Correio braziliense, n. 20104  07/06/2019 Política, p. 3

 

Entrevista - Geraldo Alckmin: "O novo é defender o interesse público"

Geraldo Alckmin

07/06/2018

 

 

 

O ex-governador de São Paulo e pré-candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, deixou o discurso ameno de lado. Em busca de fortalecimento perante o partido e o eleitorado, prometeu implementar medidas transformadoras, mesmo que impopulares, durante um eventual governo tucano. Ele afirmou que vai fazer mudanças no sistema previdenciário do país logo no primeiro ano de mandato. Disse também que pretende encontrar uma forma de fazer com que a saúde se torne menos pesada para os cofres públicos.

Sobre a reforma da Previdência, defendeu que os regimes público e privado têm de ser iguais. “Não dá para pobre pagar a vida do rico”, argumentou. O pré-candidato também defendeu o SUS, o “melhor sistema do mundo”, mas ressaltou que falta aprimorar o financiamento, permitindo a estados e município cobrarem das seguradoras.

O tucano ainda prometeu que, se eleito, vai criar uma agência de segurança unindo forças armadas, políticas e tecnologia. Outro projeto é o da criação da Guarda Nacional. “A Força Nacional, como está, é o mesmo que retirar de um santo para investir outro. Já a Guarda Nacional será permanente”, frisou.

Alckmin também comentou sobre as recentes divergências dentro do partido. Confira os principais trechos da entrevista:

O que está acontecendo com o PSDB em relação à sua candidatura?

Temos todas as condições de fazer uma grande campanha. Diferentemente das eleições anteriores, quando as convenções começavam em 1º de junho. Já teríamos feito convenção, já se saberia quem é candidato a presidente, quais as alianças, quem seriam os candidatos a senador, a deputado. A lei mudou, e a convenção começa em 20 de julho e vai até 5 de agosto. É uma campanha mais curta e muito fragmentada. Temos 35 partidos e outros em fase de aprovação. Estamos trabalhando firme. Cheguei do Rio de Janeiro, onde lançamos a política nacional de segurança. Aliás, fizemos isso em São Paulo. Entre falar e fazer há um abismo na política. Éramos o quinto pior em termos de segurança. Hoje, somos o primeiro em redução de violência. Daqui estou indo à Bahia e, depois, Espírito Santo.

Que estresse foi esse do PSDB?

Não foi estresse. Isso é normal nos partidos grandes, todos têm divergências. É natural. Fomos escolhidos e fizemos uma grande aliança. Nós já temos hoje cinco partidos. Cada um tem seu tempo, não devemos ser afobados.

Flávio Rocha disse que a eleição será embate entre a velha política e quem está cansado dela. Como o senhor coloca o PSDB nesses rótulos? O partido consegue se renovar e se apresentar como opção de mudança?

O que é o novo na política? O novo é a idade, ter 30 anos em vez de 60? Nunca ter disputado nenhuma eleição? Não ter experiência na administração pública? Não. O novo é defender o interesse público. O Brasil entrou numa recessão econômica, petista, irresponsável, pelo ápice do corporativismo. Precisamos de uma reforma política. Temos de reconhecer, mudar. Quem for eleito terá mais de 50 milhões de votos e poderá fazer as reformas de que o Brasil precisa.

Para o senhor, qual é o maior problema do Refis? O inadimplente, ou o Refis é um mal em si mesmo?

Se Refis for a regra, o devedor vai esperar o próximo, não vai pagar. Não pode essa ser a regra. Em situações excepcionais, tivemos três anos de recessão. Não é normal. Da última guerra civil para cá, dificilmente se teve cenário parecido. Tenho grande apreço pelo trabalho. Mário Covas dizia que responsabilidade pelo trabalho é visão social. Sem contas públicas equilibradas não tem como governar, não tem investimento, não tem escola, segurança.

Na última corrida presidencial, o discurso sobre privatização trouxe dificuldade. O senhor reconheceu isso. Como vê a possibilidade de privatização da Caixa Econômica, do Banco do Brasil e de outras estatais?

Quando a gente ganha eleição — fui reeleito pela 4ª vez —, acha que fez tudo certo. E nem sempre fez. Quando perde, parece que foi tudo errado. Não perdi eleição por causa de privatização. Perdi porque estava contra um incumbente. Eu era o desafiante. O Lula daquela época não era o de hoje. Não havia a gravidade de hoje. O que contestei não foi a privatização, foi a mentira. Eu não ia privatizar o Banco do Brasil. Não vou privatizar hoje. Não vou privatizar a prospecção de petróleo da Petrobras. Temos 146 empresas estatais. Tem razão para o governo ter televisão? Precisamos de trem, ferrovias. Sou favorável a concessões e PPPs (parcerias público-privadas).

O governo tentou aprovar projeto de reforma da Previdência, mas não conseguiu. Sua bancada no Congresso aprovou uma parte do projeto, porém fez várias críticas ao que foi apresentado. Como vai tocar o assunto se for em frente no seu governo?

