O Estado de São Paulo, n. 45808, 19/03/2019. Economia, p. B3

 

Brasil aceitará dinheiro chinês, diz Guedes nos EUA

Beatriz Bulla

Ricardo Leopoldo

19/03/2019

 

 

Ministro ‘convidou’ americanos a investirem em infraestrutura no País, mas disse que governo continuará aberto a recursos da China

Nos Estados Unidos, o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez uma provocação aos americanos sobre a relação do Brasil com a China. Ao dizer que o País está aberto a investimentos, Guedes foi claro ao sinalizar que o País continuará a fazer negócio com os chineses. “Nós vemos vocês fazendo negócios com chineses há anos. Por que nós não podemos? Por que não podemos deixar eles investirem em infraestrutura?”, questionou o ministro da Economia.

De forma humorada, ele mostrou que o País está aberto a quem quiser investir em infraestrutura. “Temos um presidente que adora a América. Eu também. Adoro Coca-Cola e Disneylândia. É uma grande oportunidade para investir no Brasil. Eu os convido para essa nova parceria”, disse. “Os chineses querem dançar conosco e querem investir lá. Disse ao presidente: amamos os Estados Unidos, mas vamos fazer comércio com quem for mais lucrativo”, ressaltou.

Os EUA contam com o Brasil para diminuir a influência da China na América Latina. Guedes foi direto, em discurso a empresários na Câmara de Comércio Americana, ao dizer que o País precisa conseguir investimentos em infraestrutura para reduzir o custo Brasil, os tributos e abrir a economia.

Acordos. Hoje, os presidentes Donald Trump e Jair Bolsonaro vão se encontrar na Casa Branca. No comunicado que farão à imprensa, devem afirmar que os dois países querem caminhar para um livre-comércio. No médio prazo, no entanto, isso significa trabalhar por acordos de convergência regulatória e facilitação de comércio e investimentos. Algumas questões práticas da pauta agropecuária não devem ser resolvidas, como a reabertura do mercado americano para compra de carne in natura brasileira. Na outra ponta, os EUA pressionam pela abertura do mercado brasileiro para importação de carne de porco dos americanos.

“Se os EUA querem vender carne de porco para nós, então comprem nossa carne (bovina). Querem vender etanol? Ok, comprem nosso açúcar”, apontou o ministro. “O mais importante é que sejamos parceiros comerciais estratégicos para o futuro.”

O ministro teve uma reunião com o secretário do Comércio dos EUA, Wilbur Ross, na qual ressaltou ser importante que as grandes corporações dos dois países ampliem o diálogo. “Vamos pegar as 50 maiores empresas dos EUA e do Brasil para conversar”, apontou.”

Ao mesmo tempo, o ministro da Economia fez um apelo para que os EUA ajudem o Brasil na candidatura do País à OCDE. A entrada na organização, considerada um clube dos países ricos, é vista por Guedes como um selo de confiança internacional. “Por favor, nos ajudem a entrar na OCDE.”

Gasto público. Aos empresários, ele defendeu o governo Bolsonaro, disse que o País é uma democracia muito estável e que o presidente tinha “colhões” para controlar o gasto público. “Ninguém tinha colhões para fazer o controle do gasto público. Agora, temos alguém que tem colhões”, afirmou.

“Em 60 dias, o presidente enviou ao Congresso duas reformas muito importantes”, disse, citando o pacote anticrime, de Sérgio Moro, como a segunda reforma importante. Sobre a reforma da Previdência, Guedes insistiu que “nenhum brasileiro será deixado para trás”, mas que a seguridade social não será uma “fábrica de privilégios”.

Coragem

“Ninguém tinha colhões para fazer o controle do gasto público. Agora temos alguém que tem colhões.”

Paulo Guedes

MINISTRO DA FAZENDA

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Ministro cobra 'coerência' de Olavo em jantar

Renata Agostini

Naira Trindade

19/03/2019

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou, em encontro em Washington, no domingo, cobrar “coerência” do escritor Olavo de Carvalho, conforme relato feito por ele a pessoas próximas. O gesto foi uma tentativa do economista de mostrar o risco da postura de Olavo para a administração que ajudou a formar. Em Brasília, porém, o encontro reverberou como o selo de poder que faltava a Olavo.

