O globo, n. 31251, 28/02/2019. Economia, p. 21

 

Entrevista - Rodrigo Maia: ‘Podemos dar fluxo de caixa aos estados’

Rodrigo Maia

Bruno Góes

Eduardo Bresciani

Paulo Celso Pereira

28/02/2019

 

 

Principal articulador da reforma da Previdência no Parlamento, deputado diz que chegou a hora de os governadores serem chamados para apoiar a aprovação do texto: ‘Eles precisam ser sócios’

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), defendeu que um pacote de ajuda financeira aos estados, permitindo antecipação de receitas, seja incluído nas negociações da reforma da Previdência. Seria uma contrapartida do apoio dos governadores à proposta encaminhada pelo governo. Ele reiterou que as alterações no Benefício de Prestação Continuada e na aposentadoria rural encontram dificuldades para serem aprovadas pela Casa.

Maia quer também debater, em breve, uma reforma administrativa que enfrente temas tabus, como a estabilidade dos funcionários públicos, mas pondera que a mudança deve valer apenas para novos servidores. E que seja associada a uma reestruturação das carreiras que aumente o tempo para os funcionários públicos atingirem o topo em suas áreas.

Os governadores têm pedido um projeto de ajuda aos estados. É possível?

Acho que dá para construir uma grande pactuação na votação da Previdência para que, dentro dela, a gente organize o sistema previdenciário próprio também dos estados, e que a gente possa construir com os governadores uma saída de fluxo de caixa. Vai ter que se chegar a um acordo entre partidos de direita e partidos de esquerda. Eles querem um fundo onde eles possam antecipar receitas futuras. Até 2022, tenho certeza que todo mundo está de acordo. Mas eles precisam ser sócios do Parlamento e do governo na aprovação da Previdência.

Pode ser uma proposta votada junto com a reforma?

O que for de emenda constitucional pode ser até dentro. O projeto está pronto. A crítica começou a ser feita. Está na hora de, depois do Carnaval, procurar os governadores e ver em que condições eles querem participar. E temos que discutir no Parlamento e no Executivo se as condições são possíveis de viabilizar ou não.

O senhor almoçou hoje (ontem) com Paulo Guedes. Passou a ele a preocupação dos deputados com a votação?

Tenho feito isso publicamente, para que todos tenham a informação correta e ninguém possa dizer que levou um susto se algo fora do planejamento acontecer. Os parlamentares ainda não conseguiram compreender nesse quebra-cabeça qual é o papel deles para que, depois, se possa pensar em projetos de investimento em todas as áreas. Às vezes, as pessoas ficam olhando cargo, orçamento, e não é isso. Tem uma coisa muito maior, como ‘Onde é que eu estou dentro desse projeto de país que o Bolsonaro começou a construir a partir de primeiro de janeiro?’.

O que passa na reforma?

O que gera insegurança são pontos muito claros: o Benefício de Prestação Continuada e a aposentadoria rural. E do servidor público há dois grandes debates que vão ser feitos: a não transição dos servidores que entraram antes de 2003 e as alíquotas progressivas. Acho que a alíquota progressiva tem apoio da sociedade. M ases sessão os quatro pontos que mobilizam mais.

Nos casos de BPC e aposentadoria rural, já há consenso de que não passa?

Tem que discutir se o impacto fiscal dessas medidas compensa a contaminação da reforma. Do ponto de vista político, é um grande risco, sem dúvida nenhuma. Do BPC eu tenho quase certeza de que o impacto é pequeno porque o Leonardo Rolim já disse. Agora, a aposentadoria rural tem que pegar os números.

O senhor acha que o regime de capitalização será aprovado?

A capitalização é um sistema que não tem desequilíbrio, há um futuro melhor para as próximas gerações. Há alguns economistas que dizem que esse sistema não pode ser um sistema de capitalização puro, porque alguns não conseguirão nunca ter uma renda mínima. Mas essa é uma equação que a gente vai ter que discutir, os técnicos vão ter que nos apresentar formulações.

O governo já respondeu quando chega o projeto dos militares?

Vai chegar nos próximos dias, depois do Carnaval.

Não se discute nada antes de chegar?

Isso os líderes já avisaram. É um dado da realidade.

O ministro Paulo Guedes está tendo um choque de realidade?

O ministro nunca tinha tido a oportunidade no setor público, que tem regras diferentes do setor privado. Se você é dono de uma empresa, você implementa um projeto no tempo que você quiser. Para ganhar ou perder. Ele tem uma agenda liberal, eu tenho uma agenda liberal, mas você não tem 308 deputados que chegaram ao parlamento com uma agenda liberal.