Sou muito verdadeiro. Quem mente na campanha vai fazer um péssimo governo. Começa mal. Fui favorável à reforma trabalhista. O grande desafio é emprego e renda. Não faz sentido esse modelo autárquico de 1990. A lei não é perfeita. Sobre a reforma da Previdência, é justo o trabalhador aqui do jornal, da TV, do rádio, da agricultura, se aposentar com o máximo de R$ 5 mil? Vai ter de viver com R$ 1.391, enquanto o setor público ganha R$ 40 mil, R$ 50 mil? É o Robin Hood ao contrário. Não dá para o pobre pagar a vida do rico. Os regimes têm que ser iguais, até o valor da Previdência. Uma grande mudança é a complementação de aposentadoria. Não é benefício, é contribuição. Deficit vai ser zero. Folhas de inativos vão ficar maiores do que a dos ativos, precisamos ter responsabilidade. Fiz a Previcom, melhor sistema que existe, e fui eu que criei. Rondônia e outros estados estão fazendo. Pessoas vão se aposentar com R$ 30 mil, mas elas pagaram por isso.

Como o senhor vê o crescimento do PCC? O governo fracassou em relação ao combate às facções criminosas? O problema é mais complexo que isso, mas um dos maiores é essa facção que surgiu dentro do sistema penitenciário.

Combate ao crime organizado tem de ser permanente. Onde você vê pessoas juntas, há organização. No Brasil, produzimos café e laranja, mas não produzimos cocaína. Ela entra porque as fronteiras estão abertas, e o crime é, realmente, organizado. Gostei da criação do Ministério da Segurança Pública, mas não é isso que vai resolver. Vou criar uma agência nacional de segurança unindo forças armadas, políticas e tecnologia. Visitei o general Braga Neto (interventor federal no Rio de Janeiro). Outro projeto é a criação da Guarda Nacional. A Força Nacional, como está, é o mesmo que retirar de um santo para investir outro. Já a Guarda Nacional será permanente.

A proposta de reforma da Previdência foi explodida porque, entre outras coisas, no bojo de demonizados estavam os servidores públicos, que foram usados para conquistar o resto da sociedade. Não funcionou. Como será seu tratamento ao servidor?

Igualzinho ao da iniciativa privada. Não há satanização, devemos ser justos. Tem de se instituir um regime geral. Em SP, não há diferença entre juiz, delegado e pessoa normal. Tem de pagar para receber. Não tem de ter dois regimes de previdência. Estudei muito, fui a outros países. Isso é uma questão central. Brasil, que era um país jovem, hoje é maduro e caminha para ser velho. Temos de nos preocupar com o futuro. Funcionário vai atingir seu teto, mas vai fazer capitalização. E não deixar o caixa pequeno financiar o grande.

No serviço público federal existe o Funpresp, parecido com o que foi feito em SP. Quem entrou em 2016 já se submete ao fundo de previdência complementar..

É isso então. É tão correto que já foi implementado. Se não mudar esse sistema, quem vai pagar o preço é quem já é aposentado. A gente precisa explicar as coisas para a população. Dá para fazer isso na semana que vem. Com a sociedade junto, conseguiremos fazer tudo. Deficit primário estraga o país. Problemas não vão começar em 10 anos, vão começar no ano que vem. O Brasil ficou caro, perdeu agenda de competitividade. A nação virou país de renda média e depois estagnou. Um automóvel custa duas vezes e meia por aqui do que o preço cobrado pelo mesmo carro nos Estados Unidos. O minuto da ligação de celular custa oito vezes mais aqui do que lá. Precisamos abrir a economia.

Por que a reforma não foi aprovada?

Achar que vai aprovar PEC em ano eleitoral… Nem precisava da intervenção para achar que não ia aprovar. O Brasil é muito constitucionalizado. Gestão tem de passar para a lei. Nosso tempo é o tempo da mudança, da velocidade da mudança. Tudo muda muito rápido. Aqui, você precisa mexer na Constituição para tudo. Precisamos de mais flexibilidade para o país conseguir avançar.

O senhor é médico, deve ter uma proposta bem alentada para área de saúde.

É meu dever melhorar a questão da saúde. Até por ser médico. Temos o melhor sistema do mundo. Esses dias, um senhor da minha idade teve insuficiência que o levou ao coma. Era 8º na fila e subiu para 2º. O que estava em 1º morreu. Ele subiu. Um jovem morreu, pegamos o fígado, ele fez o transplante, sobreviveu e não pagou um centavo. Está perfeito. Renasceu. Governar é escolher. Agora, falta melhorar o financiamento permitindo a quem presta o serviço, os estados e municípios, poder cobrar das seguradoras e melhorar o financiamento.

Perfil

Geraldo Alckmin (PSDB)

» Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho

» Formado em medicina pela Universidade de Taubaté

» Nascido em 7 de novembro de 1952, em

Pindamonhangaba (SP).

Histórico

» 31º e 35º governador de São Paulo (2011 – 2018);

Presidente nacional do PSDB (2017 – atualmente);

22º vice-governador de São Paulo (1995 – 2001);

Deputado federal de São Paulo (1987 – 1995);