O globo, n. 31103, 03/10/2018. País, p. 4

 

No campo do rival

Marco Grillo

Jussara Soares

03/10/2018

 

 

Bolsonaro melhora desempenho em tradicionais redutos lulistas

O crescimento do candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, registrado nas pesquisas de intenção de voto recentes, foi amparado também pelo avanço em segmentos do eleitorado tradicionalmente fiel ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em um primeiro momento da campanha, o petista Fernando Haddad se distanciou do bloco intermediário e se aproximou do adversário justamente em função do apoio nos redutos lulistas. Agora, em uma outra fase da eleição, a dificuldade do ex-prefeito de São Paulo de crescer em ritmo mais acelerado nestes estratos e o aumento da identificação destes setores com o capitão da reserva ajudam a explicar, respectivamente, a estagnação de Haddad e a elevação de patamar de Bolsonaro. Além disso, o candidato do PSL também cresceu entre as mulheres, segmento em que tem rejeição acima de sua média.

Entre os eleitores mais pobres — aqueles com renda familiar mensal de até um salário mínimo —, a vantagem continua com o petista, mas foi reduzida na comparação entre as duas pesquisas Ibope mais recentes. Na quarta-feira da semana passada,Hadd ad tinha 28% dentro deste recorte, contra 13% de Bolsonaro, o que representava uma diferença de 15 pontos percentuais. No levantamento do início da semana, o domínio petista caiu pela metade: Haddad oscilou dois pontos negativamente e marcou 26%, enquanto Bolsonaro subiu seis pontos e chegou a 19%. A faixa mais pobre do eleitorado é bastante relevante do ponto de vista eleitoral: cerca de 40% dos eleitores ganham até dois salários mínimos por mês.

No Nordeste, outro tradicional reduto do lulismo —e onde estão 26% dos eleitores —, Bolsonaro também, pela primeira vez desde o início da campanha, teve um crescimento expressivo. O candidato do PSL saiu de 15% para 21% das intenções de voto na região, um aumento de seis pontos percentuais. Haddad segue líder, com 35% (cresceu cinco pontos na comparação coma pesquisam ais recente ), mas em um patamar no qual ela já havia transitado (registrou 34% em 24 de setembro).

— O Bolsonaro cresceu dentro de segmentos do eleitorado que não são aqueles tradicionalmente mais identificados com ele, como as mulheres, os eleitores do Nordeste e os com renda mais baixa —diz a diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari.

No eleitorado feminino, que representa 52,5% do total, o candidato do PSL cresceu seis pontos e passou de 18% para 24%. Bolsonaro ultrapassou Haddad numericamente, embora a situação seja de empate técnico no limite da margem de erro, já que o petista tem 20% de preferência entre as mulheres.

Para aliados do presidenciável do PS L, os números, especialmente no eleitorado feminino,revelaram que deu certo a estratégia de não rebater diretamente o movimento #EleNão e concentrar esforços nas redes sociais contra o PT. Em vez de responder diretamente à ofensiva liderada por mulheres, a coordenação do PSL apostou na hashtag #PTNão para trazer votos antipetistas para Bolsonaro.

Na semana passada, dezenas de vídeos críticos ao PT começaram a ser disparados para militantes que controlam centenas de grupos de WhatsApp e, em seguida, foram compartilhados em outras redes sociais. O material começa coma mensagem #PTNão e explora denúncias de corrupção contra Lula. Um dos vídeos reutiliza o depoimento da enfermeira Miriam Cordeiro, ex-namorada de Lula, que, durante a campanha de 1989, foi a público dizer que o então candidato do PT “detestava negro” e teria oferecido dinheiro para que ela fizesse um aborto.

Os números do Ibope e do Datafolha — esta pesquisa foi divulgada ontem e também registrou o aumento global de Bolsonaro, que cresceu quatro pontos e chegou a 32%— sugerem que o movimento #Elenão pode ter surtido um efeito contrário. Para Jairo Pimentel, pesquisador da Fundação Getulio Vargas, as manifestações tiveram alcance limitado.

—É um público que está fazendo barulho, mas não é representativo da maioria do eleitorado. O Bolsonaro cresceu mais entre mulheres pobres do Nordeste, que se importam em melhorar suas condições econômicas. Entre elas a questão material se sobrepõe à questão moral.

O candidato do PDT, Ciro Gomes, afirmou que os atos foram um “grosseiro equívoco”, porque deram protagonismo a Bolsonaro. O pedetista, no entanto, havia defendido as manifestações femininas. “Acho que ele (Bolsonaro) foi derrotado pelo que há de mais sadio na sociedade brasileira. Graças a Deus e ao valor da mulher brasileira”, disse. (Colaborou Catarina Alencastro)

“O Bolsonaro cresceu dentro de segmentos do eleitorado que não são aqueles mais identificados com ele, como as mulheres, os eleitores do Nordeste e os com renda mais baixa”

Márcia Cavallari, diretora executiva do Ibope

“Esse (#Elenão) é um grosseiro equívoco. Está convidando o país para bailar na beira do abismo”

Ciro Gomes

Candidato do PDT à Presidência

____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Eleitoras aderem a ex-capitão para tentar deter o PT

Cleide Carvalho

Tiago Aguiar

03/10/2018

 

 

Para especialistas, manifestações contra Bolsonaro no sábado ficaram restritas à esquerda e aguçaram o antipetismo

O sentimento antipetista foi o que levou a engenheira Marina Guimarães, de 33 anos, que mora em Belo Horizonte, a decidir pelo candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro. Marina diz que originalmente votaria em João Amoêdo (Novo), mas decidiu antecipar sua decisão e escolher Bolsonaro já no primeiro turno.

— Quero tirar o PT. E acho que Bolsonaro é a única opção —diz Marina.

Já a consultora de investimentos Viviane Dias, de 22 anos, diz que também optou pelo voto útil no capitão reformado do Exército.

— Além disso, acho o Bolsonaro super pró-mercado e, para minha profissão, ajuda bastante —avalia Viviane Dias.

A limitação dos discursos que tomaram as ruas no último sábado a questões de gênero e o clima anti-PT propagado por algumas das principais campanhas estão entre os elementos que ajudam a explicar o aumento das intenções de voto feminino em Bolsonaro, afirmam analistas políticos.

— As manifestações das mulheres do último sábado foram para as convertidas, para as pessoas que priorizam o combate ao sexismo. Foi um movimento de inconformismo, mas não de convencimento em relação a outras mulheres, que têm outras prioridades no dia a dia —diz Adriano Codato, professor da Universidade Federal do Paraná.

Para o cientista político Carlos Mello, professor do Insper, a manifestação contra Bolsonaro foi uma reação de mulheres majoritariamente de esquerda e de faixa de renda relativamente alta.

—Foi um movimento restrito a um grupo —avalia o especialista, acrescentando, porém, que o avanço de Bolsonaro nas pesquisas é, principalmente, uma reação do antipetismo. —E além do voto do antipetismo, há o dos conservadores, dos que de fato querem a volta dos militares e dos que defendem um liberalismo radical.

Na avaliação da cientista política Andrea Freitas, professora da Unicamp, o ato das mulheres contra Bolsonaro no sábado acabou justamente por animar os que rejeitam o PT, inclusive as mulheres, a votarem no candidato do PSL.

—Muita gente pensou: se ele (Bolsonaro) está sofrendo ataques, talvez represente mesmo a mudança —diz a professora. —O ato levou os antipetistas a se posicionarem fortemente. Foi como se pensassem “eles (o PT) estão se movimentando”.