Correio braziliense, n. 20375, 04/03/2019. Mundo, p. 11

 

Guaidó anuncia retorno

04/03/2019

 

 

Fora da Venezuela desde o último dia 22, o presidente autoproclamado do país, Juan Guaidó, anunciou o fim de sua viagem por países latino-americanos e o retorno à Venezuela, situação que coloca Nicolás Maduro em um novo impasse. O líder da oposição não deu detalhes sobre a viagem de volta —  ontem, ele estava no Equador, onde se encontrou com Lenin Moreno — e, pelo Twitter, convocou os venezuelanos a se manifestarem contra o governo de Maduro hoje e amanhã, às 11h.

Guaidó deixou a cidade litorânea de Salinas em um avião da Força Aérea Equatoriana em direção a Guayaquil. Não foi divulgada a rota que será percorrida em seguida. “Volto na segunda ou na terça-feira, embora também seja carnaval na Venezuela. Hoje, temos pouco a comemorar e muito a fazer. Vamos convocar protestos”, disse a jornalistas, no Equador, o presidente autoproclamado. Aos seguidores virtuais, pediu que fiquem “atentos às redes oficiais”, por meio das quais ele vai informar sobre os pontos de concentração. “#VamosBien porque vamos todos. Vamos Venezuela!”, escreveu.
O retorno de Guaidó, que visitou a Colômbia, Brasil, Paraguai, Argentina e Equador, representa um verdadeiro desafio para o presidente Nicolás Maduro, que deve decidir se vai prendê-lo, o que pode provocar uma forte reação internacional, ou deixá-lo entrar no país com tranquilidade, minando sua autoridade. Há poucos dias, Maduro disse que o opositor deveria “respeitar a lei” e que, se voltar ao país, “terá que ver a face da Justiça”.
A Suprema Corte de Justiça e a Procuradoria-Geral, aliadas do governo, abriram investigações contra Guaidó, acusando-o de “usurpação” de funções. Os órgãos determinaram, além do impedimento da saída do país, o congelamento dos bens do líder opositor. No entanto, até agora, Guaidó não foi formalmente acusado.
No sábado, a União Europeia, o Brasil e outros países divulgaram comunicados advertindo contra ameaças à vida e à liberdade dele e lembrando que, por ser deputado, tem imunidade. “O desafio chegou longe demais. Se entrar e o prenderem, vão gerar fortes reações internas e internacionais. Maduro está em risco permanente”, disse à Agência France-Presse (AFP) de Notícias o cientista político Luis Salamanca.
Ajuda humanitária
Guaidó desobedeceu a proibição de deixar a Venezuela ao cruzar a fronteira com a Colômbia para coordenar o envio de ajuda humanitária a seu país. A operação, chamada Dia D da oposição, foi articulada com os Estados Unidos, a Colômbia e o Brasil, e também tinha desfechos capazes de comprometer a imagem do governo venezuelano: permitir ou não a entrada de alimentos e suprimentos médicos, além da esperada debandada de militares. Apesar de mais de 400 deserções, a cúpula das Forças Armadas se manteve fiel a Maduro.
Fontes informam que uma das soluções cogitadas em Caracas é que o opositor seja impedido de entrar no país por autoridades migratórias, o que o levaria a uma espécie de exílio. Caso seja detido, Guaidó pode ter um destino parecido ao de Leopoldo López, seu mentor político. O líder do partido Vontade Popular está detido desde 2014 e, hoje, em prisão domiciliar.
Guaidó, 35 anos, se autoproclamou presidente em 23 de janeiro, após o Congresso ter declarado Maduro “usurpador” por ter assumido um segundo mandato, em 10 de janeiro, após uma reeleição considerada fraudulenta. Desde então, o opositor tem convocado protestos pelo país. Segundo organizações não governamentais, as  marchas deixaram cerca de 40 mortos e centenas de feridos.
“O desafio chegou longe demais. Se entrar e o prenderem, 
vão gerar fortes reações internas e internacionais. Maduro está em risco permanente”
Luis Salamanca, cientista político
EUA: volta à Monroe
O conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, John Bolton, citou a Doutrina Monroe, uma estratégia que tinha o objetivo de, no século 19, anular a influência de países europeus nas novas repúblicas do continente americano, para justificar a atual política americana para a Venezuela. Em entrevista ao programa State of The Union, da rede CNN, Bolton foi questionado sobre as razões de o governo Trump ser mais brando com outros regimes considerados ditatoriais.
“Neste governo, não temos medo de usar a expressão Doutrina Monroe. Trata-se de um país no nosso hemisfério. Manter um hemisfério completamente democrático sempre foi o objetivo de presidentes americanos desde Ronald Reagan”, respondeu.
Bolton afirmou ainda que os EUA estão buscando o fim da “troica da tirania”, incluindo Cuba, Nicarágua e Venezuela, Segundo ela, a presença de cubanos no território venezuelano é parte do problema.