Correio braziliense, n. 20477, 14/06/2019. Brasil, p. 7

 

Escassez de água ameaça 73 milhões

Simone Kafruni

14/06/2019

 

 

Seminário » Gestão de recursos hídricos precisa ser aprimorada para evitar que grande parcela da população brasileira enfrente restrições no consumo em 2035. Entre os desafios, estão o tratamento de esgotos e o manejo de resíduos sólidos

O risco econômico da escassez da água no Brasil pode chegar a R$ 518,2 bilhões em 2035, ano em que 73,7 milhões de brasileiros terão restrição no consumo, se nada for feito para melhorar a gestão dos recursos hídricos. O alerta foi feito pelo ministro de Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, durante o Seminário Segurança Hídrica, realizado ontem pelo Correio com apoio da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa).

Apesar de o Brasil ter 12% da água doce do mundo, o que é uma riqueza competitiva, segundo o ministro, os desafios são muito grandes. “No país, 67% da água é destinada à irrigação, 9% para consumo humano, 9,5% para indústria e 11% para consumo animal. E, mesmo com essa riqueza, 60,9 milhões de brasileiros vivem com baixa oferta do recurso”, disse. Um dos problemas, é que o país produz grande carga de lançamento de esgotos domésticos e industriais. “Deveríamos cuidar melhor dos esgotos e do manejo dos resíduos sólidos”, afirmou.

Canuto ressaltou que o saneamento, hoje, é um tema de extrema relevância. “Felizmente, o Senado Federal teve uma resposta muito rápida, com a caducidade da MP nº 868/2019, apresentou um projeto de lei (PL). O ministério vai apresentar outro para apensar ao que existe, para que possamos colocar a ANA (Agência Nacional de Águas) como agência definidora das normas de referência”, assinalou.

Para o ministro, a proposta aprovada no Senado é boa porque cria uma regra de transição para as companhias estaduais, permite o investimento privado, o que deve levar à universalização do sistema. “Mas sem a presença da ANA, uma das pernas, que é a uniformização, a segurança jurídica dos contratos de programas que virão a ser prorrogados, fica capenga. Há necessidade premente de que esse PL do MDR seja anexado para que tenhamos a proposta completa”, destacou.

Plano nacional

Canuto falou sobre os fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, a partir da Lei nº 9.433/1997, que define a água como um bem de domínio público, recurso natural limitado dotado de valor econômico. “Na sua escassez, os usos prioritários são consumo humano e animal. A gestão deve ser descentralizada e participativa e proporcionar o uso múltiplo das águas, sendo que a bacia hidrográfica é a unidade territorial principal”, assinalou.

Para enfrentar a escassez, sobretudo no Nordeste, o MDR está implementando 166 ações. Do total, nove ainda precisam de análise, 62 necessitam de ajustes, mas 95 estão no ponto. “Desses, 50 estão em execução, 22 com projeto básico, oito em projeto executivo e 15 em anteprojeto”, enumerou. O valor total é de R$ 26,9 bilhões nas obras, sendo R$ 15,7 bilhões no Nordeste. “Essas infraestruturas vão mudar radicalmente a segurança hídrica do país”, acrescentou.

Frase

"Apesar de o país ter 12% da água doce do mundo, 60,9 milhões de brasileiros vivem com baixa oferta do recurso”

Gustavo Canuto, ministro do Desenvolvimento Regional

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Padrão de consumo precisa mudar

 

 

 

 

 

Augusto Fernandes

14/06/2019

 

 

 

Apesar de viver quase dois anos em meio a uma crise hídrica, com 513 dias de racionamento, a população brasiliense ainda não mudou radicalmente o padrão de consumo de água. Segundo a Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), o volume consumido no Distrito Federal nos quatro primeiros meses de 2019 foi 10,1% maior que o registrado no mesmo período do ano passado, quando ainda vigoravam os cortes semanais no abastecimento.

Enquanto de janeiro a abril de 2018 foram consumidos 46,3 milhões de metros cúbicos de água, no mesmo intervalo deste ano os brasilienses utilizaram 51 milhões de metros cúbicos, muito próximo do que foi registrado em 2016 (52,7 milhões de m³), antes da crise hídrica. Por conta disso, representantes do órgão pediram mais consciência à sociedade. Presidente da Adasa, Paulo Salles comentou, durante o seminário no Correio, que os hábitos aprendidos durante o racionamento não podem ser esquecidos.

“O consumo de água no DF um ano após o fim do racionamento exige reflexão. As boas práticas aprendidas no período crítico de abastecimento devem prevalecer, e novas medidas, como o reúso e o aproveitamento da água de chuva, devem ser adotadas”, afirmou Salles. Ele ressaltou que “não bastam os reservatórios cheios para garantir a segurança hídrica”. “Temos de poupar nos momentos de abundância. É preciso mudar o comportamento para tratar a água com respeito e responsabilidade”, disse.

