Valor econômico, v. 18, n. 4460, 13/03/2018. Brasil, p. A4

 

Cai desemprego entre chefes de família, mas ocupação é precária

Bruno Villas Bôas 

13/03/2018

 

 

Principal responsável pelas despesas de casa, Erick Herthal, 36 anos, era gerente de um restaurante em Cabo Frio, na região dos Lagos do Estado do Rio, quando a crise começou a afetar sua vida. Primeiro, o menor movimento de clientes reduziu seu salário, de R$ 9 mil para R$ 3 mil mensais. Depois, saiu do emprego e optou mudar de cidade. Casado e pai de uma menina de cinco anos, Herthal decidiu começar a vender quentinhas para pagar as contas.

"Vender comida transportada é um modo de sobrevivência. Não tem plano de saúde, nem garantias. O resultado tem sido, inclusive, aquém do esperado. Mas é algo que ajuda a pagar as contas e abre uma oportunidade de negócio", disse ele, que vende de 50 a 80 quentinhas diariamente no porta-malas de seu Ford Ecosport vermelho, estacionado numa esquina do centro do Rio.

O caso de Herthal é um entre milhares de chefes de família que estão se reinserindo no mercado de trabalho via ocupações precárias. Desde o segundo trimestre de 2017, período que marca o início de recuperação do emprego no país, 441.759 deles conseguiram se reocupar, considerando dados já ajustados sazonalmente. Nesse intervalo, a taxa de desemprego desse grupo recuou de 8,1% para 7,9%.

Os números, levantados por Cosmo Donato, da LCA Consultores, a partir dos microdados da Pnad Contínua, do IBGE, mostram uma recuperação ainda tímida ante às perdas da crise. Durante a crise, o número de chefes de domicílio desempregados dobrou, de 1,5 milhão de pessoas no quatro trimestre de 2014 para 3,4 milhões no primeiro trimestre de 2016, uma alta de 125%.

O fenômeno de desemprego de chefes de família preocupa pelo potencial de desestruturar lares. A necessidade de recompor a renda familiar empurra para o mercado de trabalho demais integrantes da casa, como cônjuges e filhos. Isso gera pressão adicional de oferta de mão de obra. Segundo o IBGE, 5,1 milhões de pessoas tornaram-se economicamente ativas desde o quatro trimestre de 2016.

 

 

"Existem mais de 3 milhões de chefes de família desempregados, mas vimos um início de recuperação. Acredito que esse chefe de família terá mais condição de conseguir emprego neste ano, com a economia crescendo em ritmo mais acelerado, de 2,5%. Isso vai gerar espaço para mais confiança de empresários e contratação de mão de obra, inclusive formal", afirma o economista.

Nesse processo, os mais jovens passam a dividir seu tempo de estudo com o trabalho - ou, pelo menos, a procura por ele. O economista Sérgio Firpo, do Insper, que estudou o fenômeno do desemprego entre chefes de famílias na crise, diz que existe uma geração de jovens afetada pelo desemprego de seus pais, os chamados "filhos da crise". Entre eles, adultos jovens que precisaram deixar a faculdade.

"Para que esse jovem volte exclusivamente a estudar será preciso, inclusive, que o chefe da família volte a conseguir um emprego formal, com horizonte profissional. Creio que poucas pessoas que precisaram ir vender quentinha na rua consigam pagar uma conta de faculdade, até porque em geral a renda dele é menor, perdeu benefícios", disse o professor do Insper.

Conforme o levantamento da LCA, entre os 441.759 chefes de famílias que conseguiram emprego desde o segundo trimestre de 2017, 254 mil ocuparam-se no trabalho por conta própria, inserção associado à informalidade. Outros 50 mil conseguiram vaga como empregados no setor privado, mas sem ter a carteira de trabalho assinada.

Apesar do emprego informal ter geralmente baixa qualidade e pagar piores salários, o rendimento médio do chefe de família cresceu 4,65% desde o segundo trimestre, para R$ 2.524. Por trás dessa melhora está a queda da inflação no ano passado. Os trabalhadores receberam reajuste com base no INPC de 2016, que foi de 6,58%. Mas a inflação de 2017 foi de apenas 2,07%.

Na média, consultorias e instituições financeiras antecipam um ano de recuperação do emprego formal. Em 2017, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, identificou o fechamento de 20.832 vagas. Especialistas consultados pelo Valor Data em dezembro projetavam geração líquida de 850 mil vagas em 2018.

"Eu não tenho mais plano de saúde. É muito caro pagar. Se melhorar agora, posso voltar. Mas estou de olho em oportunidades. O Comperj, da Petrobras, que pode voltar. Se isso acontecer, vai abrir oportunidade de vendas em Itaboraí", disse Herthal, que tirou CNPJ de olho nas oportunidades do Comperj e para aceitar cartão-alimentação.

