O globo, n. 31131, 31/10/2018. Rio, p. 15

 

As armas de Witzel para a segurança

Lucas Altino

Luiz Ernesto Magalhães

31/10/2018

 

 

Governador eleito diz que ‘snipers’ vão abater traficantes com fuzis

O governador eleito do Rio, Wilson Witzel, subiu ontem o tom de seu discurso para a segurança pública, tema que marcou toda a sua campanha. Ele anunciou que mobilizarás nipers—a tiradores de elite — para operações em favelas, e disse que esses policiais serão orientados a “abater” traficantes com fuzis, mesmo que os criminosos estejam de costas ou fora de situações de combate que ofereçam risco à tropa. Questionado sobre a possibilidade de agentes serem acusados de homicídio em decorrência do ato, Witzel respondeu que o estado os defenderá nos tribunais. As declarações foram criticadas por especialistas em segurança e repudiadas pela Anistia Internacional.

Witzel disse que integrantes da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil e do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM são treinados para atirar com precisão. Ao comentar imagens, gravadas ontem pela Rede Globo, de bandidos armados na Cidade de Deus, em Jacarepaguá, ele observou que, nesse tipo de caso, a resposta deve ser dura, com snipers posicionados inclusive em helicópteros.

— Se tem cinco elementos atirando contra o policial, todos, em algum momento, podem e devem ser abatidos — afirmou Witzel durante uma entrevista ao canal de TV Globonews.

Em seguida, o governador eleito foi questionado se o “abate” deve ser feito mesmo se o criminoso estiver de costas. E Witzel respondeu:

— Fuzil na mão? É ameaça. Ele (o bandido) vai usar o fuzil para atacar quem quer que esteja na frente dele.

Witzel deu as declarações no mesmo mês em que a Secretaria de Segurança adotou, por ordem da Justiça, um proto coloque impede policiais dedarem rajadas de tiros abordo de helicópteros.

Apoio em Tribunais

Frisando ter uma vasta experiência em tribunais do júri, Witzel, que era juiz federal antes de se candidatar a governador, disse que vai apoiar policiais em eventuais ações judiciais por suposto crime durante o exercício de suas funções.

— Fiz mais de uma centena de tribunais do júri. Ale ié feita para ser interpretada. Nós interpretamos a lei. Eu digo sempre: prefiro defender o policial no tribunal doqueira o funeral dele ou de quem quer que seja. Tribunal do júri é aquilo: o povo julgando o povo—observou, reconhecendo, no entanto, que não pode garantira absolvição do policial.

O governador eleito, que quer manter as Forças Armadas no Rio por mais 10 meses após o fim da intervenção federal, adiantou ainda que vai investir no rastreamento da lavagem de dinheiro e no aumento do efetivo do Bope. Além disso, ele foi questionado sobre a iniciativa dos deputado eleitos Ricardo Amorim e Daniel Silveira, ambos do PS L, de rasgarem uma placa em homenagem a Marielle Franco, vereadora do P SOL assassinada em março deste ano. Aplaca foi exibida pelos dois durante um comício do qual Witzel participava. O governador eleito disse não apoiara iniciativa e argumentou que não foi e leque rasgou aplaca.

Especialistas ouvidos pelo GLOBO destacaram que os planos de Witzel para o combate ao crime não têm amparo jurídico e não são recomendados sob o ponto de vista operacional. Professor de Direito Constitucional da Fundação Getulio Vargas, Leonardo Vizeu explicou que o abate de uma pessoa com fuzil só seria possível numa situação de guerra, com declaração de estado de defesa ou de sítio.

—Precisaríamos estar num estado de exceção, com autorização constitucional para supressão de direitos fundamentais — observou Vizeu, que vê poucas possibilidades de a medida ser implementada. — Sem regras de engajamento adequado e segurança jurídica, o policial vai ter que responder criminalmente se o laudo pericial confirmar que houve execução.

Para Jacqueline Muniz, professora do Departamento de Segurança Pública da UFF, o protocolo proposto por Witzel colocará a vida do policial em risco.

— E não há base legal, polícia não pode atirar primeiro e perguntar depois. Ele precisa combinar com Ministério Público, com a Justiça. Isso aumentaria o contingente de policiais presos. Está na hora de o governador eleito apresentar uma proposta concreta, que não seja baratear a vida do policial.

Pesquisador do Laboratório de Análise da Violência da Uerj, Ignacio Cano explicou que a polícia já faz uso excessivo da força e criticou a possibilidade de partipação de snipers em operações dentro de favelas “por dificuldades topográficas”:

—Sniper se usa, por exemplo, em caso de refém, quando há domínio do terreno. Na favela, vai fazer como?

A Anistia Internacional afirmou que a medida de “abater criminosos com fuzis” afronta a legislação brasileira e internacional.

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Promessa de cancelar plano de saúde da família é mantida

31/10/2018

 

 

Vencedor da eleição diz que, a partir de janeiro, ele e parentes recorrerão ao Hospital Estadual Pedro Ernesto em caso de doença

O governador eleito Wilson Witzel reiterou ontem, na entrevista para a Globonews, uma promessa que havia feito em um dos debates da campanha eleitoral: ele pretende cancelar o plano de saúde de sua família. A partir de 1º de janeiro, Witzel, a mulher e os três filhos que vivem em sua companhia no Grajaú passarão a ser atendidos no Hospital Universitário Pedro Ernesto (Vila Isabel), que pertence ao estado. Witzel informou, inclusive, a data em que pretende cancelar o plano: 31 de dezembro, na véspera de assumir o mandato de governador.

Sobre uma outra promessa, a de que os filhos passariam a estudar em escola pública, Witzel disse que, na verdade, se referia aos colégios mantidos pelo governo do estado. Como, na capital, o ensino fundamental é de responsabilidade da prefeitura, essa promessa só poderá ser cumprida quando os filhos menores de idade forem para o ensino médio.

— No caso do mais velho, ele só deve chegar ao ensino médio em dois anos. A promessa não foi para as escolas do ensino fundamental, porque elas são mantidas pela prefeitura — argumentou o governador eleito.

Witzel, no entanto, não respondeu a uma pergunta feita pelos participantes do programa “Estúdio I”: se ele confia na qualidade das escolas públicas mantidas pelo prefeito Marcelo Crivella. As matrículas no município começam em novembro.,

No programa, o futuro governador também falou sobre negociações para tentar obter o apoio da maioria dos 70 deputados da Assembleia Legislativa em projetos de interesse do estado. Ele disse que, em hipótese alguma, trocará apoio por indicações políticas para cargos técnicos do governo, nem mesmo se isso terminar levando a uma crise que afunde o Rio:

— Não haverá acordos envolvendo cargos para aprovar projetos. Zero. Só teremos gente técnica, capacitada. Se tiver dificuldade, eu venho à Globonews e digo que os deputados A, B, C e D não querem votar determinado projeto. E eles que respondam pelos seus atos nas eleições. Se afundar, afundamos todos.

Em tese, a base de Witzel na Assembleia conta hoje com apenas 15 deputados. Seu partido, o PSC, ocupa apenas duas cadeiras, as de Márcio Pacheco e Chiquinho da Mangueira. Witzel também deverá ter o apoio do PSL, partido do presidente eleito Jair Bolsonaro, que garantiu 13. Na campanha, a maioria dos deputados eleitos pelo PSL apoiou Witzel contra o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (Dem) no segundo turno.