O Estado de São Paulo, n. 45820, 31/03/2019. Política, p. A8

 

Cai liminar que proibia comemorar 31 de Março

Luci Ribeiro

31/03/2019

 

 

Decisão é de desembargadora plantonista do TRF, que não vê ‘violação à legalidade

A Justiça Federal cassou ontem liminar que proibia o governo de promover a realização de eventos alusivos ao golpe de 1964, que completa hoje 55 anos. A decisão foi da desembargadora de plantão no Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, Maria do Carmo Cardoso. Apesar de “reconhecer a sensibilidade do tema em análise”, ela decidiu que a recomendação do presidente Jair Bolsonaro para comemorar a data se insere no âmbito do poder administrador.

“Não visualizo, de outra parte, violação ao princípio da legalidade, tampouco violação a direitos humanos, mormente se considerado o fato de que houve manifestações similares nas unidades militares nos anos anteriores, sem nenhum reflexo negativo na coletividade”, escreveu ela.

A liminar havia sido concedida na noite de anteontem pela juíza Ivani Silva da Luz, da 6.ª Vara da Justiça Federal em Brasília, atendendo a um pedido da Defensoria Pública da União. A Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu às 21h35 do mesmo dia e, ontem cedo, saiu a sentença da desembargadora.

Antecipando-se à data, o Exército realizou anteontem no Comando Militar do Planalto, em Brasília, cerimônia para relembrar o 31 de março – que marcou a derrubada do presidente João Goulart e o início de um período de ditadura militar. Na solenidade, em que esteve presente o comandante da Força, general Edson Leal Pujol, o episódio foi tratado como “movimento cívico militar”.

Conforme revelou o Estado, Bolsonaro orientou os quartéis a celebrarem a data histórica, que havia sido retirada do calendário de comemorações das Forças Armadas desde 2011, no governo de Dilma Rousseff. Os oito comandos do Exército realizaram cerimônias – dois deles na quinta-feira (Sul e Sudeste) e seis anteontem.

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Onde estavam os ministros militares de Bolsonaro em 64

Vera Rosa

Fábio Serapião

31/03/2019

 

 

General. A exemplo de Bolsonaro, Augusto Heleno recusa o termo ‘golpe’ para ação militar

Os generais da reserva com assento no governo Bolsonaro ocuparam funções de oficiais na estrutura das Forças Armadas e dos governos do regime militar. Conselheiro do presidente, o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno Ribeiro, de 71 anos, tinha quase 17 no dia 31

de março de 1964. “Era aluno do segundo ano Científico do Colégio Militar do Rio. Vibrei com a queda de João Goulart, um cancro na política brasileira”, disse ao Estado. A exemplo de Bolsonaro, Heleno não chama o golpe de golpe. Na sua definição, houve um movimento para conter o avanço do comunismo no País.

No começo da década de 1970, Heleno foi instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras, no Rio, onde se formaram o atual ministro-chefe da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz (turma de 1974), o vice-presidente Hamilton Mourão (1975) e o próprio Bolsonaro (1977).

No ano da formatura de Bolsonaro, Heleno, capitão recém-promovido, assumiu o cargo de ajudante de ordens do então ministro do Exército, Sylvio Frota – que tentou se impor como sucessor do presidente Ernesto Geisel e foi demitido. O grupo do entorno dele ensaiou um levante. Questionado, Heleno disse que sua participação foi “irrelevante”. “Tinha apenas 30 anos.”

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, de 65 anos, tinha 10 quando o Exército derrubou Goulart. Ele relatou que, durante o regime, se dedicou à Brigada Paraquedista, no Rio. Sua atuação, disse, foi “exclusivamente” voltada à profissão militar.

Já Santos Cruz, que tem gabinete no quarto andar do Palácio do Planalto, completava 12. O Exército tinha acabado de exterminar as guerrilhas na Amazônia quando, entre 1975 e 1977, ele concluiu os cursos de comando e guerra na selva. À pergunta sobre sua experiência na ditadura, disse que não foi “frotista” nem “castelista”. “Não faço parte de grupos estereotipados. Fui ser militar porque tinha atração pela atividade militar e era uma opção profissional que eu tinha possibilidade de acessar.”

Em 1973, no auge da repressão, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, general Floriano Peixoto, de 64 anos, se formava pela Academia Militar das Agulhas Negras. Naquele ano, outro ministro, o almirante Bento Albuquerque, de Minas e Energia, entrava para a Marinha. Nos dois últimos governos militares ele se dedicou ao programa de submarinos.

O titular da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, de 56 anos, tinha um ano quando ocorreu o golpe e no último ano do regime, 1984, formouse em Tecnologia Aeronáutica na Academia da Força Aérea. Militares mais novos, como o ministro Tarcísio Gomes (Infraestrutura), de 43 anos, não era nascido em 1964

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Regime foi tema de 1/4 dos discursos

Rodrigo Menegat

31/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

 

 

A cada quatro pronunciamentos feitos por Jair Bolsonaro durante sua passagem pela Câmara, pelo menos um mencionou o regime militar. O Estado compilou e analisou todos os discursos do atual presidente em plenário entre 2001 e 2018 – período em que ele ocupou uma cadeira de deputado. Das 901 falas catalogadas, 252 mencionam esse período histórico (28%). Geralmente em tom nostálgico, os discursos dão crédito aos militares por reprimir a oposição de esquerda e negam que tenham sido cometidas violações de direitos humanos – o que está em desacordo com o consenso historiográfico atual.