Valor econômico, v.20, n.4859, 16/10/2019. Política, p. A7

 

Bivar é alvo da Polícia Federal e PSL ameaça retaliar no Congresso 

16/10/2019

 

 

A crise do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, atingiu um ponto crítico ontem a partir de operação deflagrada pela Polícia Federal em Pernambuco, que teve o presidente da legenda, o deputado federal Luciano Bivar, como um dos alvos. A rivalidade entre o grupo bolsonarista e os aliados de Bivar, que estão em disputa explícita pelo controle do PSL, tomou contornos que extrapolam as rusgas partidárias internas e começou a ameaçar votações no Congresso.

A liderança do PSL na Câmara, em oposição a Bolsonaro, chegou ontem a declarar obstrução durante votação de medida provisória de interesse do governo, num flagrante exemplo de como a fissura no PSL tem potencial para contaminar pautas de interesse do Planalto (leia texto nesta página). Nos bastidores, parlamentares interpretaram o gesto como um recado a Bolsonaro, apesar do recuo e da aprovação da MP.

Vice-líder do PSL, Soraya Manato surpreendeu ao dizer que “tem laranja em tudo quanto é partido”

Ao longo do dia, circularam ameaças, por parte da ala ligada a Bivar, de expulsão de parlamentares da legenda. O PSL tem a segunda maior bancada da Câmara, 53 deputados. Entre eles, 21 estão ao lado de Bolsonaro e já declararam que irão à Justiça reivindicar o mandato. Caso saiam do PSL, esses parlamentares podem perder o mandato, que pertence, de acordo com a lei vigente, ao partido.

A operação da PF que atingiu Bivar é fruto de investigações sobre o uso de candidaturas laranjas no PSL na eleição de 2018. Foram expedidos nove mandados de busca e apreensão pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Pernambuco. Além da casa de Bivar e da sede do PSL no Recife, foram alvos endereços de três candidatas: Érika Santos, Mariana Nunes e Maria de Lourdes Paixão, suspeitas de terem sido “laranjas” em 2018.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antonio, também foi indiciado pela PF pelas mesmas suspeitas de candidaturas laranjas, em Minas. Álvaro Antonio, no entanto, continua a contar com a confiança de Bolsonaro.

Vice-líder do PSL na Câmara, Soraya Manato (ES) surpreendeu ontem ao admitir que o partido teve sim candidaturas laranjas na eleição passada, mas alegou que a prática foi generalizada. “Então, pessoal da esquerda, não tem ninguém santo aqui dentro não, tem laranja em tudo quanto é partido. Aqui no PSL tiveram os candidatos laranjas, mas a grande maioria foi eleito (sic) honestamente.”

Segundo a PF, a investigação em Pernambuco busca esclarecer se houve fraude no uso de dinheiro destinado às candidaturas de mulheres - a legislação obriga aplicação de ao menos 30% em postulantes do sexo feminino. Os indícios são de que os valores teriam sido aplicados de forma fictícia, o que possibilitaria desvio de recursos públicos para outras finalidades.

A operação da Polícia Federal deflagrada ontem havia sido requerida em agosto pelo Ministério Público Eleitoral. A juíza Maria Margarida de Souza Fonseca, da 6.ª Zona Eleitoral do Recife, negou o pedido de buscas em setembro, alegando falta de subsídios. No dia 12 de setembro, o Ministério Público recorreu ao TRE, reafirmando a necessidade das buscas. O desembargador relator levou o pedido para apreciação do plenário da Corte. Na última segunda-feira, 6 dos 7 juízes votaram a favor das buscas.

Em nota, Bivar disse ver com “estranheza” a operação deflagrada em “um momento de turbulência política” - o presidente Bolsonaro ameaça deixar o PSL e cobra que seja realizada auditoria nas contas do partido. Segundo a defesa do presidente do PSL, “não há indícios de fraude no processo eleitoral”. O inquérito, destaca o escritório Ademar Rigueira, que defende Bivar, já tem mais de dez meses, com oitiva de testemunhas, e só agora ocorreu essa ação de busca e apreensão em imóveis ligados ao deputado.

