O globo, n. 30971, 24/05/2018. Economia, p. 18

 

Greve causa desabastecimento e alta no preço de vários alimentos

Marcela Sorossini
Letycia Cardoso
Bruno Rosa
Glauce Cavalcanti
24/05/2018
 
 

Na Ceasa-RJ, faltam produtos, devido à redução do número de caminhões

A greve dos caminhoneiros provocou desabastecimento em todas as regiões do país. Com bloqueios e mobilização no acostamento das estradas pelo terceiro dia consecutivo em 22 estados e no Distrito Federal. O principal impacto podia ser visto nas prateleiras de supermercados. Houve falta principalmente de frutas, legumes e hortaliças. Com isso, alguns preços dispararam.

No Rio, os reflexos dos protestos começaram cedo ontem na Ceasa-RJ, em Irajá, na Zona Norte. Apenas 75 dos 340 caminhões que deveriam fazer entregas ontem conseguiram chegar ao mercadão. A saca com 50 quilos de batatas, que costuma ser vendida por R$ 70 ou R$ 80, era comercializada ontem por quase quatro vezes mais: entre R$ 250 e R$ 300. Resultado: o quilo da batata subiu de R$ 2 para R$ 6 ontem, em uma feira livre em Botafogo, na Zona Sul.

Alguns itens, como a cenoura, sumiram da Ceasa. Restavam poucas sacas de chuchu e pimentão, que dobraram de preço. Se antes o lote de 20 quilos de chuchu saía por R$ 15 nos boxes, hoje custa de R$ 30 a R$ 40. O pimentão, que na semana passada era encontrado por R$ 15, foi vendido por R$ 25 na terça-feira e ontem já custava R$ 50.

No box Guaibim, apenas um caminhão conseguiu chegar. O normal, segundo os vendedores, é receber cinco ou seis cargas diariamente. Para evitar os bloqueios de caminhoneiros em protesto nas principais vias de acesso à capital, o motorista fez um desvio por Angra dos Reis.

— Não chega nada. Está todo mundo reclamando — disse o dono do box, Marcel Ribeiro Barbosa. — O problema vai continuar, porque muitas mercadorias vão apodrecer nas estradas.

Cenário parecido podia ser visto ontem na Ceagesp, principal ponto de distribuição de alimentos em São Paulo. O problema logo chegou aos grandes supermercados.

PROBLEMAS EM DEZ ESTADOS

A Abras, associação nacional do setor, recebeu notificações relatando desabastecimento em supermercados de dez estados do país: Rio, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Minas, Ceará, Tocantins, Santa Catarina e São Paulo. A entidade destacou em comunicado que o problema “poderá se estender para todo o Brasil nos próximos dias, se algo não for feito.”

Na indústria de alimentos, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, suspendeu as atividades em quatro unidades de abate de frangos e suínos ontem, sem poder receber insumos e escoar a produção no Sul e Centro-Oeste. Outras processadoras de carne como JBS e Marfrig também informaram ter reduzidoam a produção por causa da greve.

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Filas em postos de gasolina testam paciência

Ramona Ordoñez

Paulo Nicolella

Glauce Cavalcanti

24/05/2018

 

 

Distribuição limitada não dá conta do aumento da demanda

Os bloqueios em estradas e até na porta de refinarias dificultaram a distribuição de combustíveis em todo o país. O problema foi agravado pelo súbito aumento da demanda. Com o risco de faltar gasolina, postos de gasolina registraram filas em várias regiões do país. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) flexibilizou a exigência de acréscimo de 10% do biodiesel no diesel, já que os bloqueios atrasam a distribuição do biocombustível.

No Rio, vários postos ficaram ontem sem gasolina, diesel ou etanol, já que os caminhões com o combustível não chegaram aos pontos de distribuição. O Sindicomb Rio, sindicato do setor, avalia que nunca houve um desabastecimento tão grande nos postos da capital, embora esta não seja a primeira greve de caminhoneiros.

