Correio braziliense, n. 20439, 07/05/2019. Política, p. 3

 

Todas as apostas na PEC da Previdência

Rosana Hessel

07/05/2019

 

PODER » Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes se reúnem, mas não anunciam novidades, apenas reforçam declarações na defesa das alterações nas regras das aposentadorias

 

O governo está sentindo o baque da desaceleração da economia e do aumento do desemprego. Em meio a mais um dia turbulento, com a piora no cenário externo, o presidente Jair Bolsonaro foi visitar, ontem, o Ministério da Economia. Ele e o ministro Paulo Guedes desceram juntos, após o encontro que durou pouco mais de uma hora, mas não anunciaram novidades. Ambos tentaram focar as declarações na defesa da reforma da Previdência. “Não temos alternativa. A reforma da Previdência é o primeiro grande passo para conseguirmos aqui a nossa liberdade econômica”, disse o presidente a jornalistas, em frente ao Bloco P da Esplanada.

Guedes demonstrou otimismo com a recuperação da atividade a partir de julho, quando, prevê o ministro, a proposta de emenda à Constituição (PEC) será aprovada na Câmara dos Deputados. “A reforma da Previdência abre um horizonte de 10 a 15 anos de recuperação do crescimento. Na mesma hora, disparam as zonas de investimento interno, atraem também os investimentos externos”, ressaltou. “Vamos simplificar e reduzir os impostos, vamos fazer a descentralização de recursos para estados e municípios, e o Brasil, de julho em diante, já está crescendo de novo. Essa é a verdade a respeito do crescimento.”

De acordo com especialistas, no entanto, o impacto da reforma da Previdência não será imediato, nem na economia nem nas contas públicas. Segundo eles, o crescimento econômico neste ano continuará fraco em função da piora na confiança de investidores e consumidores no avanço da reforma, que depende de articulação do governo para fazer tramitar a PEC da Previdência no Congresso, com outros projetos prioritários, como o da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020. “Há um problema muito grave de comunicação dentro do governo. Ele está com dificuldade para se articular politicamente e de mostrar os números para a sociedade dos impactos da reforma previdenciária na economia de forma mais clara”, pontuou o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.

 

Sem instrumentos

O governo tem dificuldade para utilizar instrumentos para estimular a economia neste ano, porque não há espaço fiscal para investir devido aos rombos consecutivos desde 2014, explicam os analistas. “O estoque de medidas de curto prazo acabou, porque elas implicam piora fiscal, como queda de imposto e aumento de investimento. Não há mais espaço. Por isso, o governo está totalmente dependente da reforma da Previdência”, avaliou o economista-chefe da Rio Bravo, Evandro Buccini. Ele lembrou da parte criativa, como a liberação de contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), cujo impacto foi de 0,6% do PIB de 2017, que cresceu 1,1%. “Vai ser difícil achar uma política de curto prazo com resultado rápido e da magnitude do passado”, emendou.

Mas, para piorar, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, admitiu, ontem, que a máquina pública pode parar se o Congresso não autorizar um crédito suplementar de R$ 248 bilhões, capaz de cobrir a insuficiência de recursos para o cumprimento da regra de ouro neste ano. Caso contrário, o presidente sofreria processo de impeachment por crime de responsabilidade fiscal. Nessa conta, estão incluídos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e Bolsa Família. Neste mês, o governo precisa divulgar uma outra reprogramação orçamentária. Na do primeiro bimestre, foi preciso contingenciar R$ 30 bilhões.

Uma das cartadas de curto prazo estudadas pelo governo para tentar estimular a economia é liberar saques de contas inativas do Programa de Integração Social (PIS), voltado para trabalhadores do setor privado, e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), que atende servidores públicos. Essa medida foi utilizada no governo de Michel Temer . Cálculos da equipe econômica apontam para uma injeção de até R$ 10 bilhões.

 

Frase

“A reforma da Previdência abre um horizonte de 10 a 15 anos de recuperação do crescimento. Na mesma hora, disparam as zonas de investimento interno, atraem também os investimentos externos”

Paulo Guedes, ministro da Economia

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Pacto pela reforma

Bernardo Bittar                                                                                                                             

07/05/2019

 
 

Governadores das 27 unidades da Federação devem se reunir amanhã com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em Brasília. O grupo quer aproveitar a ocasião para analisar propostas em discussão no Legislativo antes de fechar o acordo do pacto federativo com o Senado, interessado em barganhar questões estaduais e municipais para ganhar apoio na reforma da Previdência. O presidente da Casa, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), defende um entendimento afirmando que haverá nova distribuição de recursos arrecadados entre os estados, municípios e a União.

Alcolumbre anunciou, no mês passado, a criação de grupos temáticos para estudar mudanças na legislação e estabelecer uma nova fórmula para direcionar recursos públicos federais para as unidades da Federação. Governadores tentam impedir que os estados e os municípios sejam retirados do texto da reforma da Previdência. Se isso acontecer, as regras implementadas na PEC nº 6/2019 serão válidas somente para os servidores federais, o que obrigaria as câmaras municipais e as assembleias legislativas estaduais a regulamentar seus próprios projetos, assumindo o ônus de tomar decisões impopulares.

Ontem, Alcolumbre se reuniu com Rodrigo Maia e com o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para discutir detalhes do pacto federativo.

A retirada dos servidores locais do âmbito da PEC afetaria, principalmente, professores e agentes de segurança pública, como guardas municipais. Se passar pela Comissão Especial da Reforma da Previdência, o tema será votado como emenda constitucional, precisando de 308 votos no plenário da Câmara e de 49 no do Senado.

Três projetos de lei complementar foram rascunhados pelo Congresso para dar mais recursos aos estados. “A ideia é obter apoio dos governadores para que eles mobilizem as bancadas estaduais, mas há um movimento por parte dos deputados para descolar as previdências municipais da federal”, diz um técnico do Senado. “O que o governo faz é garantir, com recursos entregues via Congresso, esse apoio que tem sido tão necessário para fazer com que a PEC da Previdência avance.”

Os projetos que compõem o pacto preveem a partilha de, ao menos, 20% da cessão onerosa do pré-sal, a divisão do fundo social das reservas para gastos com saúde e educação, e o chamado Plano Mansueto, que define novos critérios para os estados conseguirem financiamento. Há, no entanto, uma condição para que essas leis sejam aprovadas pelo Legislativo: o apoio à Previdência.

Um dos grandes problemas pode ser a falta de diálogo entre grupos políticos, já que a maioria dos governadores terá de tratar com parlamentares majoritariamente pertencentes a partidos aliados ao Planalto. A dificuldade pode atrasar o andamento das articulações, ainda que, na opinião do cientista político Carlos Alberto Moura, da HC7 Pesquisas, “exista um claro interesse dos governadores em ceder, porque a maioria dos estados está com as contas públicas atrasadas e, mais do que nunca, quem se elegeu disse que ‘mudaria tudo’”, analisa.

 

Frase

“Existe um claro interesse dos governadores em ceder, porque a maioria dos estados está com as contas públicas atrasadas e, mais do que nunca, quem se elegeu disse que ‘mudaria tudo’”

Carlos Alberto Moura, cientista político