O dia foi marcado por troca de recados ao Palácio do Planalto em duas notas, uma das bancadas do PSL na Câmara e Senado e outra pela Executiva Nacional. A nota das bancadas critica a “minoria” do PSL que causou desgastes por declarações “inoportunas e descabidas” sobre questões internas. Os parlamentares pedem esforços por entendimentos e unidade: “O PSL foi essencial para a eleição de nosso presidente, assim como Jair Bolsonaro foi crucial para o crescimento da legenda”. Já a nota da Executiva critica a “tentativa de criar fatos artificiais” para atender a interesses pessoais. Em um trecho, a direção destaca que “a divergência intrapartidária é natural ao processo democrático e deve ser sempre resolvida pelo diálogo honesto, sem insinuações e ameaças veladas, que se mostram frágeis, sem respaldo jurídico e que em nada contribuem para o crescimento das instituições democráticas”.

A crise no PSL foi escancarada pelo próprio Bolsonaro. Na semana passada, o presidente foi filmando recomendando a um pré-candidato que esquecesse o PSL. Ele disse que Bivar estava “queimado”. Bivar interpretou a fala de Bolsonaro como pedido de desfiliação. “Só o Saci Pererê e o Papai Noel não sabiam que essa operação iria ocorrer depois que o presidente deu a deixa”, afirmou O líder do PSL na Câmara, deputado Delegado Waldir (GO). No final da tarde, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, afirmou que o presidente Bolsonaro desconhecia a operação da PF que teve Bivar como alvo.

O grupo ligado ao presidente do PSL passou a fazer ataques aos advogados Admar Gonzaga e Karina Kufa, que dão assessoria jurídica a Bolsonaro. O presidente pediu, então, auditoria nas contas do PSL. A disputa tem como pano de fundo as verbas milionárias que o PSL obteve dos fundos partidário eleitoral. O partido terá direito a um montante que passa de R$ 300 milhões de dinheiro público, verba que deve ser usada no pleito e na organização da sigla.

O líder do PSL na Câmara afirmou, após reunião com o vice-presidente da legenda, Antônio Rueda, e com parlamentares, que o PSL não pretende expulsar nenhum parlamentar que esteja alinhado a Bolsonaro. “Se alguém quiser ganhar esse presente, que se pronuncie”, ironizou o deputado. Em caso de expulsão, a sigla não pode reivindicar o mandato parlamentar. “O controle do partido não sairá das mãos de Bivar”, acrescentou. (Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro, Fabio Murakawa, Matheus Schuch, Luísa Martins, André Guilherme Vieira, Cristiane Agostine e Carolina Freitas)

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Partido ensaia obstrução na Câmara, mas MP é aprovada 

Raphael Di Cunto 

Marcelo Ribeiro 

16/10/2019

 

 

O confronto entre o presidente Jair Bolsonaro e um grupo do PSL, seu partido, afetou ontem as votações dos projetos de interesse do governo no Congresso, com o líder da legenda na Câmara, delegado Waldir (GO), apoiando os requerimentos da oposição para tirar de pauta a medida provisória (MP) que promove uma nova reforma administrativa.

A oposição pretendia impedir a votação e, com isso, derrubar a MP, que perde a validade se não for aprovada pela Câmara e Senado até amanhã. Por isso, recorreu a manobras de obstrução, posição que acabou acompanhada pelo PSL como um recado a Bolsonaro da insatisfação com os ataques ao presidente nacional da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE).

Waldir foi aos microfones e orientou para que os deputados do partido não registrassem voto a favor da proposta do governo. “O PSL está em obstrução”, disse o líder do PSL na Câmara. “Alteraram [a orientação] sem a presença do líder. Peço a vossa excelência [o presidente da Câmara, Rodrigo Maia] que não permita a alteração sem a presença do líder”, reforçou.

A declaração de voto ocorreu em frente ao líder do governo na Câmara, major Vítor Hugo (PSL-GO), que recebeu um “tapinha nas costas” e não disfarçou sua contrariedade. Hugo é um dos aliados mais próximos de Bolsonaro no Congresso e foi um dos que assinou a carta cobrando mais transparência no uso de recursos do partido por Bivar.

