Valor econômico, v. 18, n. 4496, 04/05/2018. Especial, p. A12.

 

Centrão economiza fundo para eleição

Raphael Di Cunto e Lucas Marchesini 

04/05/2018

 

 

O Centrão, como ficou conhecido o grupo de partidos médios sem viés ideológico que apoia o presidente Michel Temer economizou, somado, mais de R$ 50 milhões do fundo partidário no ano passado para despejar nas campanhas de deputados e senadores e aumentar ainda mais sua influência no Congresso Nacional - e, consequentemente, no próximo governo.

Os dados, compilados pelo Valor entre os 20 maiores partidos, constam das prestações de contas de 2017 encaminhadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e comprovam o temor de petistas e tucanos: com o fim das doações empresariais, essas legendas, com pouca atividade partidária, estão economizando o dinheiro público recebido com o objetivo de investir na eleição da próxima legislatura.

Enquanto PT e PSDB dividem o fundo partidário com atividades políticas e o fundo eleitoral com caras campanhas presidenciais e aos governos estaduais, o PP recebeu R$ 49 milhões em 2017 e guardou R$ 18 milhões. Segundo o deputado Ricardo Barros (PP-PR), tesoureiro da legenda, contabilizados anos anteriores, a sigla já acumula R$ 40 milhões para bancar a eleição dos filiados.

Quem mais guardou dinheiro ano passado, entre os que tiveram os dados divulgados até ontem, foi o PRB. A legenda comandada pelo bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus Marcos Pereira declarou receita de R$ R$ 41 milhões e "lucro" de R$ 25,6 milhões. Ao fim do ano, tinha R$ 51 milhões em caixa.

Dos gastos do PRB, contudo, R$ 6,8 milhões foram para a fundação partidária, que recebe 20% do fundo para formação política dos filiados. Mas a minirreforma política liberou que o saldo ao fim do ano volte para o partido. O PRB já incorporou R$ 5,1 milhões de 2016 e deixou R$ 4,2 milhões de 2017 intocados. Portanto, destinará 73% do recebido ano passado para as campanhas do Legislativo - a sigla escolheu o milionário Flávio Rocha, dono da Riachuelo e com condições de bancar a própria campanha, como presidenciável.

O PR, comandado com mão de ferro pelo ex-deputado Valdemar Costa Neto, é outro que tem guardado recursos, mas ainda não é possível saber o volume porque seus advogados pediram sigilo ao TSE. O pedido foi indeferido ontem, mas os dados por enquanto não foram divulgados. Procurado, o PR não respondeu porque quis manter secretas as informações.

Outros integrantes do Centrão, como o PSD do ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, e o Solidariedade, do deputado Paulinho da Força (SD-SP), registraram economias menores, de 4,6% e 13,3%. Isso não significa, necessariamente, que ficarão para atrás. Esses partidos ofereceram, quando criados, repassar parte do fundo partidário para os Estados com o objetivo de atraírem deputados. O modo como o dinheiro será aplicado, portanto, dependerá desses parlamentares/ dirigentes.

Já o PT, por outro lado, declarou receita muito maior (R$ 123 milhões), mas fez uma poupança bem mais magra (R$ 5,5 milhões), equivalente a apenas 4,5% do que recebeu. A sigla ganhou R$ 93,5 milhões de fundo partidário (que é distribuído pelo número de votos recebidos na eleição anterior para a Câmara dos Deputados), R$ 17,9 milhões em contribuições de filiados em cargos públicos ou dirigentes partidários (de longe o maior valor entre todas as siglas) e R$ 1,3 mil em doações de pessoas físicas.

O MDB, que também divide as campanhas ao Legislativo com a pretensão de lançar candidato próprio à Presidência e aos governos locais, teve receita de R$ 80,9 milhões, quase tudo do fundo partidário, e poupou 11% (R$ 8,9 milhões). O valor nominal é próximo do DEM, apesar de a receita ser menos da metade - a sigla do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (RJ), recebeu R$ 33,2 milhões e economizou 24,3%.

O PSDB foi o único que não entregou as contas no prazo, que acabou segunda-feira. A sigla diz que protocolou dia 23 de abril, mas alegou problemas com o novo sistema do TSE (ver abaixo). Até a noite de ontem, apenas parte do processo estava disponível na Justiça Eleitoral, o que não incluia os balanços consolidados.

Diante de divergências entre os balanços gerados pelo sistema do TSE e os demonstrativos de resultado do exercício (DRE), informados pelas siglas, o Valor optou por usar o segundo, quando disponível.

O PSL, do deputado Jair Bolsonaro (RJ), economizou quatro vezes mais do que ele diz que gastará na campanha presidencial. Dos R$ 5,3 milhões recebidos, gastou só R$ 1,2 milhão - o repasse obrigatório para a fundação. A Rede, de Marina Silva, teve receita quase igual, mas acabou com prejuízo de R$ 1,2 milhão. Mesmo com só R$ 1 milhão de fundo partidário - que ele diz que não usará -, o Novo, do banqueiro João Amoedo, terminou com R$ 6,6 milhões graças a doações e contribuições de filiados, valor parecido com o do PDT de outro presidenciável, Ciro Gomes. (Colaborou Fernando Torres, de São Paulo)