Valor econômico, v.19, n.4632, 19/11/2018. Brasil, p. A2

 

Com nova lei, visto de residência para trabalhador estrangeiro ganha força 

Ana Conceição 

19/11/2018

 

 

Diana Quintas, da Fragomen, vê lacunas na nova legislação de imigração

As autorizações de residência para trabalhadores estrangeiros cresceram após a regulamentação da nova lei de imigração, que completa um ano na próxima quarta-feira. No primeiro semestre, houve um aumento de 15% nessas permissões sobre o mesmo período do ano passado (de 12 mil para 13,8 mil), segundo os dados mais recentes da Coordenação Geral de Imigração (CGIg) e do Ministério do Trabalho.

Especialistas esperam que os números continuem em alta no fechamento do ano, porque a nova legislação facilitou tanto a entrada de estrangeiros quanto a regularização de quem já estava em solo brasileiro.

A maioria dos estrangeiros que obtiveram autorização de residência para fins de trabalho tem, pelo menos, o equivalente ao ensino médio, 12,6 mil. E três em cada cinco (ou 8,3 mil) possuem ensino superior - eram 6,3 mil no primeiro semestre do ano passado, uma alta de 33%.

Segundo Hugo Gallo, presidente do Conselho Nacional de Imigração (CNIg) e coordenador-geral da CGIg, um relatório sobre a regulamentação será publicado ainda este ano e a partir dele será possível dizer se a lei teve impacto mais significativo no fluxo migratório para o país.

Profissionais que trabalham com imigração consideram a lei progressista por tornar o país mais aberto a quem vem de fora e acreditam que ela pode contribuir para atrair profissionais qualificados num momento de expansão do mercado de trabalho. A legislação substituiu o Estatuto do Estrangeiro, que tratava a imigração como assunto de segurança nacional.

Apesar dos elogios, a regulamentação ainda gera dúvidas e críticas sobre algumas regras que dizem respeito ao trabalho estrangeiro. Para Diana Quintas, sócia da Fragomen, que presta serviços de imigração, a regulamentação da lei tem sido "atribulada".

Ela cita como exemplo de problemas algumas resoluções publicadas pelo CNIg que, em sua visão, tornaram mais rígidas a concessão de vistos para o trabalhador com curso de pós-graduação e para o trainee.

"Antes, um pós-graduado não tinha que comprovar experiência e agora precisa. O tempo do visto de trainee aumentou de um para dois anos, mas agora exige-se um detalhamento muito maior de informações sobre o treinamento que será dado a ele", diz Diana, que vê em ambas as regras uma tentativa de proteger o mercado local, algo que vai na contramão do espírito da lei - que é tornar o país mais aberto.

A executiva ainda aponta algumas lacunas como a não regulamentação do visto de trabalho para atividades de auditoria e consultoria, que recebem visto de visita e por isso têm autorização para permanecer em território brasileiro por apenas 90 dias.

Como ponto positivo, Diana aponta a institucionalização dos vistos temporários para acolhida humanitária.

João Marques, presidente da Emdoc, consultoria jurídica de imigração, diz ser natural haver um período de ajuste dos órgãos públicos e das empresas ao novo marco. "A adaptação não tem sido tão rápida, mas isso já era esperado. De qualquer forma, o processo ficou menos burocrático", acredita o empresário, para quem a tendência é de aumento de trabalhadores estrangeiros à medida que a economia se recuperar. "As autorizações de trabalho caíram de 29 mil para 11 mil ao ano ao longo da crise."

A segurança jurídica para as empresas que contratam estrangeiros, afirma, também aumentou. "Ainda dá para melhorar. De zero a dez, o Brasil era 3 em segurança jurídica, agora é 5 ou 6", afirma Marques, para quem a lei contribui para atrair o trabalhador estrangeiro.

Hugo Gallo, do CNIg, diz que o tempo para fazer toda a regulamentação foi curto e por isso houve percalços. "Regrar um processo altamente complexo, que envolve diversas pastas, num prazo de 180 dias é um esforço hercúleo", afirma.

Para ele, a fase mais conturbada do processo de regulamentação foi superada e agora o conselho tem se dedicando a temas mais específicos, como políticas para atração de mão de obra especializada e de investimentos. Dois grupos de trabalho foram formados para cuidar desses dois temas. "Vemos a imigração como um vetor de crescimento e investimento", diz.

Para João Marques, a atração de trabalhador estrangeiro para setores estratégicos tem que se tornar política pública. "É fundamental. Isso traz desenvolvimento ao país", defende.