A orientação do líder foi seguida explicitamente por poucos deputados do partido. Dos 53 da bancada, só quatro registraram também obstrução. Outros 17 votaram contra o requerimento da oposição para tirar a MP de pauta. A maioria, contudo, nem apareceu para votar,o que também costuma ser uma medida de obstrução.

No mesmo momento da votação, a bancada do PSL se reunia para discutir os ataques a Bivar e tentar um armistício - que resultou numa nota em que os deputados criticavam desgastes causados por declarações “inoportunas e descabidas” sobre questões internas e expressavam apoio “ao governo do presidente” e a Bivar, sem defesa enfática do próprio Bolsonaro.

Após o encontro, em que os deputados do PSL reforçaram o apoio ao governo, Waldir passou a orientar o voto favorável à medida provisória e justificou que declarou obstrução para que os parlamentares na reunião da bancada não fossem punidos com corte de salário por faltarem à votação. Para que não percam salário, contudo, seria necessário que os deputados também deixassem a reunião para registrar no painel de votações que estavam em “obstrução”.

A MP da reforma administrativa acabou aprovada por 314 a 57 por causa do apoio dos demais partidos de centro e direita, que defenderam que cabia ao presidente decidir como montar a estrutura de seu governo. A principal mudança é uma troca entre a Secretaria de Governo, que assumirá a responsabilidade pelas articulações políticas, e a Casa Civil, que herdará o Programa de Parceiras e Investimentos (PPI), responsável por gerenciar as privatizações.

Bolsonaro pretendia com a MP, também, que a demarcação de terras indígenas ficasse com o Ministério da Agricultura, controlado pelos ruralistas, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o presidente não poderia fazer essa mudança por medida provisória porque o Congresso já tinha rejeitado uma outra proposta com esse mesmo objetivo em maio. Com a decisão, esse trecho acabou excluído da proposta e não chegou a ser votado.

A reação do líder na votação da MP não foi a única. Ele afirmou que vai tirar o grupo que atacou Bivar das principais comissões da Câmara e dos cargos de liderança e já começou com a exclusão do líder do governo na Câmara, deputado major Vítor Hugo (PSL-GO), da comissão especial que discute o projeto de reforma da previdência dos militares.

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Contado para comandar sigla no Rio, deputado defende punir direção

Cristian Klein

16/10/2019

 

 

Na divisão do PSL entre os defensores do presidente da República Jair Bolsonaro e os aliados do presidente nacional da sigla, Luciano Bivar, um dos indicadores de fidelidade é a manifestação dos personagens nas redes sociais. No Rio de Janeiro, o deputado federal João Carlos Soares Gurgel, de 38 anos, o Sargento Gurgel, teve a ousadia de postar no Twitter um mosaico com três fotos ao lado do governador Wilson Witzel (PSC), a quem Bolsonaro também vê como inimigo, por querer concorrer ao Planalto em 2022. A publicação de Gurgel na rede social ocorreu depois da briga entre Bivar e Bolsonaro se tornar aberta e feroz, na semana passada. O parlamentar é cotado para assumir o diretório estadual do partido, caso a cúpula nacional do PSL resolva destituir o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente. “Desconheço essa informação de que vão tirar Flávio. Mas a diretoria do PSL estadual já fez vários ataques ao partido e é natural que se puna, não sei se o Flávio ou outro integrante”, disse Gurgel ao Valor.

Gurgel não confirma o plano de trocas nos diretórios municipais, que passariam a ser controlados por aliados de Bivar, mas afirma estar insatisfeito. “Não tenho nenhum diretório. Isso precisa ser revisto”, diz. O parlamentar tem domicílio eleitoral em Nova Iguaçu, quarto maior município fluminense, com mais de 800 mil habitantes, mas teve suas maiores votações em Paraty, Angra dos Reis e Valença. “Me sinto desprestigiado. Queria espaço”, reclama.

No Rio, a saída de Bolsonaro do PSL - ou mesmo a permanência com punição a aliados do presidente - pode jogar ainda mais água no moinho de Witzel, que busca herdar o espólio do bolsonarismo não só no Estado, mas nacionalmente. Há quase um mês, antes da explosão entre Bivar e Bolsonaro, o governador deu uma declaração que parecia extemporânea. “Eu gostaria de ser uma opção do PSL em 2022”, afirmou, ao participar do Fórum Nacional.

