Correio braziliense, n. 20104, 07/06/2018. Política, p. 14

 

Entrevista - Rodrigo Maia: "O caminho é o controle de despesas"

Rodrigo Maia

07/06/2018

 

 

O controle das despesas públicas é o caminho para restaurar o país. Foi com essa tônica que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), pré-candidato do partido à Presidência da República, sustentou uma agenda liberal, sugerindo medidas para reduzir a pressão sobre o setor público. “Estou convencido de que, se não olharmos o lado da despesa, não vamos conseguir nunca implementar políticas públicas sérias nas três áreas fundamentais: educação, saúde, segurança. Por isso, defendi e continuo defendendo tanto a votação da PEC do teto dos gastos”, afirmou.

Maia ressaltou que o debate sobre despesas tem de ocorrer ao longo de oito anos “para que se reorganize o estado brasileiro, para que possamos atender a sociedade, reduzir as desigualdades e gerar melhores condições para a população mais pobre”.

O discurso foi acompanhado por propostas e por ataques ao governo federal. Para o parlamentar, a gestão do presidente Michel Temer está “desarticulada”. A pauta de Maia se apoia na aprovação de reformas administrativa, tributária e da Previdência. Para o democrata, é preciso fazer uma política social com recursos previstos no Orçamento sem gastar bilhões com benefícios e desonerações que, na opinião dele, precisam ser revistos. “Acho que o Brasil desperdiça muito dinheiro público sem resultado nem foco”, avaliou. Confira os principais trechos da entrevista:

Desde que se colocou como candidato, a sensação que se tem é que o senhor partiu para o embate com o governo. Quase nada de interesse do Palácio do Planalto foi aprovado no Congresso. Quase nada andou, até quando o governo apresentou as 15 medidas econômicas, exceto a da reoneração, já que o Brasil foi pressionado pela greve dos caminhoneiros. Não é uma postura irresponsável para quem pretende comandar o país?

Essa imagem distorcida deve representar a imagem para algumas pessoas, e é importante que se esclareça. Primeiro, a agenda de 15 medidas não é do governo. A maioria dos temas foi construída pelo Congresso. O governo pegou o papel e anunciou, talvez pela vontade de ter uma agenda depois de não ter votos para aprovar a Previdência. Segundo, tenho trabalhado de forma semanal com a equipe econômica. Ontem (terça) mesmo, discutimos, em mais uma reunião, todos os projetos de uma agenda microeconômica para que possamos colaborar com uma recuperação econômica no segundo semestre, que foi perdida pela crise que o governo vive. A minha agenda é pactuada com os líderes, com a equipe econômica. A base está desorganizada, o governo está desarticulado, e isso atrapalha o nosso trabalho. Mas o esforço é permanente. Não tem nada sendo feito de forma isolada, preocupado com nenhum tipo de eleição. Minha agenda é muito transparente. Não vai ao encontro de nenhuma irresponsabilidade. Agora, se a agenda da Câmara está um pouco atrasada, é porque há uma desarticulação muito grande do governo com sua própria base.

Até o fim do ano, o senhor vê alguma condição de se voltar a ter uma agenda, uma vez que a base está desarticulada? O senhor, como pré-candidato, não pode assumir o papel de rearticular uma base para aprovar o que o país precisa com urgência antes da eleição?

Claro, estou articulando com os líderes e com a equipe econômica. A articulação não parte da Secretaria de Governo. Quem tem comandado são os líderes comigo e com a equipe econômica.

Dias antes de sair da disputa, o presidente Michel Temer defendeu candidatura única de centro. Logo depois, lançou (Henrique) Meirelles. Acha que é possível ter essa candidatura própria?

O problema é que estamos falando muito em centro, mas temos de compreender que a sociedade não enxerga o centro como enxergamos. A gente fica falando de centro, e a sociedade não encontra nenhum desses citados como um candidato de centro. Pelas minhas avaliações, o único que tinha algum perfil de centro era o Joaquim Barbosa. Todos os outros estão mais a centro-direita, mais a centro-esquerda, mais radicais, menos radicais. Mas, visto como esse candidato que pacifica, que unifica o Brasil, que é necessário e é fundamental, nenhum de nós ainda conseguiu se colocar. É por isso que é muito difícil tomar uma decisão hoje do que vai ser feito. Enquanto isso não acontece, todos os postulantes, de forma legítima, vão tentando construir, até julho, as candidaturas no seu processo pré-eleitoral.

O senhor se considera preparado para presidir o Brasil, dados os desafios que estão colocados, como tirar o país da recessão e reduzir o desemprego?

Se estou sentado aqui, é porque eu acredito. É claro que é um desafio enorme. O Brasil faliu. Os estados estão falidos. A demanda de corporações públicas e privadas é permanente e precisa ser debatida de forma aberta. A Previdência precisa ser modificada. É importante que tenhamos uma Previdência saudável e que se faça política social com o orçamento, e não misturando aqueles que precisam daqueles que se beneficiam do Estado brasileiro. Temos aí R$ 285 bilhões de incentivos, benefícios e desonerações que precisam ser revistos. Temos um Estado que não tem muitos servidores, mas a média salarial do serviço público é 67% maior que a média do setor privado.

