Valor econômico, v.20, n.4858, 15/10/2019. Brasil, p. A4

 

Mudança de 'mix' reduziu juro real neutro, diz Guedes 

Claudia Safatle 

15/10/2019

 

 

A mudança do “mix” da política econômica neste ano, de uma situação fiscal mais frouxa e uma política monetária mais dura nos governos anteriores para condições inversas - gestão fiscal mais rigorosa, sob a Lei do Teto de Gastos, e um afrouxamento das condições monetárias, com queda na taxa básica de juros (Selic) -, resultou em uma importante queda da taxa real neutra de juros. Esta é a avaliação do ministro da Economia, Paulo Guedes, que vê, atualmente, uma taxa de juros real de equilíbrio abaixo de dois pontos percentuais e com viés decrescente. A taxa neutra é aquela que mantém a inflação estável sem prejuízo do crescimento.

A “coordenação” das políticas fiscal e monetária tem sido chave nesse processo, que estaria começando, também, a produzir o que os economistas chamam de “crowding in”, em substituição ao “crowding out”. Ou seja, a retração do gasto público abre espaço para o investimento privado. O que significa que a expansão do gasto público nos governos passados expulsou o investimento privado.

A ocupação de espaço do setor privado em razão da retração do gasto público pode ser notada nos mais diversos segmentos e, particularmente, na área de crédito. Os bancos públicos chegaram a responder por 57% do total do crédito na economia em 2016. Hoje, com a contração do crédito público, sobretudo o do BNDES, a situação se inverteu. A virada ocorreu em maio passado, quando o crédito público caiu para 49% e o privado subiu para 51% do total. A expansão do crédito privado tem sido notável e chegou a 13,5% em 12 meses até agosto, enquanto a retração do crédito público prossegue e foi de 2,4% em igual período.

Apesar do Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), divulgado ontem, ter tido alta de apenas 0,07% em agosto, esse pode ter sido o último dado ruim da safra de indicadores econômicos fracos daquele mês. Cresce, entre os técnicos do governo, a expectativa de que a reação da atividade econômica no terceiro trimestre vai surpreender. Fala-se em uma taxa de crescimento anualizada de 2% no último trimestre do ano.

Guedes está confiante que os indicadores do nível de atividade virão mais consistentes do que vieram até agora. “O setor imobiliário em São Paulo está esquentando; o varejo também está aquecendo; e as ruas do Rio, que andavam vazias, estão cheias novamente.”

Com a inflação em queda e os juros de equilibrio também, a taxa Selic pode cair mais do que originalmente imaginado. Isso é o que algumas casas bancárias já estão antecipando: uma queda mais acentuada do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para este e para o próximo ano. Com os preços controlados em um patamar abaixo da meta de 4,25% ao ano, há quem aposte em mais dois cortes de 0,50 ponto ainda neste exercício e outros dois cortes de 0,25 ponto em 2020, o que levaria os juros básicos para 4% ao ano.