O globo, n. 31139, 08/11/2018. País, p. 8

 

Moro pede a Congresso que aprove repasse de loterias à segurança

Jailton Carvalho

08/11/2018

 

 

Futuro ministro diz contar com recursos para implementar propostas. Jungmann alertou sobre superlotação em presídios

O juiz federal Sergio Moro, indicado para ocupar o Ministério da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, fez um apelo para que o Congresso Nacional aprove a medida provisória que prevê a destinação de parte dos recursos das loterias federais, entre elas a MegaSena, para o a segurança pública. Horas depois do pedido de Moro, à noite, uma comissão mista do Congresso aprovou a MP das Loterias.

A medida ainda precisa ser votada nos plenários da Câmara e do Senado, antes de seguir para sanção presidencial. Isso precisa ser feito até o dia 28 deste mês, data em que a MP perde validade.

Moro pediu o apoio de deputados e senadores numa entrevista coletiva, depois de se reunir com o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann.

— É muito importante que seja aprovada. Acredito que o Congresso tenha essa sensibilidade de aprovar essa medida provisória e consolidar essa posição para que nós possamos seguir assim adiante — disse Moro, acrescentando que, sem os novos recursos, suas propostas para o ministério podem ficar prejudicadas.

A medida provisória, enviada pelo governo Michel Temer ao Congresso em julho, prevê a destinação de 13% da arrecadação das loterias federais para a área de segurança pública. Segundo cálculos do governo, este percentual garantirá pelo menos R$ 1 bilhão anual para a Segurança.

O futuro ministro se reuniu com Jungmann por quase três horas. Durante o encontro, Jungmann apresentou documentos e fez uma explanação sobre a situação geral da área. O diretor-geral da Polícia Federal, Rogério Galloro, e outros dirigentes do ministério fizeram curtas análises sobre as condições em que se encontram cada um dos setores.

Os relatos mais preocupantes teriam sido sobre a situação dos presídios. O sistema penitenciário está abarrotado com mais de 720 mil presos e sofre com um déficit de aproximadamente 350 mil vagas.

A pressão é maior ainda porque existem pelo menos 500 mil mandados de prisão em aberto. O cumprimento dessas ordens de prisão poderia aumentar ainda mais a sobrecarga sobre o sistema. Para especialistas na área, a questão dos presídios é essencial para resolver os entraves da segurança pública.

Moro e Jungmann também conversaram sobre sistemas de segurança nos presídios federais e estaduais. Moro teria concordado que é necessário ampliar o rigor na fiscalização de contatos entre advogados e presos.

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Propostas devem ter boa acolhida na Câmara

Elisa Martins

08/11/2018

 

 

Especialistas preveem aprovação de ideias de Moro, mas alertam para possível inconstitucionalidade sobre Tribunal do Júri

O pacote de propostas exposto pelo juiz Sergio Moro em sua entrevista coletiva como futuro ministro da Justiça e Segurança Pública mostra uma estratégia de endurecimento do combate ao crime organizado, o que deve facilitar a aprovação das medidas que dependem do aval do Congresso. Esta é a avaliação de especialistas ouvidos pelo GLOBO. Eles alertam, no entanto, que pelo menos uma das ideias pode esbarrar em entraves legais: aquela que prevê a execução imediata da pena em condenações pelo Tribunal do Júri, no casos de homicídio, antes mesmo da apreciação dos primeiros recursos.

Moro defendeu também outras ideias, como o fim da progressão de pena para condenados por integrar crime organizado e regulamentar a infiltração de policiais no crime durante investigações. A avaliação é de que o futuro Congresso, alinhado à pauta de Segurança priorizada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro, deve ser receptivo à maioria das propostas. A relativa ao Tribunal do Júri, porém, pode provocar debates nos tribunais.

