O globo, n. 30937, 20/04/2018. País, p. 7

 

Um estudioso do STF na ABL

Bolívar Torres

20/04/2018

 

 

Joaquim Falcão foi eleito ontem para a cadeira de Carlos Heitor Cony, morto em janeiro. Entre seus planos para a Academia estão a disseminação dos conhecimentos sobre o Supremo Tribunal Federal e o combate ao ‘juridiquês’

Eleito, na tarde de ontem, como novo membro da Academia Brasileira de Letras, o advogado Joaquim Falcão nunca havia almejado a “imortalidade”. Mas a “conjugação de um tempo perfeito”, como define, convenceu-o a se candidatar para a cadeira número 3, vaga após a morte de Carlos Heitor Cony, em janeiro deste ano. Um dos mais respeitados especialistas em Supremo Tribunal Federal, Falcão, de 74 anos, entendeu que uma candidatura sua estaria sintonizada com o interesse crescente dos brasileiros por questões jurídicas. Talvez isso explique a votação expressiva que recebeu — na disputa contra a escritora Vilma Guimarães Rosa, recebeu 32 dos 35 votos possíveis. Houve ainda três votos nulos.

— Nunca pensei na vida em me candidatar — diz o novo imortal. — O Brasil está muito sintonizado com a importância do Supremo, com a importância da democracia e da liberdade de informação. E, por coincidência, me considero um ativista democrático. Acho que essa sintonia funcionou.

Doutor pela Universidade de Genebra e pela Harvard Law School, Falcão é professor titular da FGV Direito Rio (que dirigiu entre 2002 e 2017). Analista contundente do STF, ele publicou, no ano passado, o livro “O Supremo”, que reúne 70 artigos sobre as posições e decisões tomadas por ministros e presidentes da mais alta instância do poder judiciário no Brasil. É autor também dos livros “A favor da democracia” (2004), “Mensalão: Diário de um julgamento” (2013) e “Reforma eleitoral no Brasil” (2015).

Agora imortal, o advogado pretende trazer seus conhecimentos sobre questões jurídicas para a academia.

— Existe uma ponte muito clara entre a ABL e os intelectuais, que tentam expressar a consciência do povo brasileiro, a criatividade, o pluralismo e o sincretismo — explica Falcão. — E o Supremo tem que expressar o sentimento de justiça. Tenho certeza que vai dar certo, e que o Supremo mais e mais vai se aproximar desse sentimento nacional.

 

“TRADUZIR CONHECIMENTO”

Uma das preocupações de Falcão é com a linguagem, muitas vezes hermética, utilizada no mundo jurídico, inclusive no STF. Em seus artigos, ele se notabilizou por criticar o chamado “juridiquês”. Nisso, também vê uma sintonia em seu ingresso na Academia, que não por acaso tem “letras” no nome.

— Letras é comunicação. Com a audiência sobre justiça e direito constitucional aumentando enormemente, é preciso saber traduzir o conhecimento, porque o povo só pode participar daquilo que entende. Então, é função tanto da Academia quanto dos intelectuais fazerem com que ela seja entendida pela população. De modo que o “juridiquês”, acredito, já esteja em fase de regressão.

O acadêmico Domício Proença Filho comemorou a nova “aquisição” da Academia, que chega, segundo ele, para “reforçar a área jurídica da casa”.

— Com seu currículo, experiência e representatividade, ele será muito útil para Academia, que tem uma tradição de presença de juristas muito forte. E também será importante por sua juventude, porque, numa casa octogenária, ter 70 anos já é jovem — brincou Domício