O Estado de São Paulo, n. 45730, 31/12/2018. Política, p. A5

 

Embaixada do Brasil vai mudar, diz Netanyahu

Vinicius Neder

31/12/2018

 

 

O primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, afirmou ontem à comunidade judaica que o presidente eleito Jair Bolsonaro lhe garantiu na sexta-feira que a mudança da embaixada brasileira de Tel-Aviv para Jerusalém é questão de tempo.

Exigência de líderes evangélicos que apoiaram o então presidenciável do PSL e têm uma relação religiosa com o país do Oriente Médio, a troca foi promessa do então candidato ao Planalto e é polêmica. Países árabes, com os quais o Brasil teve superávit de US$ 6,2 bilhões em 2017, são contrários e já sinalizaram que poderão retaliar comercialmente. A intenção do novo presidente aproximou os dois líderes, mas nenhum anúncio público foi feito após as reuniões da sexta, no Rio.

“Ele (Bolsonaro) me disse que a transferência da embaixada não era uma questão de se (será feita), mas uma questão de quando (ocorrerá)”, afirmou Netanyahu, no encontro no Rio. Segundo o premiê, a conversa foi semelhante à que teve com Donald Trump, após a eleição do presidente americano, em 2016. Os EUA, onde o eleitorado judaico é expressivo, completaram a mudança de sua embaixada para Jerusalém – decisão, tomada em 1995, mas só adotada em maio de 2018.

A transferência da embaixada é um gesto de reconhecimento da cidade sagrada como capital do Estado de Israel, questão que divide árabes e israelenses no conflito no Oriente Médio, além da própria comunidade internacional. Os palestinos reivindicam a porção oriental da cidade como capital de seu futuro Estado, mas os israelenses a consideram indivisível. Pelo plano de partilha da Palestina, de 1947, a cidade deveria ter status internacional, mas Israel tomou a parte ocidental na guerra de 1948. Anexada pela Jordânia, a porção do Oriente de Jerusalém foi ocupada por Israel na Guerra dos Seis Dias, em 1967.

Além dos EUA, apenas a Guatemala reconheceu Jerusalém como capital de Israel. O Paraguai fizera o mesmo, mas recuou da sua decisão. Para algumas correntes evangélicas, a criação do Estado de Israel é um indício do fim dos tempos e de possível volta de Jesus Cristo à Terra, depois que os judeus O aceitarem como Messias. Nessa visão, a mudança da capital para Jerusalém seria fundamental.

Por isso, pastores de várias denominações neopentecostais apoiam Israel.

Lucros. Apesar dos dividendos políticos que o reconhecimento de Jerusalém traria aos israelenses, Netanyahu concentrou ontem uma apresentação a jornalistas brasileiros na possível cooperação econômica entre os dois países. O premiê traçou o panorama de uma economia global em mudança constante e descreveu Israel como uma “potência tecnológica”, com destaque para segurança cibernética, tecnologia da informação, agricultura de precisão e de reaproveitamento de água.

Netanyahu ressaltou que o Brasil é um dos maiores mercados do mundo. Para facilitar os contatos comerciais, disse que a diplomacia israelense está em contatos com o Chade, na África, para liberar a passagem de voos pelo espaço aéreo. A medida poderia encurtar em quatro horas o voo entre Tel-Aviv e São Paulo. Segundo o premiê, o mesmo foi feito com a Índia – a distensão na relação diplomática com a Arábia Saudita permitiu o uso do espaço aéreo no voo entre Tel-Aviv a Mumbai.

Segundo uma autoridade de alto escalão do governo israelense, apesar da ênfase no lado comercial da relação entre Brasil e Israel, os campos político e econômico são equivalentes na aproximação. Para Israel, não haveria uma relação “condicional” entre os dois campos.

Netanyahu não trabalha com a possibilidade de Bolsonaro voltar atrás na promessa sobre a embaixada, mas o interesse de ampliar exportações para o Brasil se mantém mesmo assim. Em 2017, o Brasil teve déficit de US$ 400 milhões em sua relação comercial com Israel. Para o premiê, a transferência não tornaria o País alvo potencial de ações terroristas. Ele lembrou não houve sequer um ataque após a mudança da embaixada americana.