Segundo a Adasa, os afluentes que abastecem os principais reservatórios de Brasília reduziram os índices de vazão entre 25% e 60% durante o período de escassez e ainda não voltaram ao normal. “As pessoas acham que, com os reservatórios cheios, podem usar água como bem entenderem. Mas não é assim. Temos que continuar trabalhando para aumentar a resiliência de nossos sistemas e garantir a segurança hídrica para a população”, destacou o diretor da agência Jorge Werneck.

Companha

Na próxima semana, a Adasa vai lançar uma campanha sobre o consumo racional do recurso, intitulada “Use, reuse, economize & repita”. “Hoje, a situação hídrica é muito melhor do que aquela vivenciada entre 2016 e 2018, contudo, ainda é pior do que a média histórica. Portanto, é importante continuar avançando na implementação de instrumentos de gestão, nos investimentos em infraestrutura e no uso racional de água no DF”, afirmou Werneck.

O secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal, José Sarney Filho, alertou para a necessidade de se cuidar dos mananciais para diminuir a escassez de água no futuro. “A água não nasce no reservatório. A água está nas nascentes, depois corre para pequenos riachos, daí para rios e, só então, se faz um reservatório”, esclareceu.

_________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Caesb amplia investimento

14/06/2019

 

 

 

O presidente da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), Carlos Augusto Lima Bezerra, ressaltou que a crise hídrica no DF foi provocada primordialmente por fatores climáticos, mas mostrou as fragilidades gerenciais e de infraestrutura do sistema de abastecimento do Distrito Federal.

“As fragilidades gerenciais foram causadas por problemas financeiros na Caesb, que se refletem ainda hoje nos números da companhia. As deficiências de infraestrutura foram atacadas com obras de captação, que fizeram o DF superar a grave crise hídrica entre 2016 a 2018”, disse.

Além dos reservatórios do Descoberto e Torto/Santa Maria, a Caesb dispõe de uma rede de abastecimento de 8.855 km, com extensão de abrangência equivalente ao estado de Santa Catarina. São 11 estações de tratamento, que atendem a 99% da população, o equivalente a 3 milhões de pessoas. As obras ampliaram a capacidade de produção em 15% e permitiram maior interligação entre os sistemas. A capacidade passou de 9,4 mil litros para 10,8 mil.

Ainda em andamento, o subsistema Gama, com capacidade de 320 litros por segundo, tem previsão de conclusão de 90% em setembro. O sistema de Corumbá IV, com capacidade de 1,4 mil litros por segundo na 1ª etapa, tem previsão de entrega de 90% em dezembro. O sistema do Lago Paranoá, ainda em projeto, prevê um investimento, na 1ª etapa, de R$ 275 milhões e capacidade de 2.1 mil litros por segundo. O total de investimentos em produção de água é de R$ 826 milhões. (IS)

____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Uso deve ser mais eficiente

 

 

Ingrid Soares

14/06/2019

 

 

 

A segurança no uso dos recursos hídricos passa pela aprendizagem com experiências anteriores, como a situação de reacionamento vivida pelo Distrito Federal e por outros estados da Federação, como São Paulo. “Nossa relação com a água tem que ser pedagógica. Não podemos  esquecer o passado de crise, e precisamos poupar na época de abundância, disse a diretora-presidente da Agência Nacional das Águas (ANA), Christianne Dias, no seminário Segurança Hídrica, realizado no Correio Braziliense.

“Vivemos em um país em que buscamos o desenvolvimento econômico e a prosperidade social. E isso passa, necessariamente, pela maior eficiência no uso dos recursos hídricos. A disponibilidade de água é um fator preponderante para que o desenvolvimento aconteça. Também é preciso cautela com as mudanças climáticas. É preciso ampliar a eficiência do uso da água pelos diferentes usuários”, observou.

Christiane Dias explicou ainda que a ANA é a responsável pela implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), também conhecida como Lei das Águas, que define como o Estado deve realizar a apropriação e o gerenciamento dos recursos hídricos no país. Ela lembrou que, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Regional, a agência lançou, em abril, o Plano Nacional de Segurança Hídrica, cujo objetivo é assegurar a disponibilidade da água em padrões de qualidade adequados ao uso atual e para futuras gerações, além de promover a prevenção e defesa contra eventos hidrológicos críticos.

“Esse plano é norteador para os investimentos de infraestrutura no nosso país. O apelo é para que todos, em visão equilibrada de governo, coloquem esse plano em evidência para que sirva como norte para a tomada de decisão. Precisamos trabalhar com previsibilidade, enfrentando os momentos de seca e os de inundações e cheias que nos afetam de modo trágico em determinado período do ano”, concluiu.