—Moro conseguiria passar um projeto de lei, que mudaria o Código Penal do país, mas esbarrando em um princípio constitucional de não culpabilidade. Seria um retrocesso civilizatório. Sem contar que a preferência parece ser por mudar a lei, e não consertar a morosidade da Justiça. É uma medida “bolsonariana” — opina o jurista Walter Maierovitch.

Por outro lado, Luis Flávio Sapori, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública da PUC de Minas Gerais, defende a medida.

— É preciso ser mais severo na punição. A proposta de mudança na execução de penas do Tribunal do Júri e também na progressão de pena são mudanças legislativas que vão endurecer o enfrentamento ao homicídio. A lei penal brasileira é hoje muito branda. Projetos nesse sentido devem ser aprovados sem dificuldade, considerando o atual perfil do Congresso —diz.

Inspiração em Falcone

O sociólogo e ex-secretário adjunto de Segurança Pública do Estado de Minas reconhece, no entanto, que a medida pode esbarrar em um debate constitucional:

— Talvez a mais difícil de mudar e que suscite maior questão de inconstitucionalidade seja essa do Tribunal do Júri. Para que seja aprovada pode ser necessária uma mudança no artigo 5º da Constituição, que define a culpa através da sentença do transitado em julgado.

O especialista elogia, ainda, o uso de “forças-tarefas” como método de combate ao crime organizado.

— Há décadas, especialistas chamam a atenção para o fato de que confronto armado com o tráfico não funciona e não produz resultado. Montar um grupo de elite destinado a investigar e fazer um trabalho de inteligência contra organizações criminosas é mais importante do que mudar lei.

Walter Maierovitch é presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone, o magistrado italiano que liderou o combate à máfia nos anos 1980 e em quem Moro diz se espelhar. Ele elogia a ideia da força-tarefa, mas pede que o futuro ministro dê mais ênfase ao ataque à economia das organizações criminosas.

— Falcone dizia que não existe nem uma loja de armarinho que vá adiante sem ter lucro. Então, operações com força policial e militar não devem ser a primeira prioridade, e sim levar as organizações à falência, para que não possam comprar armas, munições etc, e atacar a economia que a movimenta.

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Após novo recuo, CGU deve ficar como ministério

Mateus Coutinho

08/11/2018

 

 

Presidente eleito admite rever ideia de levar órgão para a pasta da Justiça, que será chefiada por Moro

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, admitiu ontem que o Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) pode não ser absorvido pelo Ministério da Justiça em seu governo, como foi cogitado inicialmente por sua própria equipe. Se confirmada, a nova mudança pode elevar o número de ministérios do futuro governo a um total de 18.

—Isso já está sendo (avaliado), já demos um passo e talvez seja mantido o status de ministério (da CGU). Mas não é pela governabilidade, é para que a gente possa apresentar realmente resultado. Talvez tenhamos que manter a Controladoria com status de ministério — afirmou Bolsonaro.

Questionado sobre qual seria o nome da futura pasta, ele disse que “tanto faz”.

— Isso aí eu não sei. Pode me chamar de Jair ou de Messias, tanto faz.

A CGU seria um dos órgãos a serem incorporados ao Ministério da Justiça no processo de fortalecimento da pasta que estará sob o comando de Sergio Moro. Há a previsão da incorporação do Ministério da Segurança Pública e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), atualmente vinculado ao Ministério da Fazenda. Sobre o Coaf, Bolsonaro explicou que a ideia é que órgão auxilie no combate ao crime organizado, tema que deve ser uma das prioridades da gestão de Moro :

— Um braço do Coaf tem que estar dentro da Justiça para ele (Moro) ter em tempo real informações do que está acontecendo, porque sem seguir o dinheiro não tem como combater o crime organizado —afirmou.

A CGU tem, dentre suas funções, a prerrogativa de auditar todas as outras pastas do governo federal.

Inicialmente, a equipe de Bolsonaro havia anunciado que o número de ministérios seria reduzido para até 15. Depois, contudo, foi dito que poderia ficar entre 16 e 17. Ontem, Bolsonaro reconheceu que pode chegar a 18.