Há inexperiência do governo em lidar com o parlamento?

O Brasil viveu uma mudança de ciclo, precisamos perceber que a sociedade mandou um recado muito claro. Tudo que representa um momento novo é um aprendizado para todos. O presidente ganhou a eleição com uma narrativa. Ele não pode da noite para o dia dizer que aquela narrativa estava errada. Ele está imobilizado nesta narrativa. E não está errado de estar assim. Ele precisa fazer a narrativa virar realidade, compreendendo que todos os 513 deputados também estão legitimados pelo voto como ele está. E que o governo, para fazer grande reformas, precisa governar com o parlamento.

É possível pautar a desvinculação total do Orçamento como quer o ministro Paulo Guedes?

Não estou defendendo a proposta dele porque não está no papel. Mas a ideia de mudar o pacto federativo e inverter a pirâmide, ter um orçamento com mais liberdade, não sei se para a União, mas talvez para estados e municípios, é um debate que fortalece o parlamento.

O senhor pretende apresentar o projeto de reforma do serviço público?

Acho que cabe ao Executivo apresentar, pois tem mais servidores. Mas temos que debater. Servidor público, no meu ponto de vista, não tem que ter gratificação. Ele precisa ter carreira. Mas hoje nas carreiras mais importantes do Estado brasileiro, após cinco a oito anos, quase todos os servidores já estão no teto. Aí, o que os estimula são as gratificações. O objetivo de um servidor público nunca pode ser ganhar acima do teto. No Exército, qual é o grande estímulo para um soldado? É chegar a ser general de quatro estrelas. O Itamaraty ainda tem um pouco disso. Mas, fora eles, não tem.

É uma discussão mais difícil do que a Previdência?

Eu não acho, porque eu sempre trato daqui pra frente, para construir um estado menos custoso para a sociedade e mais eficiente.

Executivos da OAS acusam o senhor de ter recebido caixa dois. Recebeu?

Não recebi. Mas a vida do homem público é assim, nunca pode ficar incomodado quando algum delator, para se salvar, tenta usar a nossa reputação. Cabe a cada um de nós fazer a sua defesa e trabalhar para mostrar à sociedade e à Justiça que a informação não é verdadeira.

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Onyx diz que economia de R$ 1 tri é ‘inegociável’.

Leo Branco

Eliane Oliveira

28/02/2019

 

 

Ministro da Casa Civil considera possível acabar com déficit fiscal em 2 anos se reforma da Previdência passar sem mudanças

O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou ontem, em evento em São Paulo, que é “inegociável” a meta de economia de R$ 1 trilhão em dez anos com a reforma da Previdência. Mais tarde, a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), repetiu essa afirmação em Brasília.

Onyx afirmou ainda que é possível haver “uma solução” para o déficit fiscal do governo em um prazo de até dois anos se a reforma da Previdência for aprovada da maneira como chegou ao Congresso. E acrescentou que, se não houver mudanças no texto, a economia pode chegar a R$ 4 trilhões em 20 anos.

Essa projeção supera a do ministro da Economia, Paulo Guedes, que na campanha eleitoral do ano passado chegou a afirmar que resolveria o rombo nas contas públicas, hoje em 7% do PIB, em 12 meses.

— Acredito na aprovação da reforma da Previdência nas duas Casas do Congresso até junho — afirmou Onyx, na 20º CEO Conference Brasil 2019, promovida pelo banco BTG Pactual na capital paulista.

Ele mostrou otimismo com a chance de o projeto avançar tal como foi elaborado pela equipe econômica do ministro da Economia, Paulo Guedes. Onyx confia na capacidade de articulação política do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e lembrou que o presidente Jair Bolsonaro quer imprimir um viés liberal ao governo.

— Querem comparar o Bolsonaro ao Trump. Mas para mim a comparação correta é com o Ronald Reagan —disse Onyx, referindo-se ao presidente que comandou os EUA entre 1981 e 1989, promovendo uma agenda econômica liberal.

Em Brasília, a deputada Joice Hasselmann, após um almoço com Guedes, Alcolumbre e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu que alguns itens da proposta da reforma da Previdência poderão ser modificados no Legislativo. Mas repetiu o discurso de Onyx:

— O governo não está fechado para discutir com os parlamentares, mas o ponto inegociável é o tamanho da economia, de R$ 1 trilhão.

Segundo a deputada, Guedes está aberto a discutir os pontos de conflito:

— O ministro disse que vai ouvir, construir, mas a gente não pode desfigurar a espinha dorsal da Previdência — afirmou, sem entrar em detalhes.