O globo, n. 31356, 13/06/2019. País, p. 5

 

Após vazamento, alto escalão do governo adota telefones da Abin

Jussara Soares

Gustavo Maia

Bruno Góes

Natália Portinari

Henrique Gomes Batista

13/06/2019

 

 

Moro vai falar na Câmara no dia 26; Porta-voz cita ‘ambiente de sã camaradagem’ entre Bolsonaro e o ministro da Justiça

O vazamento de diálogos entre o ministro da Justiça, Sergio Moro, e o procurador Deltan Dallagnol está provocando uma mudança de hábito no alto escalão do governo do presidente Jair Bolsonaro. O próprio presidente e outros integrantes do Executivo sempre preferiram aplicativos de mensagens, como WhatsApp e o Telegram, para se comunicar e tratar, inclusive, de temas considerados confidenciais, mas devem agora migrar as conversas para telefones criptografados fornecidos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Segundo um auxiliar do Planalto, o caso envolvendo o ministro Moro acendeu um alerta de como o governo e seus integrantes estão expostos e a orientação, agora, é redobrar as medidas de segurança. Segundo o auxiliar, a tendência é que, finalmente, assuntos sigilosos sejam tratados apenas por telefones criptografados, ou seja com tecnologia que protege os dados dos aparelhos.

Esses dispositivos fornecidos pela Abin não permitem a instalação de WhatsApp, Telegram e de redes sociais. Até então, como o presidente e ministros utilizavam os aplicativos para manter conversas, usavam seus telefones pessoais, com segurança mais frágil. A preocupação do Planalto, neste momento, é se os ataques de hackers colocam em risco até mesmo os dispositivos criptografados e bancos de dados do governo. A avaliação é de que está em curso uma “guerra”.

O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, afirmou ontem que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) vem alertando o presidente, ministros, secretários e servidores do alto escalão nos cuidados sobre o risco na comunicação.

— O presidente é orientado pelos seus agentes de segurança nas área física e cibernética em como se comportar. É em cima dessas orientações que ele vem tomando as precauções que são necessárias —disse o porta-voz.

Jogo do flamengo

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) da Câmara, Felipe Francischini (PSLPR), disse ontem que Moro também falará ao colegiado em audiência marcada para o próximo dia 26 sobre os diálogos vazados. O ministro já havia se antecipado ao marcar audiência para falar na CCJ do Senado, no dia 19.

Num sinal de apoio a Moro, Bolsonaro levou ontem seu ministro da Justiça ao jogo entre Flamengo e CSA no estádio Mané Garrincha em Brasília. Os dois, que foram aplaudidos por parte da torcida, ganharam camisas do Flamengo e as vestiram. O ministro da Justiça é torcedor do Athlético-PR e Bolsonaro é palmeirense. O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o vice-presidente Antonio Hamilton Mourão acompanharam a partida.

Um torcedor que estava na arquibancada logo abaixo do presidente tirou a camisa do Flamengo que usava e a jogou para cima. Bolsonaro a pegou e a vestiu. Depois, o próprio presidente pediu que outro torcedor também jogasse sua camisa. Ele fez isso e Moro, num sorriso tímido, aceitou e a vestiu.

Ontem também, o ministro da Justiça recebeu parlamentares evangélicos em seu gabinete, em Brasília. Diante deles, negou que tenha combinado atuações com a Lava-Jato.

—Moro disse que está tranquilo, que quem não deve não teme e que não houve conluio algum —disse o pastor e deputado Marco Feliciano (Podemos-SP).

Mais cedo, Moro esteve no Palácio do Planalto junto com o diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, para uma reunião com o presidente. A audiência não constava nas agendas oficiais e a pauta debatida não foi divulgada.

O porta-voz da Presidência afirmou que Bolsonaro acompanha com “serenidade” as demandas que afetam Moro, pessoal e institucionalmente, e acrescentou que o presidente tem se relacionado com Moro “num ambiente de sã camaradagem e confiança”.

— É nesse sentido que o presidente vem relacionando-se com o ministro Sergio Moro, e não apenas com ele, relacionando-se com todos os ministros do governo, num ambiente de sã camaradagem e de confiança.