O Estado de São Paulo, n. 45940, 29/07/2019. Política, p.A6

 

Polícia Federal chega a aldeia alvo de garimpeiros

 

 

 

Julia Lindner

Lorenna Rodrigues

29/07/2019

 

 

 

PF abre inquérito e investiga morte de cacique no Amapá; Funai diz que invasores estão armados e que clima na região é de ‘tensão’

 

POLICIA FEDERAL

Conflito. Polícia Federal e Bope patrulham área do município de Pedra Branca do Amapari

 

A Polícia Federal instaurou um inquérito para investigar a invasão de garimpeiros a terras indígenas no Amapá e a morte de um cacique da etnia Waiãpi. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), agentes federais chegaram ontem ao local acompanhados de uma equipe do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) da Polícia Militar do Estado. A área fica no município de Pedra Branca do Amapari, localizada a 189 quilômetros da capital Macapá.

No início da semana passada, o cacique Emyra Wajãpi foi encontrado morto na aldeia Yvytotõ com sinais de facadas. O deslocamento de autoridades para o local ocorreu após lideranças indígenas e moradores pedirem ajuda através de mensagens de celular, que repercutiram entre políticos e artistas nas redes sociais.

De acordo com a equipe da Funai na região, a invasão começou na terça-feira passada, quando foi confirmada a morte do cacique. O grupo de cerca de 15 invasores portava armas e ocupou as imediações da aldeia. Os moradores da região tiveram que se abrigar em outra aldeia vizinha, chamada Mariry. Também há relatos de ameaças contra outros moradores nos últimos dias.

 

Moro. O Ministério da Justiça e da Segurança Pública informou ontem que não há previsão de o ministro Sérgio Moro ir até Pedra Branca do Amapari (AP) acompanhar os desdobramentos da invasão de garimpeiros nas terras indígenas. A prefeita da cidade, Beth Pelaes (MDB), chegou a anunciar a presença do ministro no local.

A Funai relatou que “o clima de tensão e exaltação na região é alto”. “Neste domingo (ontem), após a chegada de servidores da Fundação, da Polícia Federal e do Bope, foi aberto inquérito pela PF para apuração da morte de um cacique que foi a óbito na semana passada. Servidores da Funai encontramse no local e acompanham o trabalho da polícia”, afirmou a fundação em nota.

“Com base nas informações coletadas pela equipe em campo, podemos concluir que a presença de invasores é real.” A região indígena é considerada de difícil acesso. A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, disse que se colocou à disposição para ir até a área. Damares afirmou que conhece a prefeita e que está em contato com ela e com a Funai.

O governo enviou uma medida provisória no início do ano que ligava a Funai à pasta de Damares, mas o Congresso Nacional devolveu o órgão e a demarcação de terras indígenas ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Em maio, Damares disse que iria “brigar” para manter a Funai na sua pasta e Moro chegou a dizer que não tinha interesse em ter a fundação ligada a seu ministério.

A secretária especial de Saúde Indígena, Silvia Nobre Waiãpi, é da mesma etnia dos indígenas ameaçados.

 

TRECHO

“Podemos concluir que a presença de invasores é real e que o clima de tensão e exaltação na região é alto. (...) Por se tratar de um local de difícil acesso, a Funai alertou os órgãos de segurança da área para se certificar da veracidade das informações. (...) Após a chegada de servidores da Fundação, da Polícia Federal e do BOPE, foi aberto inquérito pela PF para apuração da morte de um cacique que foi a óbito na semana passada. Servidores da Funai encontram-se no local e acompanham o trabalho da polícia.”

 

PARA LEMBRAR

Conflito marca Região Norte

Há décadas a Região Norte do País é marcada por conflitos envolvendo indígenas e populações não indígenas. Em 2004, na Reserva Roosevelt, em Espigão do Oeste (RO), 29 garimpeiros foram assassinados pelos índios cinta-largas num garimpo de diamante. Eles haviam invadido a terra indígena. A Terra Indígena Raposa Serra do Sol, também em Roraima, é alvo de tensão desde a assinatura do decreto de homologação, em 2005, ratificado pelo Supremo Tribunal Federal em 2009. No entanto, existe a pressão de mineradoras e empresários para a abertura da reserva para exploração.