Como resolver esse descompasso entre os salários pagos nos setores público e privado?

Estamos preparando um estudo de uma reforma administrativa. No Legislativo e no Judiciário, entram quase ganhando o teto. Não há nenhuma política de estímulo para que se tenha melhor produtividade. O servidor tem papel fundamental e precisa ser valorizado nas condições que o Estado tenha de financiá-lo. Mas devemos preparar uma reforma administrativa que comece com piso mais baixo para que a pessoa chegue ao teto com mais tempo, 20, 25 anos, em que se tenha todo um processo de meritocracia. Temos de reorganizar o Estado. Um servidor chegar ao teto em cinco anos está errado.

O senhor concorda que as desonerações não aumentaram a competitividade de setores da indústria e que a geração de empregos prometida foi pífia?

Concordo. Tanto que conseguimos incluir o fim das desonerações para 2020. Só não antecipamos, pois não tínhamos base de votos para aprovar uma antecipação do fim das desonerações. E, agora, cabe ao próximo presidente pensar em outras políticas. Aliás, estava vendo um documento do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) sobre produtividade no Brasil. Fizeram um trabalho longo, e todos os programas públicos ou privados construídos para melhorar a produtividade tiveram efeito muito pequeno como as desonerações. O Brasil desperdiça muito dinheiro público sem resultado nem foco.

O Brasil tem um dos sistemas públicos de saúde mais abrangentes do mundo, porém, com enormes problemas. Como corrigir isso?

Temos um problema de financiamento, de falta de gestão. Os sistemas não são integrados. Há uma concentração nos grandes centros da atenção médica, principalmente do número de médicos. Temos uma concentração nas grandes cidades de médicos. Tem que se ver de que forma se vai conseguir expandir isso para fora das capitais. Não é uma política simples, mas, sem dúvida nenhuma, acredito que a melhoria da gestão da saúde, a integração dos sistemas, pode gerar uma economia do PIB na ordem de 1,8%, 1,9%. Acho que, se tivéssemos uma regulação no setor privado que garantisse mais segurança jurídica tanto para o cliente quanto para o setor empresarial, poderíamos ter uma parte da sociedade mais bem atendida, o que poderia tirar pressão do SUS. A gente sabe que a capacidade do Estado de atender a todos não é verdadeira, então, deveria se concentrar nas pessoas de menor renda.

O senhor falou em tirar um pouco da pressão do setor público. Como seria isso na educação?

Temos problema grave em parte do ensino fundamental e outro, na base da educação, na creche. É dramático você ter apenas 25% de crianças de até 3 anos em creches no Brasil. Essa é uma questão que precisa ser trabalhada e se ver de que forma vai se avançar, já que o Estado está com capacidade de investimento pequena. Ver de que forma o setor privado pode avançar com cheque creche ou uma bolsa para que a gente possa estimulá-lo a avançar nas vagas em creche de forma emergencial. É por isso que as reformas previdenciária e administrativa são fundamentais para abrir capacidade de investimento. Não é da noite para o dia. Mas devemos pensar num fundo de valorização dos professores .

Qual é o principal desafio para a segurança pública, caso o senhor seja eleito?

Precisamos de uma nova polícia. Uma polícia que seja integrada, em que, desde a academia, a Civil e a Militar comecem a trabalhar integradamente, porque essa divisão das polícias nos estados vem gerando muita dificuldade no trabalho. O sistema integrado é fundamental. Só com um trabalho em conjunto, principalmente da inteligência das forças de segurança do governo federal com os estados, conseguiremos melhorar e pensar de que forma podemos construir novos presídios para separar os chefes de facções criminosas do preso comum.

Nas pesquisas de intenção de voto, vemos que os grandes vencedores, hoje, seriam o nulo e a abstenção. Nenhum candidato consegue superar esses itens. Há um descontentamento em relação aos políticos?

Claro que parte é pelas investigações que têm gerado um desgaste muito grande para a política. Mas não acho que seja só isso. Quando vieram as investigações, veio a recessão profunda e acabou misturando um tema no outro. Com isso, aconteceu a perda permanente da capacidade do Estado de responder aos anseios da sociedade. Tem a questão ética, da corrupção, da crise econômica e do desemprego.

O senhor é a favor da privatização da Petrobras, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal?

A Petrobras pode continuar existindo em tamanho menor, participando do mercado e concorrendo como estatal com o setor privado. Não precisa ter monopólio e controle do mercado. Nem o monopólio do refino e da distribuição. No momento, o Brasil não deveria pensar em privatizar o BB. Há uma concentração muito grande do sistema financeiro em poucos bancos. É importante que se mantenha público neste momento. A Caixa precisa encontrar um nicho. Se é saneamento, habitação. Acho que não vale ter dois bancos públicos disputando esse mercado.

Perfil

Rodrigo Maia (DEM)

» Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia

» Formado em economia na Universidade

Cândido Mendes

» Nascido em 12 de junho de 1970, em Santiago (Chile)

Histórico

» 54º presidente da Câmara dos Deputados

(2016 – atualmente); deputado federal pelo Rio de

Janeiro (1999 – atualmente); secretário Municipal da

Prefeitura do Rio de Janeiro (1997 – 1998)