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Produtividade requer país mais aberto, diz Banco Mundial

Estevão Taiar 

13/03/2018

 

 

O novo modelo de crescimento econômico do Brasil precisa ser baseado no aumento da produtividade. A boa notícia é que o país tem a oportunidade de realizar esse aumento sem grandes investimentos. Mas para isso precisará ampliar o comércio com outros países e promover uma série de outras mudanças. Essas são algumas das conclusões de economistas do Banco Mundial, que debateram ontem dois relatórios a respeito do tema divulgados pelo órgão na semana passada.

"Muitas pessoas sonham em voltar ao modelo do início dos anos 2000", disse o diretor do Banco Mundial para o Brasil, Martin Raiser. Segundo ele, o modelo adotado no começo do século conseguiu promover simultaneamente crescimento econômico e redução da pobreza. "Mas o mundo mudou", disse, lembrando da queda dos preços das commodities e, "ainda mais importante", do envelhecimento da população.

Nos cálculos do Banco Mundial, o crescimento da força de trabalho foi responsável por 2/3 do crescimento da economia brasileira no último ciclo de expansão da atividade. Mas daqui a cinco anos, justamente em função do envelhecimento da população, a diminuição da força de trabalho "vai retirar crescimento econômico" do país. Por isso, segundo Raiser, o Brasil precisa colocar a força de trabalho jovem e a produtividade "como indutores de ganhos econômicos e sociais".

"Sem aumentar a produtividade, a taxa de crescimento [do Produto Interno Bruto] pode se limitar a 1,3% em 2030", disse Mark Dutz, economista do órgão multilateral e autor do estudo "Crescimento e Emprego: a Agenda da Produtividade". Já um crescimento anual de 2,5% na produtividade, patamar semelhante aos das décadas de 60 e 70, poderia levar o Brasil a crescer até 4,5% ao ano.

O lado positivo é que há diversas frentes em que o país pode avançar, segundo ele. Um desses instrumentos seria a promoção de "políticas mais eficazes" entre empresas e "a inovação", além da implantação de políticas públicas destinadas à parcela mais pobre da população. Para isso, seria necessária uma avaliação mais precisa dos benefícios de todas essas políticas, "descontinuando" as consideradas ineficientes.

Outra vertente seria uma maior abertura comercial, que, como já divulgado pelo Banco Mundial, poderia tirar 6 milhões de pessoas da pobreza. Já um aumento da concorrência, por meio de um maior fluxo de comércio com outros países, teria o potencial de gerar 1,5 milhão de empregos, ao reduzir em até 10% os custos das empresas. Um brasileiro, segundo Dutz, precisa trabalhar mais de cinco vezes que um trabalhador canadense para comprar o mesmo carro.

Além disso, a "melhor integração doméstica", por meio por exemplo da "queda das tarifas de importação", entre outros fatores, teria potencial para que mais 3 milhões de brasileiros também deixassem de ser pobres. "É como se uma pessoa de Belém pagasse o mesmo preço por um produto que um morador de Belo Horizonte", disse.

Ele admite que "mudanças tecnológicas" e outros ciclos de abertura comercial realizados anteriormente tiveram efeitos negativos "muito concentrados" em determinados grupos. Mesmo assim, "o Brasil pode aprender com abordagens internacionais de sucesso período de transição", minimizando esses efeitos.

Para a economista Rita Almeida, autora do estudo "Competências e Empregos: a Agenda da Juventude", uma força jovem de trabalho capacitada será "o pilar do aumento da produtividade" que o país precisará em um futuro próximo. Mas para isso o Brasil deveria ter um foco maior em programas de inserção de jovens no mercado de trabalho.

De acordo com ela, o país acaba prestando atenção demasiada em programas passivos, como o seguro-desemprego e o FGTS, em vez de investir em programas ativos de inserção no mercado de trabalho. Além disso, passada a fase de maior acesso ao ensino nos níveis mais básicos, é necessário um salto de qualidade. "Muitas vezes jovens estão na escola e não estão aprendendo", disse. O Brasil, segundo Rita, é um país em que o aumento dos anos de escolaridade "não resulta em aumento da produtividade".

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Para relator, futura proposta de reforma da Previdência será 'mais dura' do que a atual

Juliana Schincariol

Bruno Villas Bôas

13/03/2018

 

 

Relator da reforma da Previdência, o deputado Arthur Maia (PPS-BA) disse ontem que a próxima proposta de mudança das regras da aposentadoria será mais dura do que a atual, cuja tramitação foi suspensa no Congresso Nacional com a intervenção federal do Rio de Janeiro.

"A reforma, a meu ver, será muito mais dura e mais profunda [do que o parecer atual]", afirmou Maia a jornalistas, após sua fala em evento organizado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro.