Com as filas, houve quem perdesse a paciência. Num posto da Barra da Tijuca, a contadora Ana Cláudia Pimentel enfrentou ontem quase uma hora de fila para abastecer seu carro em um posto de gasolina. A demora foi agravada por dois homens em uma caminhonete, que pretendiam encher mais de 20 vasilhames de gasolina, alegando precisar do combustível para embarcações. Ela reclamou:

— Fiquei indignada. Havia uma longa fila de pessoas aguardando. Os funcionários do posto diziam que a venda não pode ser negada. Mas quem garante que aquela gasolina não seria, depois, revendida por um preço mais caro? Fiz com que parassem de encher os vasilhames, depois de intervir e de ter chamado a polícia — contou Ana Cláudia.

BLOQUEIO NAS DISTRIBUIDORAS

Segundo Paulo Miranda, presidente da Fecombustíveis, que reúne os postos revendedores, os problemas na entrega de combustível se agravaram ontem em razão do bloqueio nas bases das distribuidoras. Em Goiás, houve o bloqueio da principal distribuidora do estado por cerca de 34 horas.

— Desde segunda-feira, os postos estão sem receber regularmente o produto. O que agrava a situação é que as pessoas estão procurando — disse Miranda.

Segundo o SindEstado, que representa a revenda de combustíveis no Rio de Janeiro, falta combustível em postos de várias regiões do estado. Os postos trabalham com dois a três dias de estoque e estão sem receber carga desde segunda. No Norte Fluminense, mais da metade dos postos estão desabastecidos.

A falta de combustível afetou parte dos ônibus de Rio, Recife, São Paulo e outras capitais.

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Correios interrompem serviços de entrega rápida

Madson Gama

Paulo Henrique Gomes

24/05/2018

 

 

A paralisação dos caminhoneiros está atrasando entregas dos Correios em todo o país. A empresa suspendeu temporariamente encomendas com dia e hora marcados (Sedex 10, 12 e Hoje). Além disso, serviços como Sedex e PAC terão prazo de entrega maior, assim como a correspondência comum. Os novos prazos valem enquanto durar a greve.

Segundo os Correios, 25 milhões de encomendas são entregues em todo o país diariamente. Para isso, são utilizados 25 mil veículos, entre caminhões e aviões. A empresa afirmou que reforçará as operações quando a paralisação acabar.

O desabastecimento chegou até a rede de fast food McDonald’s. Uma unidade em Copacabana, na Zona Sul do Rio, não tem mais o Big Mac, porque a última entrega, de sexta-feira, já acabou. Segundo o gerente, Yladian Barbosa, salada e hambúrguer vêm de São Paulo. Ele disse que o atraso causou prejuízo de R$ 18 mil:

— Renovamos o estoque a cada três dias. Mas há dois dias não recebemos mercadorias.

A Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) também constatou problemas. Maurício Salvador, presidente da entidade, disse que o atraso eleva os custos, devido à reprogramação das encomendas.

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Em alguns locais, faltam gás de botijão, insulina e hormônios

Bruno Rosa

Roberta Scrivano

24/05/2018

 

 

Associação de farmácias chama atenção para validade de remédio que precisa de refrigeração

Entre os produtos cuja distribuição foi afetada pela greve dos caminhoneiros está o gás de botijão (GLP). Segundo o Sindigás, que reúne as empresas distribuidoras de GLP, já falta produto em Goiânia e Distrito Federal.

“A interdição das principais rodovias brasileiras impede a saída dos caminhões que transportam o gás, seja a granel ou em botijões, das bases de enchimento das distribuidoras até o consumidor final ou até as revendas de gás”, afirmou o órgão em nota.

De acordo com o presidente da Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafama), Sérgio Mena Barreto, a paralisação também causa falta de insulina e hormônios, usados para doenças do sistema nervoso, em diversas farmácias do Rio de Janeiro:

— O problema mais grave são com os medicamentos que precisam de refrigeração.

Segundo ele, o problema se agrava a cada dia, pois 70% dos remédios no Brasil são fabricados em São Paulo. Por dia, são distribuídos 6,3 milhões de medicamentos em geral, que atendem a 2,5 milhões de pessoas.

— Queremos pedir para o sindicato dos caminhoneiros que considere o setor e o trate de forma especial, pois esses medicamentos refrigerados não podem ficar parados na estrada, pois têm validade muito curta — disse Mena Barreto.