Nas críticas desferidas pelo escritor na internet contra a ala militar do governo, Guedes viu um ataque que não poderia partir de um dos ideólogos do movimento conservador que ajudou a colocar Bolsonaro no poder. “Pariu e não quer responsabilidades? Indicou um ministro e, em menos de dois meses, quer derrubar? Então indicou mal, não é mesmo?”, disse Guedes a um interlocutor.

A declaração de Guedes surpreendeu até aliados do Instituto Millenium. Amigo de Guedes e cofundador do instituto, o economista Hélio Coutinho Beltrão disse que tudo não passou de um “recado” para que o “guru” deixe de lado os ataques e se empenhe em ajudar a aprovar as pautas econômicas. “Foi uma crítica construtiva em tom cordial. Aquilo não combina com o que Guedes pensa. Certamente, Guedes não vê Olavo como um líder liberal”, disse.

Alunos de Olavo de Carvalho em Brasília, no entanto, descartam que o escritor atenda ao apelo de Guedes. Há, inclusive, temor de que o economista possa virar também alvo dos ataques virtuais do escritor.

Guedes e Olavo não se cruzaram na campanha. Nos bastidores, o economista disse que tem amigos que foram influenciados por Olavo, mas que não conhece sua obra. No jantar, Guedes foi lembrado de que os dois haviam sido apresentados décadas atrás. Não se recordava.

_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Agronegócio se queixa de declarações de Araújo

Camila Turtelli

Letícia Pakulski

19/03/2019

 

 

Associações do setor citam, em carta à FPA, aula de chanceler onde ele disse que País não vai vender ‘alma à China’

Interceptada. Carta não foi entregue ao chanceler Araújo

O setor agropecuário manifestou, em carta obtida pelo Estadão/Broadcast, preocupação quanto às declarações do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, sobre a relação do Brasil com a China. A carta foi enviada por associações que integram o Instituto Pensar Agro como sugestão para a presidência da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). O presidente da FPA, Alceu Moreira, decidiu não entregar a manifestação, depois de encontros com o governo e, principalmente, após a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, anunciar uma missão para a China.

“A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) gostaria de externar a sua preocupação em relação às supostas declarações reproduzidas pelo noticiário nacional, nas quais teriam sido feitas afirmações no sentido de diminuir a importância das relações comerciais entre Brasil e China”, diz a carta. Em aula magna para os alunos do Instituto Rio Branco, na semana passada, o ministro falou, entre outros tópicos, sobre a relação diplomática com a China. “Queremos vender, por exemplo, soja e minério de ferro, mas nós não vamos vender a nossa alma. Isso é um princípio claro que temos muito presente”, disse.

“Muita gente quer que nós vendamos a nossa alma e muita gente não acha que tenhamos nenhuma alma para vender. E querem reduzir a nossa política externa a simplesmente uma questão comercial. Isso não vai acontecer.”

A carta destaca que a China se tornou o principal parceiro comercial do País desde 2009. “O desenvolvimento da economia chinesa tem elevado as demandas dos produtos agrícolas brasileiros”, diz a carta, ressaltando que o Brasil tem superávit de US$ 32 bilhões com os chineses e que os produtos mais exportados aos chineses são soja, celulose, carne bovina, frango, açúcar e algodão.

Visita. Por meio de sua assessoria, a presidência da FPA informou que Moreira fará uma visita oficial ao chanceler para apresentar a pauta do agronegócio. A reunião ainda não tem data, mas deve ocorrer após a visita oficial aos EUA. Moreira já teve reuniões com a ministra da Agricultura e com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

A carta assinala ainda que “o estabelecimento de uma agenda pautada no pragmatismo econômico é o único caminho possível para quem vislumbra o crescimento econômico de uma Nação”. “Reiteramos nossa confiança em vossa capacidade para trilhar esse caminho, com a sensibilidade de que o agronegócio brasileiro não pode abrir mão de seus principais parceiros estratégicos, com quem mantém próxima relação comercial”, aponta.

Discórdia

“Queremos vender, por exemplo, soja e minério de ferro, mas nós não vamos vender a nossa alma. Isso é um princípio claro que temos muito presente.”

Ernesto Araújo

MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES