Valor econômico, v. 19, n. 4499, 09/05/2018. Internacional, p. A10.

 

Acuada por corrida ao dólar, Argentina pede ajuda ao FMI

Marsílea Gombata, Sergio Lamucci e Juliano Basile 

06/05/2018

 

 

Em mais uma tentativa de conter a crise cambial que atinge a Argentina nas últimas semanas, o presidente Mauricio Macri anunciou ontem que o seu governo começou a negociar uma linha de crédito com o Fundo Monetário Internacional (FMI). A ideia é obter um valor próximo a US$ 30 bilhões, para a reforçar as reservas internacionais, num momento em que o peso se desvaloriza com força.

"Isso vai permitir enfrentar o novo cenário global e evitar uma crise como as que tivemos antes em nossa história", disse Macri, em pronunciamento pela televisão. Ele citou a sua opção por uma política econômica gradualista para "equilibrar o desastre que deixaram nas contas públicas", mas que fez a Argentina ficar dependente de emissão de dívida no mercado externo. "Estou convencido de que o caminho que tomamos resultará em melhor futuro para todos."

A pressão sobre a moeda argentina se acentuou nas últimas semanas. Como resposta, o banco central elevou os juros três vezes em oito dias, jogando a taxa básica para 40% ao ano, e a equipe econômica anunciou que vai perseguir um déficit primário de 2,7% do PIB neste ano, um pouco menor que a meta anterior, de 3,2% do PIB.

A Argentina vive uma situação delicada. A inflação acumulada em 12 meses supera 25% e o país tem grandes déficits externo e fiscal. O rombo na conta corrente (resultado das transações de bens, serviços e rendas como exterior) está na casa de 5% do PIB.

O objetivo de obter uma linha de crédito do FMI de US$ 30 bilhões é reduzir a desconfiança dos investidores no país, aliviando a pressão sobre o câmbio, que se desvalorizou 16,99% neste ano. Macri lembrou que a Argentina é o país do mundo que mais depende de financiamento externo e afirmou que fatores externos - como o provável aumento dos juros americanos e a alta do preço do petróleo - atrapalham a situação econômica da Argentina. "São variáveis que não administramos."

Em entrevista coletiva, o ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne, disse que o objetivo do governo ao procurar o FMI é dar garantias aos investidores, ainda que o país tenha 85% das suas necessidades financeiras cobertas para 2018. "Dado o contexto internacional, quanto mais certeza pudermos dar, melhor", afirmou. "Decidimos buscar financiamento preventivo para dar estabilidade ao mercado, diante das taxas de juros em elevação e da depreciação das moedas frente ao dólar", acrescentou. "Nosso programa [de ajuste gradual] nos leva a solvência da dívida, mas nos deixa expostos ao mercado".

As reuniões vão começar hoje em Washington. O pedido para a realização de encontros foi feito diretamente pelo  de encontros foi feito diretamente pelo governo argentino, que terá Dujovne como responsável pelas negociações com o Fundo. "A Argentina é um membro valioso do FMI", disse a diretora-gerente do Fundo, Christine Lagarde. "Agradeço a declaração que o presidente Mauricio Macri fez hoje e estou ansiosa para continuar a nossa colaboração com a Argentina."

Em relatório, a consultoria de risco político Eurasia Group diz que ainda não está claro qual a modalidade de linha de crédito que o FMI vai fornecer à Argentina. Os primeiros rumores davam conta de um valor de US$ 30 bilhões por meio da Linha de Crédito Flexível (FCL, na sigla em inglês), voltada para prevenir crises em países "com arcabouços de políticas e histórico de desempenho econômico muito fortes". O ponto é que os fundamentos econômicos da Argentina são fracos, como nota a Eurasia. Na América Latina, México e Colômbia têm esse tipo de acordo com o Fundo, e nunca usaram os recursos. Com isso, a tendência é que o acerto argentino envolva algo como a Linha de Precaução e Liquidez (PLL, na sigla em inglês), que exige algumas contrapartidas, diz a consultoria.

O governo também recorreu a uma medida heterodoxa para tentar debelar a crise. Ontem, ministro de Energia, Juan José Aranguren, propôs às empresas petrolíferas o congelamento dos preços dos combustíveis até julho, o que foi aceito pelas companhias.