O globo, n. 31260, 09/03/2019. Economia, p. 22

 

Desigualdade de gênero no trabalho sobe com a idade

Daiane Costa

Johanns Eller

09/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

 

Estudo do IBGE mostra que, à medida que a idade avança, aumenta a desigualdade salarial das mulheres em relação aos homens. Dos 25 aos 29 anos, elas ganham 87% do rendimento médio deles, proporção que cai para 75% entre os 40 e os 49 anos. Envelhecer para a mulher no Brasil representa ganhar cada vez menos que o homem, diz estudo divulgado ontem pelo IBGE. A pesquisa comparou o rendimento médio de trabalhadores de 25 a 49 anos de idade dos dois grupos. Essa desvantagem salarial existe independentemente da profissão. Da auxiliar de serviços gerais às gerentes, em média as mulheres recebem menos conforme avança a idade.

Em 2018, trabalhadoras mais jovens, de 25 a 29 anos, recebiam 87% do rendimento médio dos homens. Entre 30 a 39 anos, elas ganhavam 81,6%. Entre as de 40 a 49 anos, isso baixa para 75%. — As mulheres mais novas têm escolaridade maior e estão em ocupações que pagam mais. A maternidade e os cuidados com a família muitas vezes acabam levando a mulher a se afastar do mercado. Quando ela volta, tem mais dificuldades de se inserir com o mesmo salário — explica Adriana Beringuy, do IBGE. Também contribui para essa diferença salarial o fato de menos mulheres ocuparem cargos de chefia, algo geralmente alcançado na maturidade, complementa Ana Amélia Camarano, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Para Ana Amélia, a tendência é que essa diferença diminua, já que as novas gerações são mais escolarizadas. Segundo Adriana, do IBGE, todos ganham mais quando ficam mais velhos, só que o avanço dos rendimentos dos homens é mais acelerado que o das mulheres. Enquanto os homens de 40 a 49 anos ganham 59% mais que os de 25 a 29 anos, entre as mulheres a alta é de 37%.

Demissão ao ser mãe

A professora Bianca Nogueira, de 40 anos, de São Paulo, trabalhava em um colégio renomado da capital paulista e foi demitida logo após retornar da licença-maternidade. Hoje, ganha ametade do salário que recebia antes da gravidez. Uma outra escola queria lhe pagar salário inferior ao dos professores já contratados para a mesma função:

— Sabiam que, por ser mãe de criança pequena, seria mais fácil eu aceitar ganhar menos para voltara ter emprego. Levantamento do economista Bruno Ottoni, da Fundação Getulio Vargas e da Consultoria iDados, constata que os rendimentos das mães são 35% menores do que os de mulheres sem filhos. —A maternidade é um ônus n avidadas mulheres, e a sociedade não quer pagares saconta. Cadafilho que geraéu ma pedra que ela coloca na sua carreira profissional. Nossa participação no mercado de trabalho aumentou, mas nosso salário vai lá para baixo —resume a economista da UFF Hildete Pereira de Melo. Em qualquer ocupação, inclusive as que exigem mais escolaridade, a desigualdade persiste. Elas representam 63% dos profissionais de ciências e intelectuais (economistas, médicos, advogados, professores universitários e químicos). Mas o salário correspondem a apenas 65% do que é pago aos homens da área. 

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Bolsonaro critica BB por exigir curso contra assédio

Gabriela Valente

09/03/2019

 

 

Presidente diz que aula é requisito para ingressar no banco, mas treinamento faz parte de processo de promoção de funcionários

Na véspera do Dia Internacional da Mulher, o presidente Jair Bolsonaro utilizou seu perfil no Facebook para criticar o fato de o Banco do Brasil tornar obrigatório um curso de diversidade e de prevenção e combate ao assédio moral e sexual. Além de avisar que havia ordenado à cúpula do banco que abolisse a formação, chegou a aconselhar os postulantes a cargos na instituição que procurassem a Justiça. Na avaliação do presidente, questões relacionadas a assédio moral e sexual, além de diversidade, deveriam ser tratadas na área da educação. Bolsonaro, no entanto, confundiu a finalidade do curso ao fazer sua crítica. Disse que era um requisito para passar num concurso público do banco, mas as aulas fazem parte, na verdade, do processo interno de formação e promoção de funcionários.

