O globo, n. 31291, 09/04/2019. Sociedade, p. 27

 

À frente do MEC, um economista novato em gestão educacional

Geralda Doca

Gustavo Maia

Sérgio Roxo

09/04/2019

 

 

Indicado para aplacar crise na pasta, o ex-secretário-executivo da Casa Civil já teceu elogios a Olavo de Carvalho e defendeu o fim do ‘marxismo cultural nas universidades’

Indicado ontem para resolver a paralisia que se abateu sobre o Ministério da Educação (MEC) no governo Bolsonaro, o paulistano Abraham Bragança de Vasconcellos Weintraub, de 47 anos, é um neófito na gestão educacional.

Economista com experiência no mercado financeiro, Weintraub caiu nas graças do ministro da Casa Civil e deputado federal licenciado, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), e, depois de participar da formulação do plano de governo, passou os primeiros três meses do ano como seu secretário-executivo.

Em declaração divulgada ontem, Onyx elogiou o novo ministro, “um homem com sólida formação”, familiarizado com a iniciativa privada e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp):

—Foi um dos que muito cedo acreditaram na candidatura Bolsonaro. Foi um dos formuladores do plano de governo e é uma pessoa importante nas tomadas de decisão.

Mestre em Administração na área de finanças pela Faculdade Getulio Vargas (FGV), Weintraub foi chamado de “doutor” por Bolsonaro no anúncio de sua nomeação, feito pelas redes sociais. Quase uma hora e meia depois, o presidente se corrigiu e disse que o indicado fez mestrado e um MBA Executivo Internacional em Finanças. Ele completou a graduação em Ciências Econômicas pela Universidade de São Paulo (USP) em 1994.

Para além da formação acadêmica, Weintraub relata em seu currículo ter sido executivo do mercado financeiro, “com mais de 20 anos de experiência”. Atuou, segundo ele, como sócio em uma gestora de investimentos, como diretor estatutário do Banco Votorantim e como CEO da Votorantim Corretora no Brasil e da Votorantim Securities, nos Estados Unidos e na Inglaterra, “além de ter sido economista-chefe por mais de dez anos”.

Como professor, destaca como uma de suas “maiores satisfações pessoais” o que classificou como “boa receptividade dos alunos” ao método e à abordagem de ensino que adota.

Em carta de 2014 direcionada ao departamento de Contabilidade, na qual respondia a acusações de nepotismo por trabalhar na mesma faculdade que seu irmão, Arthur — jurista e hoje assessor-chefe adjunto de Bolsonaro —, e sua mulher, Daniela, Weintraub afirmou ter se inscrito em dois concursos da Unifesp, tendo sido aprovado no de Contabilidade “apenas porque os outros quatro candidatos não apareceram no dia”. Sua mulher também teria sido aprovada por falta de interessados na vaga.

Na mesma mensagem, ele afirma que seu pai, médico e professor da USP durante a ditadura militar, foi perseguido por denunciar o desaparecimento de alunos.

Em 2015, Weintraub fundou o Centro de Estudos em Seguridade (CES), que se apresenta como uma associação civil sem fins lucrativos fundada por professores dos cursos de Atuária e Contabilidade da Unifesp. A Unifesp chegou a abrir uma sindicância em 2018 para investigar o uso indevido do logo da universidade pela CES. Procurada ontem, a universidade informou apenas que não há “procedimento aberto sobre o assunto”.

'Derrotar o comunismo'

No ano passado, o CES foi a única instituição a apoiar a realização da Cúpula Conservadora das Américas, evento idealizado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente. Em Foz do Iguaçu, os Weintraub palestraram sobre economia, em dezembro passado. Apenas uma referência foi feita à educação, quando o agora ministro afirmou que “precisamos vencer o marxismo cultural nas universidades”.

— Eu e meu irmão vamos contar como foi a nossa experiência em aplicar a teoria de Olavo de Carvalho em, democraticamente, lidar com o marxismo cultural —disse, na ocasião.

Weintraub destacou por diversas vezes que será preciso derrotar o comunismo para que o país volte a crescer. E os comunistas, afirmou, “estão no topo do país, donos das organizações financeiras, dos jornais e dos monopólios”.

—Agora que Jair Bolsonaro ganhou, o PT está derrotado. Podemos estar tranquilos? Não podemos. Essa turma vai voltar para a casa, eles são inteligentes. O meu inimigo é igual ou tão mais forte do que eu, senão eu sou um trouxa.

Procurado pelo GLOBO, Weintraub não quis dar entrevista. Afirmou apenas que, “nos primeiros dias, minha prioridade é assumir (o cargo)”.

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Bolsonaro diz que não poderia deixar pasta ‘sangrando’

09/04/2019

 

 

Para Mourão, queda de Vélez foi a ‘crônica de uma morte anunciada’; disputa entre ala ideológica e militares marcou gestão

Horas depois de demitir o ministro Ricardo Vélez Rodríguez, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, em entrevista à Rádio Jovem Pan, que o MEC acumulava uma “série de problemas” e não poderia deixar o“ministério sangrando ”. P orisso, preferiu entregar o cargo a uma “pessoa do ramo”, referindo-se ao economista e professor universitário Abraham Weintraub:

— O ministro (Vélez) não tinha essa expertise (de gestão), aí foi acumulando uma série de problemas e, lamentavelmente, chegamos à situação em que tivemos que substituir nosso querido Vélez. É uma pessoa simpática, amável e competente, mas a questão da gestão deixou a desejar —disse Bolsonaro.

O vice-presidente Hamilton Mourão definiu a queda de Vélez como a “crônica de uma morte anunciada”.

— O presidente (Bolsonaro) deu tempo para ele (Vélez) tentar se ajustar, mas ele não conseguiu. Então teve que trocar o ministro.

No Twitter, o ideólogo de direita Olavo de Carvalho escreveu: “Desejo toda sorte do mundo ao ministro Weintraub, e só advirto: se aparecer algum Croquetti dando palpite, esconda-se no banheiro”. O termo “croquetti” seria uma referência a Ricardo Roquetti, que esteve na origem da crise no MEC e foi demitido quando tentava afastar da pasta seguidores de Olavo.

Também na rede social, Vélez agradeceu a Bolsonaro pela “oportunidade de estar à frente do MEC”: “Confio em sua decisão e me despeço desejando ao professor, Abraham Weintraub, sucesso no cumprimento de sua missão”.

Em pouco mais de três meses, a gestão de Vélez teve 15 demissões em sua cúpula, coma disputa por cargos estratégicos entre a ala ideológica e os militares. Enfraquecido, o minis tronem sequer conseguiu nomear o seu secretárioexecutivo, que éon úmero dois na hierarquia da pasta.

Olavo, que indicou Vélez para o MEC, rompeu com o ministro. Bolsonaro, que há menos de duas semanas disse que a demissão do titular era “fake news”, mudou de ideia e sinalizou na sexta-feira passada que o ministro estava com os dias contados.