, para salários. Ou seja, 65% do total das despesas da União são para as duas rubricas.

Somado a isso, o Orçamento é engessado, porque apenas 6% dos gastos são discricionários — aqueles que o governo tem opção de definir. O restante é obrigatório, ou seja, vinculados e indexados a áreas ou fundos específicos. Desde 2014, o Brasil não sabe o que é fechar as contas no azul. O deficit recorrente põe em xeque a sustentabilidade fiscal do país e se faz necessária a aprovação de medidas de ajuste, como a reforma da Previdência, que evitará a expansão do rombo e, consequentemente, o colapso dos serviços públicos.

Marcel Balassiano, pesquisador sênior da área de economia aplicada do FGV Ibre, explica que, se a reforma da Previdência não for aprovada, o risco país, medido pelo CDS (Credit Default Swap), que atualmente está abaixo de 200 pontos, aumentará fortemente. “O câmbio, que já não está em nível baixo, também subiria ainda mais e isso tenderia a elevar a inflação. As expectativas ficariam desancoradas e os juros também aumentariam. É um cenário bem dramático para o país”, afirma.

Para o analista, o quadro é tão grave que a dívida pública passaria de 100% do PIB em 2023, em cenário sem aprovação da reforma. “O nosso problema é o fiscal e precisa ser solucionado. Estamos no quinto ano consecutivo de deficit nas contas públicas. Por isso que a reforma é tão importante”, diz Balassiano. O Ministério da Economia informa que, na atual agenda do governo, “a reforma previdenciária é extremamente importante para vislumbrar-se a melhoria dos resultados fiscais”. “Complementarmente, medidas de contenção do aumento de despesas obrigatórias, como as de pessoal, bem como medidas que possam reduzir a rigidez das despesas e a forte vinculação de receitas estão no radar da equipe econômica”, comunica.

Questão de tempo

Para reduzir a dívida pública, o BNDES anunciou que haverá o pagamento contratual de R$ 23 bilhões aos cofres públicos. O Tesouro estima receber o valor em parcelas regulares dos contratos. “Desse valor, cerca de R$ 9 bilhões já foram recebidos, restando para os meses seguintes aproximadamente R$ 14 bilhões”, informa o Ministério da Economia. O saldo devedor do banco com a União agora é de R$ 238,1 bilhões.

A quantia será fundamental para destravar o pagamento de despesas do governo nos próximos anos. A economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour, entretanto alerta que os recursos do BNDES são finitos e “não mudam a trajetória explosiva da dívida”. “Sem a reforma da Previdência acima de R$ 600 bilhões ou R$ 700 bilhões, o Brasil entra em colapso fiscal independentemente de quanto o BNDES devolver. Sem o controle dos gastos, o Brasil é insolvente, é só uma questão de tempo”, alerta.

A analista ressalta ainda que, caso o texto de reforma aprovado tenha impacto fiscal menor que R$ 500 bilhões em 10 anos, o investimento esperado na economia não será concretizado. “A sensação é de uma reforma incompleta. Vamos deixar o Brasil mais três anos no limbo e abrir espaço para a volta de políticas heterodoxas”, afirma.

Equilíbrio

Fábio Klein, analista da Tendências Consultoria, estima que o Congresso Nacional aprove uma reforma com metade do impacto fiscal previsto no texto encaminhado pelo governo. “Nesse cenário, a nossa dívida continuará a subir até meados de 2023, quando começará a cair novamente”, diz. Os juros do país também têm efeito no endividamento. Apesar de a taxa Selic estar no menor nível da história (6,5% ao ano), também contribui para o avanço do estoque de pendências.

O endividamento está em R$ 3,917 trilhões, segundo dados de abril do Tesouro Nacional. Só neste mês, as despesas com juros aumentaram o volume em R$ 35,72 bilhões. A expectativa da equipe econômica é de que o estoque chegue a quase R$ 4,3 trilhões até o fim do ano. Se a reforma da Previdência não for aprovada, o Banco Central (BC) pode ser obrigado a aumentar os juros para controlar a inflação, ampliando o buraco fiscal do governo.