Para ele, o próximo presidente eleito vai ter capital político para adotar as medidas necessárias, diferentemente do atual governo, que enfrentaria limitações política por ter assumido após o impeachment e ter enfrentado duas denúncias.

"Não adianta, o governo não tem os 308 votos [necessários para aprovar a reforma]", disse Maia, que criticou deputados que sinalizam uma votação a favor da reforma, sem de fato cumpri-la por razões eleitorais, já que se trata de um assunto impopular.

Durante sua participação no evento da FGV, Maia disse que o texto original da reforma da Previdência, submetida ao Congresso no final de 2016, era "duro demais para ser aprovado" e acabou "demonizado" pela oposição. "O projeto tinha a meu ver algumas questões difíceis de defender, mesmo numa lógica de racionalidade da Previdência", disse o deputado.

Para ele, as mudanças realizadas no texto do projeto da reforma, de sua relatoria, tornaram o projeto mais popular. De acordo com o deputado, a rejeição inicial à reforma era de 95%, o que teria caído para 33% na última pesquisa de opinião. "Não adianta achar que aquilo que foi feito como ótimo vai ser aprovada daquele jeito. Câmara é multifacetada, com pensamento diversos", acredita o deputado.

O secretário de Previdência Social do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, buscou minimizar as críticas sobre problemas de comunicação da reforma da Previdência pelo governo. "Em qualquer lugar do mundo a comunicação da reforma da Previdência é fundamental. Foi assim na França, na Grécia. É melhor de forma democrática, prefiro que seja assim, com contraditório", disse o secretário.

Caetano lembrou que a aprovação da reforma ainda neste ano seria possível somente com a interrupção da intervenção no Rio, o que não estaria em discussão dentro governo. Apesar disso, ele afirmou que a reforma segue tema prioritário. O secretário de Previdência defendeu uma reforma "estrutural", com idade mínima de aposentadoria e a convergência de tratamento ao servidor público.

"A velocidade de aprovação da reforma vai depender o próximo presidente e do perfil do congresso que for eleito", conclui.

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Setor privado deve buscar oportunidades para investir em municípios, diz consultor

Luciano Máximo 

13/03/2018

 

 

O economista-chefe da GO Associados, Gesner Oliveira, disse que os municípios brasileiros têm ampla capacidade de executar projetos de infraestrutura e que o setor privado precisa se informar melhor sobre as oportunidades de investimentos mais exequíveis nas cidades espalhadas pelo Brasil, não só focar grandes chances oriundas da esfera federal, como Eletrobras ou Cedae.

Segundo Oliveira, há duas razões básicas para investidores darem mais atenção aos municípios. Por incumbências constitucionais ou legislativas, as prefeituras têm responsabilidades direta pela prestação de serviços de infraestrutura nas áreas de drenagem, resíduos sólidos, saneamento básico e iluminação pública. "O primeiro aspecto é muito simples: eles têm que enfrentar essas questões. O segundo é que estão aparecendo na prática muitas soluções interessantes de financiamento para encaminhar isso, com parcerias público-privadas diversas, concessões em diferentes segmentos", disse ao Valor o economista, após moderar o seminário "Como municípios têm enfrentado a crise fiscal", realizado ontem na Fundação Getulio Vargas (FGV/SP).

Oliveira acrescentou que, em constante contato com investidores e gestores de fundos de investimento, percebe um insistente interesse voltado apenas a grandes projetos federais. "Eles sempre perguntam da privatização da Cedae e da Eletrobras. Claro que são empreendimentos interessantes, mais cedo ou mais tarde vão sair, mas são complexos, têm muita resistência política. Enquanto isso há grande diversidade de projetos com menor resistência política, mais viáveis. Está faltando mais informação para [os investidores] pegarem coisas mais exequíveis. Teresina, por exemplo, tem cardápio de projetos com baixo risco político, ninguém vai parar no meio, tem estrutura de garantia desenhada. Falta mais informação", avaliou ele, aproveitando para destacar que projetos de infraestrutura em cidades de pequeno e médio porte têm potencial para desenvolver a produtividade e a atividade econômica regional.

Presente no seminário, a secretária municipal de concessões e parcerias de Teresina, Monique de Menezes, listou uma carteira com dez projetos em diferentes fases para várias áreas, de mobilidade urbana à eficiência energética. O mais adiantado deles é uma PPP de iluminação pública. "Esperamos lançar o edital em julho e assinar contrato até outubro." Segundo Monique, a expectativa é de receber R$ 500 milhões em investimentos. Edsom Ortega, secretário municipal de planejamento de Ribeirão Preto, contou que um dos focos da cidade é reduzir os atuais 14 contratos de concessão que regula o serviço de resíduos sólidos na cidade para uma única PPP com um viés metropolitano. "Esperamos modelar um só contrato para as 34 cidades da região metropolitana de Ribeirão Preto", disse.