O globo, n. 30960, 13/05/2018. País, p. 10

 

Ações da Lava-Jato já mobilizam 55 países

Juliana Castro

13/05/2018

 

 

A cada três dias, um pedido de informações é feito entre nações e territórios, de Andorra a Gibraltar.

A Operação Lava-Jato levou o país a aumentar, em nível nunca antes visto, o número de pedidos de cooperação internacional. Já foram 570 desde março de 2014, quando a primeira ação foi às ruas: uma solicitação a cada três dias. A estatística deve subir ainda mais com a última operação no Rio, a Câmbio, Desligo, contra uma rede formada por doleiros. Eles movimentaram US$ 1,6 bilhão por meio de 3 mil empresas offshores sediadas em 53 países.

Os 570 pedidos feitos até o momento englobam 55 países e territórios autônomos, ou seja, um quarto do mundo foi, de alguma forma, atingido pela investigação do maior escândalo brasileiro. O número engloba tanto demandas feitas pelo Brasil a outras nações quanto a via contrária. Mesmo com quatro anos de operação, o número de pedidos aumenta a cada ano.

Essas investigações são concentradas no Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), que faz parte do Ministério da Justiça. Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal remetem suas demandas ao órgão, que, por sua vez, as encaminha aos países. As solicitações envolvem, por exemplo, quebras de sigilo bancário, buscas, apreensões, depoimentos de testemunhas, bloqueios de bens e repatriação de ativos localizados no exterior.

— De início, havia muito mais pedidos do Brasil para os outros países. Nos últimos anos, as solicitações das outras nações crescem mais que as nossas — diz Isalino Giacomet Júnior, coordenador-Geral de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal do DRCI.

Ao todo, 60% das demandas são feitas pelo Brasil a outros países, e 40% vêm de fora — percentual incrementado por investigações sobre a Odebrecht no exterior.

Antes da Lava-Jato, a investigação que havia gerado maior quantidade de pedidos de cooperação, 186 no total, foi a Operação Banestado, deflagrada no início da década passada e que mirou doleiros. Entretanto, quase todas as demandas foram para os Estados Unidos. Com o passar dos anos, os criminosos sofisticaram a lavagem de dinheiro, usando contas e offshores em vários países, para dificultar o rastreio do dinheiro.

Hoje, a maior parte dos pedidos brasileiros são dirigidos à Suíça, mas já foram direcionados a lugares mais inusitados como Curaçao, no Caribe. Foi quando a PF em Curitiba pediu uma quebra de sigilo bancário para subsidiar investigação de pagamentos de propina a agentes públicos como contrapartida pela formalização de contratos com a Petrobras.

PREFERÊNCIA PELO URUGUAI

O Brasil também já fez pedidos a Gibraltar, Macau e Israel para quebra de sigilo bancário de envolvidos na Lava-Jato. A mesma solicitação foi enviada para Ilha de Man, Andorra e Bahamas, acrescidos do pedido para bloqueio de ativos. O DRCI não divulga o conteúdo das demandas porque ainda não foram atendidas e poderiam comprometer as investigações.

Mais de US$ 1 bilhão está bloqueado no exterior por causa de solicitações do DRCI. Mais da metade do montante é referente à Operação Lava-Jato.

— Mesmo em países que antes eram de difícil acesso, como paraísos fiscais, o Brasil tem conseguido informações. Os países têm sofrido pressão internacional para que não sejam local propício para ocultar dinheiro — explicou Giacomet.

Uma parte considerável dos pedidos são feitos ao Uruguai:

— O país tinha uma legislação mais branda com relação à lavagem de dinheiro. Era considerado um paraíso fiscal, permitia que offshores fossem instaladas lá. Mas, há uma mudança na legislação de uns tempos para cá — explicou o coordenador da força-tarefa do Rio, Eduardo El Hage.

Foi do Uruguai que os doleiros Vinicius Claret e Cláudio Barboza, o Juca e o Tony, passaram a operar em 2003, quando Dario Messer transferiu seus negócios para o país vizinho. Juca e Tony viraram delatores e revelaram a rede investigada pela Operação Câmbio, Desligo.

— Depois do Banestado, os doleiros ficaram preocupados e buscaram mudar o modus operandi — explica o procurador Sérgio Pinel.