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Devedores são credores

19/06/2019

 

 

 

 

A Justiça de São Paulo acatou ontem o pedido de recuperação judicial da Odebrecht. Com dívidas de R$ 98,5 bilhões, a companhia pediu na segunda-feira, 17, a maior recuperação judicial da história do país. Considerado um dos maiores impérios empresariais que o Brasil já teve, o grupo vinha sofrendo repetidos reveses desde que virou um dos pivôs da Lava-Jato.

O pedido abrange 21 companhias, incluindo as controladoras Kieppe e ODBinv, e, no total, R$ 83,6 bilhões poderão ser renegociados judicialmente. As empresas operacionais, como Engenharia e Construção, Enseada e OR, ficaram de fora.

Entre os grandes credores do conglomerado estão ex-executivos da empresa que firmaram acordos de delação premiada. Nessa lista, apenas Emílio Odebrecht tem R$ 69 milhões em garantias a receber, fora R$ 11 milhões de incentivos de curto prazo e outro crédito de R$ 1,4 milhão. O filho dele, Marcelo, que cumpre prisão domiciliar, consta como tendo direito a embolsar R$ 16,2 milhões do grupo do qual é controlador.

Um dos responsáveis pelo Setor de Operações Estruturadas, responsável pelo pagamento de propinas do conglomerado, Hilberto Mascarenhas tem R$ 24,6 milhões a receber em incentivos de longo prazo. Ligado ao mesmo setor, o ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura Benedito Barbosa aparece com direito a R$ 14,4 milhões. Assim como esses, outros executivos também se beneficiarão de pagamentos.

A parte

A Odebrecht conseguiu isolar as participações do grupo na Braskem, Atvos e Ocyan de execuções de credores, que tem empréstimos garantidos pelas mesmas, de acordo com o deferimento do pedido de recuperação judicial encaminhado na segunda-feira pelo grupo à Justiça. A consultoria financeira Alvarez&Marsal, que já é administradora-judicial da Atvos, aparece no documento como responsável também por conduzir o processo do grupo.

O juiz João de Oliveira Rodrigues Filho afirma, no deferimento, reconhecer como bem essencial ao soerguimento da atividade do grupo as ações das três empresas, durante o stay period, ou seja, os 60 dias para apresentação de um plano aos credores de recuperação. “Se tratam de ativos com alto potencial de negociação no mercado, de modo a permitir que as operações financeiras e as atividades operacionais consigam subsistir por meio de eventual aporte de capital com a negociação de tais ativos”, diz o juiz no documento em que acatou o pedido de recuperação judicial da Odebrecht.

As ações da Braskem e as participações na Atvos e Ocyan estão legalmente fora do processo de recuperação judicial, porque são garantias dadas em empréstimos bancários tomados pelo grupo.

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Bolsa próxima dos 100 mil

Gabriela Tunes

 

 

19/06/2019

 

 

 

O cenário externo favorável ditou os passos do mercado ontem. As declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no Twitter, de que havia conversado com o presidente chinês Xi Jimping, sinalizando uma melhora nas relações com o país oriental, foram determinantes para que o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) encerrasse o pregão próximo dos 100 mil pontos, 99.404, com alta de 1,82%. O bom humor atingiu também o dólar que se desvalorizou 1% ante o real, fechando cotado a R$ 3,86

Para Álvaro Bandeira, economista-chefe e sócio do Modal Mais, o tuíte de Trump direciona positivamente para entendimentos entre as duas potências. Os dois líderes mundiais têm encontro marcado na reunião da cúpula do G20, na próxima semana, no Japão.

Também influenciou positivamente o mercado as declarações do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, sobre estímulos adicionais caso a Zona do Euro não melhore. Ele afirmou que o BCE está disposto a usar todos os meios disponíveis, incluindo corte nas taxas de juros, para alavancar a economia da região.