O Estado de São Paulo, n.45815, 26/03/2019. Internacional, p. A12

 

Battisti confessa participação em 4 homicídios na Itália 

Ricardo Galhardo 

26/03/2019

 

 

Tarso Genro, que concedeu asilo ao italiano, diz que confissão pode ser tentativa de reduzir pena e admite que ela legitima extradição

ANSA – 28/2/2015

Sardenha. Cela de presídio onde está Battisti; mais confortável que a maioria na Itália

O italiano Cesare Battisti admitiu ontem ser responsável por quatro assassinatos cometidos nos anos 70. Nos 40 anos em que ficou foragido, ele negou os crimes e procurou viver sob governos de esquerda que impediram sua prisão. No mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, ganhou status de asilado político, o que lhe permitiu evitar a extradição.

Ministro da Justiça que defendeu a proteção concedida a Battisti, alegando que ele sofria perseguição política, Tarso Genro avaliou ontem a admissão de culpa do italiano, que derrubou os argumentos do governo petista. Genro admitiu que a confissão dá legitimidade à extradição de Battisti, mas ressalvou que esta pode ser uma tentativa do italiano de conseguir uma transação penal.

A defesa de Battisti na Itália não se pronunciou sobre a razão para ele ter mudado sua versão, além de ter admitido prática de roubos. A confissão foi divulgada pelo procurador-chefe de Milão, Francesco Greco. “Com essa admissão, ele esclarece muitas polêmicas, rende honras às forças da ordem, à magistratura de Milão e reconhece que atuou nestes anos de maneira brutal”, afirmou. “Ele não colaborou, não ofereceu nomes de outras pessoas, portanto não é tecnicamente um arrependido. Terá de cumprir a pena integralmente”, completou Alberto Nobili, procurador antiterrorismo de Milão, que ouviu Battisti.

A hipótese de uma admissão em troca de benefícios penais foi levantada no Brasil. “Se sua declaração traduz a verdade ou é uma tentativa de transação penal jamais se saberá. O que se pode dizer, por enquanto, é que, se disse que é responsável por algum crime que lhe atribuem no processo, sua extradição se torna legítima”, disse Genro. Em fevereiro o advogado de Battisti na Itália, Davide Stecanella, solicitou redução da pena de prisão perpétua para 30 anos de detenção.

“Tenho certeza que é uma espécie de autodelação premiada”, disse a socióloga Silvana Barolo, integrante do Grupo de Defesa de Cesare Battisti no Brasil. “É igual à Lava Jato que, por sinal, teve inspiração na Itália”, disse Silvana, em referência à Operação Mãos Limpas, que serviu de modelo para atuação da força-tarefa de Curitiba.

Segundo Silvana, Battisti está satisfeito com o regime atual. Ele foi levado para a Casa Reclusione di Oristano, um presídio moderno na região da Sardenha e, por ser condenado à prisão perpétua, vai passar os primeiros seis meses em uma solitária. Mesmo assim, tem direitos que seriam considerados regalias nos presídios brasileiros e até em outras prisões italianas.

Segundo Silvana, Battisti tem direito a visitas semanais da família e a uma máquina de escrever com a qual pode continuar exercendo seu ofício de escritor. Ele tem recebido visitas de irmãos, sobrinhos e filhos que moram na Europa. A ex-mulher e o filho de Battisti que vivem no Brasil ainda não foram visitá-lo.

Battisti corre o risco de ser enquadrado no regime “41 bis”, referência a um artigo da lei italiana de execução penal, também conhecido como “regime de prisão dura”, que pode ser usado em casos de crimes específicos como envolvimento com a máfia, homicídio, sequestro, terrorismo e tentativa de subverter o sistema constitucional e só pode ser suspenso quando o condenado coopera com autoridades ou tem a pena anulada por um tribunal superior.

Pelo Twitter, o presidente Jair Bolsonaro afirmou: “por anos denunciei a proteção dada ao terrorista, aqui tratado como exilado político. Nas eleições, firmei o compromisso de mandá-lo de volta à Itália para que pagasse por seus crimes. A nova posição do Brasil é um recado ao mundo: não seremos mais o paraíso de bandidos!” Battisti fugiu no final do governo Temer para a Bolívia, onde foi preso e extraditado para a Itália, sem passar pelo Brasil.

Na Itália, Battisti, que integrava o grupo Proletário Armados pelo Comunismo, foi primeiro condenado por participação embando armado e ocultação de ar masa 12 anos e 10 meses de prisão em 1981. Mais de uma década depois, em 1993, teve a prisão perpétua decretada em razão de quatro homicídios, cometidos entre 1977 e 1979, contra um guarda carcerário, um agente de polícia, um militante neofascista e um joalheiro de Milão.

Depois de fugir da Itália, Battisti passou pelo México e encontrou refúgio na França, entre 1990 e 2004, graças à proteção do ex-presidente socialista François Mitterrand, que tinha se comprometido anão extraditar nenhum militante de extrema esquerda que tivesse renunciado à luta armada. Em 2004, Jacques Chiracdeci diu extraditá-loe ele fugiu para o Brasil./ COM AFP