O globo, n. 31291, 09/04/2019. Mundo, p. 26

 

Mourão: ‘Não há fôrma de bolo para a Venezuela’

Paola de Orte

09/04/2019

 

 

Em viagem aos EUA, vice-presidente reafirma que solução para crise no país deve vir dos venezuelanos, e cobra ação das Forças Armadas locais contra Maduro; Bolsonaro diz que, se houver ação militar externa, consultará Congresso

Após encontro com o vicepresidente americano, Mike Pence, em Washington, o general Hamilton Mourão afirmou que não há “uma fôrma de bolo” para resolver a crise na Venezuela, mas insistiu que a situação tem que ser solucionada pelos venezuelanos e pressionou as Forças Armadas do país vizinho a agirem. O brasileiro garantiu que nenhum país do Grupo de Lima — formado por 14 nações do continente — ou mesmo os Estados Unidos irá intervir militarmente.

—Está nas mãos das Forças Armadas venezuelanas conseguir controlar aqueles componentes que existem lá dentro ligados a milícias, coletivos, de modo que não descambe na violência, e oferecer uma saída para o presidente Maduro de modo que se possa convocar eleições livres sob a supervisão da Organização dos Estados Americanos e, consequentemente, a Venezuela retome a sua vida como nação realmente independente — disse, completando em seguida: — Nenhum de nossos países irá intervir na Venezuela de maneira militar. A intervenção que está sendo feita é política e econômica.

O vice-presidente brasileiro também contou ter conversado com Pence sobre a China, e afirmou que seu colega americano disse que entende que a China é um “grande parceiro do Brasil”.

— Deixei claro para ele que nós buscamos com a China um relacionamento estratégico na busca de benefícios mútuos para nossos dois países.

Bolsonaro destoa de vice

Mourão está nos EUA desde sexta-feira, e em Washington desde domingo. Fontes do governo brasileiro revelaram no domingo que o papel de Cuba na sustentação do regime venezuelano seria um dos temas a serem tratados na reunião com o vice americano. Na semana passada, Pence já anunciara novas sanções contra navios e empresas que transportam petróleo da Venezuela para Cuba. A ideia seria atingir os governos dos dois países, cujos regimes se apoiam mutuamente contra as pressões americanas.

—Há esta participação na Venezuela de um grande número de cubanos que administram a Inteligência da Venezuela e também são os responsáveis pelo controle dos coletivos e das milícias. — disse Mourão, referindose aos grupos paramilitares usados pelo governo Maduro na repressão a opositores.

O vice-presidente também disse que a “maioria dos componentes desses coletivos são criminosos que saíram da prisão”.

Por sua vez, o presidente Jair Bolsonaro, em entrevista a Rádio Jovem Pan, não foi tão taxativo sobre descartar uma invasão da Venezuela. Segundo ele, repetindo as recorrentes declarações do presidente dos EUA, Donald Trump, “todas as possibilidades” estão sobre a mesa.

— O que o Brasil pode fazer? Vamos supor que haja uma invasão militar lá. A decisão vai ser minha, mas eu vou ouvir o Conselho de Defesa Nacional e o Parlamento. A Venezuela não pode continuar como está.

Na entrevista , Bolsonaro fez a ressalva de que uma ação militar na Venezuela pode levar a ações de guerrilha e durar tempo demais. Ele disse que a atuação no momento do Brasil e dos EUA visa a criar fissuras no Exército venezuelano para tirar o apoio dado pelos militares do país a Maduro.

Outro item tratado na reunião entre Mourão e Pence foi a situação na Nicarágua, que forma com Venezuela e Cuba o que o conselheiro de Segurança da Casa Branca, John Bolton, chama de “troica da tirania” a ser combatida pelos EUA. Questionado se o governo brasileiro tinha a mesma visão, Mourão respondeu:

— São três países, são três situações distintas, que, no nosso caso, o que influencia mais é Venezuela.

Apoio ao muro de Trump

Mourão afirmou ainda ter conversado com Pence sobre a presença dos russos na Venezuela, assunto que “obviamente o preocupa”.

— A Rússia é uma potência externa ao nosso subcontinente, mas nós temos boas relações com o país, e eu vejo que a Rússia está tentando proteger os seus interesses, uma vez que ela investiu bastante lá — disse o vice-presidente brasileiro.

Mourão e Pence também discutiram o convite dos EUA para que o Brasil seja um aliado extra-Otan, feito por Trump na visita de Bolsonaro ao país, mês passado. Mourão disse achar ser bom para a indústriade defesa do Brasil, que poderia ter novos mercados.

Mais cedo ontem, em declaraçõesao sair da Embaixada do Brasil depois de uma reunião com diplomatas, o vice-presidente disse apoiara construção do muro na fronteira com o México. Hoje, ele se reunirá com membros da Comissão de Relações Exteriores do Senado americano.