'Aparelhamento'

A instituição oferece vários cursos on-line de aprimoramento para os servidores. Eles somam pontos, que classificam os funcionários para promoções que surgem dentro do banco. A maior parte é optativa. A única exigência é que seja feito um conjunto de aulas que trata de ética, respeito no trabalho, fim do preconceito e combate ao assédio. O tema é considerado prioritário e, por isso, o BB orienta que o treinamento seja feito durante a jornada de trabalho. Bolsonaro, entretanto, atacou a exigência desses cursos numa seleção interna para assistente técnico. — Olha só o nível de aparelhamento que existe no Brasil. Isso aqui é processo de educação. Não precisa fazer curso nesse sentido. Nos futuros editais, não teremos mais essa obrigatoriedade—disse o presidente ao confundir o processode promoção com concurso público: — Um conselho que dou a vocês é: se, porventura, alguém que for aprovado no concurso e for exigido esse diploma, você pode entrar na Justiça, que tu vai ganhar (sic). Se bem que vou tentar junto ao Banco do Brasil ainda para que se evite isso.

Um dos cursos que o BB exige é o de equidade de gênero. “A rigidez do que é do homem e da mulher gera preconceitos, discriminação e violências de naturezas diversas. E as mulheres são o principal foco disso. Apesar de estarem plenamente aptas a exercerem funções de liderança e comando, as mulheres ainda são minoria nessas posições porque o preconceito e a discriminação também se fazem presentes no ambiente corporativo”, diz o vídeo. O curso ainda trata das relações de poder do homem sobre a mulher e trabalha para prevenir não apenas assédio sexual no trabalho, mas violência doméstica. Questionado sobre o comentário do presidente, o BB informou que não se manifestará.

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Avanço lento em direção ao mesmo salário dos homens

Cássia Almeida

09/03/2019

 

 

Minha mãe, ainda no início dos anos 1960, teria de pedir permissão ao meu pai para trabalhar fora. Cinquenta e sete anos depois, eu ganho em média 79% do que recebe o homem. A minha filha, de 19 anos, escutou do professor, em plena aula, piada sobre qualé a semelhança entre o cérebro da mulher e um conjunto vazio. Mesmo com os avanços, ainda somos consideradas inferiores, o quenos afastadas ciências, dos cargos de chefia enos mantém reféns do trabalho reprodutivo, de cuidados e doméstico, como se fosse obrigação demais dametade d apo pulação doar cer cade 20 horas de sua semana para esse trabalho, que nos tira tempo para a ocupação remunerada, enquanto o homem dedica ametade desse tempo à casa e à família. Quando o homem casa, essa carga diminui. A aproximação dos salários vem a passos lentos. Em 2004, ganhávamos 70% do que recebia o homem; em 2005, 71%, parcela que permaneceu até 2009, chegando a 76,8% em 2014 e 79,5% em 2018. Demoramos 14 anos para conseguir ganhar nove pontos percentuais. Esse avanço é mais fruto do aumento da escolaridade feminina—somoscursos superiores desde 1997 — do que resultado de política pública ou ação nas empresas.

A mulher, sozinha ou com o movimento feminista, é que tem cavado a inserção no mercado, mesmo que seja mais na área de cuidados — na qual o salário é menor. Até no trabalho doméstico, o homem ganha mais.

Enãoéoú nico exemplo. O IBGE mostrou que entre professores de ensino fundamental, no qual 84% são mulheres, o salário delas é 10% menor. Entre os médicos, 53% são mulheres, mas o ganho é 70% do que recebe o homem. O machismo arraigado em instituições, famílias, empresas, governo, Parlamento e Justiça oprime a mulher. Há até quem as culpe pela opressão. Em conversas sobre o tema, é comum ouvir “mas as mães não sabem educar seus filhos”. Devemos ter em mente que somos oprimidas, não culpadas.