O globo, n.31392, 19/07/2019. Rio, p. 11

 

Golpe no cartel do tráfico 

Carolina Henringer 

19/07/2019

 

 

A polícia investiga se as armas e a s drogas apreendidas ontem na Maré chegaram ao complexo de favelas pela Baía, o que faz da comunidade um importante entreposto para o tráfico do Rio e estaria por trás dos frequentes tiroteios pela disputa do controle da região. A operação policial, que começou pela manhã, terminou com um dos maiores resultados da história recente do estado. Foram 8,5 toneladas de drogas, 31 armas, das quais 23 eram fuzis, e 75 granadas, além de munição. Parte dos fuzis estava dentro de três contêineres num depósito na Nova Holanda, próximo à Avenida Brasil, uma das favelas do conjunto.

—Percebemos que, em algumas comunidades que beiram a Baía de Guanabara, há uma disputa territorial que não se explica pela venda da droga em si, mas muito mais por ser um entreposto, um local importante de recebimento da droga — disse o delegado titular da Delegacia Especializada de Armas, Munições e Explosivos (Desarme),

Marcus Vinicius Amim, durante coletiva de imprensa na tarde de ontem.

Os confrontos durante a operação foram tão intensos que um bala perdida atingiu de raspão uma auxiliar de enfermagem no oitavo andar do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, no Fundão. Lá, também chegou um homem, sem documentos, baleado já em estado de choque hemorrágico, que teve que passar por uma cirurgia de emergência. Residentes e funcionários doaram sangue para a vítima que foi estabilizada. Segundo a polícia, ele foi identificado como Chatão da Nova Holanda, “gerente” do tráfico da favela.

FINANCIADORES DE CARTEL

Um suspeito foi morto durante a ação e cinco pessoas presas. Um dos presos é Adriano Cruz de Oliveira, conhecido como Adriano Gordinho, segundo homem na hierarquia do tráfico de drogas na comunidade Parque União. Ele também é apontado como o principal aliado do chefe do tráfico local, Jorge Luiz de Moura Barbosa, o Alvarenga.

A descoberta do paiol e a apreensão foram feitas com o apoio de policiais do Batalhão de Operação com Cães (BAC) da PM. Eles ajudaram a chegar ao material, já que no espaço havia cerca de 500 contêineres. Informações obtidas pelo setor de inteligência da polícia apontaram que o local era usado por traficantes. Oito fuzis foram achados dentro de uma casa abandonada, na comunidade Parque União, onde também havia drogas e munição. O armamento, assim como parte do entorpecente, estava em buracos nas paredes do imóvel. Foram apreendidas ainda três metralhadoras, uma delas de calibre .30 (de longo alcance e alto poder de destruição), duas espingardas, um revólver e duas pistolas.

De acordo com informações do delegado Marcus Vinicius, as armas são de paióis de dois traficantes. Nos contêineres, estava o arsenal do traficante da Nova Holanda, identificado como Miro, que, no momento, está envolvido em uma guerra com uma quadrilha rival em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Neles, havia a inscrição “CXD”, como são identificadas as armas da “caixinha” da quadrilha, usadas em invasões de comunidades rivais.

Já os fuzis recolhidos no Parque União são do traficante Mário Silva Ribeiro Leite, conhecido como Mário Bigode. A Desarme investiga o criminoso, que teria forte atuação em roubos de cargas e de veículos. Algumas armas dele tinham a figura de um tubarão, um dos apelidos do traficante. Uma delas estavam com adesivo dos personagens Mario Bros e Luigi.

O secretário de Polícia Civil, Marcus Vinícius Braga, disse, durante coletiva, que a operação era planejada há 15 dias com reuniões de policiais da inteligência das polícias Civil e Militar:

— Essas são comunidades onde o crime organizado se esconde após roubos de cargas e de veículos.

Também participou da entrevista à imprensa o governador do Rio, Wilson Witzel. Ele destacou que foi a maior apreensão de armas e drogas já realizada pelas forças de segurança do estado.

— Não são armas utilizadas por pessoas que moram na comunidade e são trabalhadoras. Não são usadas por pretos, pobres e favelados. São armas usadas por terroristas, que usam a comunidade como escudo e estão sendo patrocinados por cartéis internacionais — afirmou, acrescentando que há investigações em andamento sobre as formas de financiamento desses grupos.

A polícia esclareceu que a mega-apreensão só era comparável à feita no Complexo do Alemão, em 2010. Mas destacou que, na ocasião, as circunstâncias eram bem diferentes, pois se tratava de uma ocupação que durou vários dias e teve a participação das Forças Armadas.

Nos primeiros cinco meses deste ano a polícia do Rio apreendeu 239 fuzis, o maior número da série histórica para o período em dez anos. O indicador representa um aumento de 31% em relação ao mesmo período do ano passado e um salto de 251% na comparação com dez anos atrás.