Entre os 12 deputados estaduais, o clima é de apreensão e receio, em mais uma turbulência, semanas depois de a maioria resistir à ordem de Flávio de abandonar o governo Witzel.

Ex-vereador por dois mandatos e pré-candidato a prefeito em Duque de Caxias, Marcelo do Seu Dino se diz muito ligado ao perfil político de Jair Bolsonaro mas que seu compromisso é acima de tudo com o Estado do Rio.

“Eu ajudei os dois [Bolsonaro e Witzel]. Independentemente de qualquer coisa, estarei ao lado do Rio, minha família mora no Rio, o Rio é que ajudou a me eleger”, diz o deputado. O parlamentar afirma que se Witzel tomasse o PSL no Rio seria “um gol de placa” para o governador, pois o partido é grande, “um monstro”. Por outro lado, diz, isso iria “destruir o castelo” do presidente nacional do PSC, o pastor Everaldo Dias Pereira, mentor da candidatura vitoriosa do ex-juiz Witzel.

Ex-líder da bancada na Assembleia e pré-candidato a prefeito de Campos dos Goytacazes, Gil Vianna afirma esperar que a situação seja apaziguada, mas seguirá o rumo de Bolsonaro, pela forte ligação com Flávio: “Não dá para ficar em cima do muro”.

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Aliado de Eduardo Bolsonaro é acusado por ex-assessor de praticar 'rachadinha'

Cristiane Agostine 

16/10/2019

 

 

Vice-presidente do diretório estadual do PSL de São Paulo e líder do partido na Assembleia Legislativa paulista, o deputado Gil Diniz é acusado por um ex-assessor de empregar funcionária fantasma em seu gabinete e pela suposta prática de ‘rachadinha’. A denúncia foi encaminhada ao Ministério Público Estadual de São Paulo, que ainda deve analisar a acusação.

Conhecido como “Carteiro Reaça”, Gil Diniz é um dos principais aliados do deputado Eduardo Bolsonaro (SP), que comanda o diretório paulista do PSL. O dirigente é cotado para disputar a Prefeitura de São Paulo em 2020.

Em representação apresentada ao Ministério Público do Estado de São Paulo, o ex-assessor Alexandre de Andrade Junqueira diz que quando trabalhou no gabinete de Diniz “ a prática de ‘rachadinha’ era comum entre os funcionários do gabinete. “Ali havia também funcionária fantasma, porque não trabalhava e só assinava o ponto e devolvia dinheiro para o deputado”, diz o ex-assessor. “Essa funcionária, amiga do deputado há mais ou menos doze anos, recebe em troca apenas o cartão alimentação (Sodexo) e aproximadamente R$ 1,5 mil por emprestar seu nome para o desconto do salário. Presenciei por várias vezes a circulação de dinheiro em espécie e o pagamento de diversas contas particulares com esse dinheiro oriundo de ‘rachadinha’”, afirma, em referência à prática de dar parte do salário ao parlamentar.

O ex-assessor diz que seu vínculo com Diniz começou durante a campanha eleitoral, e que depois assumiu o cargo no gabinete do parlamentar. “Mas, logo no início, pediram para que eu devolvesse parte do meu salário e principalmente as gratificações que só foram incorporadas ao meu salário para que eu as devolvesse para o deputado”. Junqueira diz que as gratificações são sacadas em dinheiro “para pagamento dos apoiadores” do deputado. O ex-assessor diz, que diante sua recusa em dar parte de seu salário, foi ameaçado a ter um rebaixamento de função e proibido de entrar no gabinete.

No site da Assembleia, Junqueira aparece como ex-assessor do gabinete de Diniz e trabalhou entre 18 de março e 01 de agosto. O Ministério Público do Estado de São Paulo disse que a representação ainda sendo analisada na assessoria técnica da Procuradoria-Geral de Justiça.

Diniz foi procurado pelo Valor, mas não atendeu aos pedidos de entrevista.