O globo, n.30913 , 27/03/2018. PAÍS, p.3​

LULA FICHA-SUJA

GUSTAVO SCHIMITT

 

 

TRF-4 rejeita apelação da defesa, confirma inelegibilidade e aguarda aval para ordem de prisão

Dois meses e dois dias após ter confirmado a condenação e aumentado a pena do ex-presidente Lula para 12 anos e um mês de prisão, os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) negaram ontem o embargo de declaração pedido pela defesa do petista. Embora este tipo de recurso não possa mudar o resultado do acórdão, a defesa pedia a nulidade do processo e a absolvição, o que não foi aceito. Com o resultado de 3 a 0, o ex-presidente se torna ficha-suja e é considerado inelegível para as eleições de 2018. Embora ainda caiba o recurso chamado embargo do embargo, o TRF-4 informou, porém, que não costuma conceder esse instrumento porque acha que ele só serve para atrasar o processo.

No julgamento, que durou cerca de 15 minutos, a Corte entendeu que alguns trechos pontuais do acórdão de 24 de janeiro deveriam ser corrigidos, mas não mudou o mérito da decisão: a condenação por corrupção e lavagem de dinheiro. Por isso, o resultado da sessão foi dar “parcial provimento” ao pedido da defesa para consertar os erros.

Uma das modificações que os desembargadores farão, por exemplo, será trocar o nome OAS Empreendimentos por Construtora OAS, quando se referem à empresa. Em outro ponto da decisão, os desembargadores diziam que o Instituto Lula estava fechado, quando, na verdade, funciona normalmente. O relator do processo, desembargador João Pedro Gebran Neto, concordou em retificar os trechos:

— Reconheço os erros materiais. Estou retificando. Em relação às atividades do Instituto Lula, que não estaria funcionando, eu destaco que esse ponto não altera o mérito — disse Gebran.

Ao se referir aos 59 pontos em que a defesa apontou omissões, obscuridades e contradições na sentença que manteve a condenação de Lula, o desembargador Victor Laus votou com o relator e frisou que não havia o que reconhecer:

— Não há qualquer contradição a ser reconhecida — disse o desembargador Laus.

Por causa das mudanças, os desembargadores vão publicar um novo acórdão. O prazo máximo para que isso ocorra é 5 de abril, um dia após a data em que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai terminar de julgar o habeas corpus preventivo de Lula. Na quinta-feira passada, o Supremo decidiu que o petista não poderia ser preso até 4 de abril. Não fosse isso, o ex-presidente poderia ser preso a partir da publicação do acórdão, considerando a rejeição do chamado “embargo do embargo”, que ainda deve ser apresentado pelos advogados de defesa do ex-presidente.

PARA DEFESA, LULA NÃO É FICHA-SUJA

Ao final da sessão, o advogado José Roberto Batochio afirmou que não considera Lula um ficha-suja justamente porque a defesa ainda tem direito a esse recurso.

— Não é ficha-suja porque o julgamento ainda não acabou. Se a sua preocupação é que ele não seja candidato, ainda hoje você vai ter de conservá-la porque até o momento não (está inelegível) — afirmou Batochio.

O defensor diz que está confiante de que habeas corpus de Lula possa prosperar no STF. Ele ainda listou uma série de questionamentos a sentença que levou a condenação do petista pelo caso do tríplex do Guarujá.

— A inocência dele é mais clara que um dia de sol, ou meio dia. Ele recebeu alguma vantagem ilícita na transferência da propriedade do apartamento, como pode ter recebido se o apartamento está em nome da OAS? Ele nunca entrou no apartamento e nunca ficou lá. Não querer reconhecer essa inocência pelo motivo A, B ou C, isso é lá outra coisa. Isso não posso responder — concluiu o defensor.

Os advogados de Lula também tentaram, sem sucesso, a suspeição do juiz Sergio Moro para julgar os processos, além dos procuradores que atuaram no processo. Ao longo desta e de outras ações penais em Curitiba, a defesa já havia ingressado com uma série de recursos semelhantes para tirar Moro do caso e os procuradores da Lava-Jato, sob a alegação de que os fatos citados na denúncia contra o petista não ocorreram no Paraná, mas em São Paulo e que, por isso, não deveriam ser apreciadas nem pela acusação e nem pelo juiz daquele estado. Também na sessão de ontem, foi negado o embargo de José Aldemário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS.

CINCO PERGUNTAS SOBRE O CASO

 

1 A DECISÃO DO TRF-4 TORNA LULA FICHA-SUJA?

Tecnicamente, Lula se tornou inelegível ontem, com a confirmação da condenação de janeiro por um colegiado de desembargadores, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. A sentença aplicada na primeira instância pelo juiz Sergio Moro foi ratificada e ainda ampliada a pena para 12 anos e um mês. Um dos efeitos dessa condenação é a inelegibilidade.

2 O QUE FALTA PARA A DECISÃO SER OFICIAL?

Falta a publicação do acórdão, uma espécie de resumo da decisão dos três desembargadores responsáveis pela análise do processo. O prazo para que isso ocorra é de dez dias. A defesa ainda pode apresentar os “embargos dos embargos”. Esse recurso, porém, costuma ser negado de imediato. Depois disso, o andamento do processo no TRF-4 é encerrado.

3 FICHA-SUJA, ELE PODE SER CANDIDATO?

Mesmo com Lula condenado, o PT pode pedir o registro da candidatura. Terá que apresentar certidões criminais. O TSE vai analisar a documentação. O tribunal pode até mesmo negar de ofício, se constatar que não cumpre os requisitos da lei. Ou se for provocado por concorrentes, partidos ou MP. Em todo caso, é aberta oportunidade de defesa e cabe recurso no próprio TSE.

4 PODE IR AO STF PARA SER CANDIDATO?

Lula pode apresentar um recurso ao STF caso alegue que algum direito constitucional está sendo ferido. O TSE pode conceder efeito suspensivo ou não. Na primeira hipótese, ele se mantém candidato até o STF julgar o recurso. Se não for concedida a suspensão, Lula só poderá continuar concorrendo se a mais alta Corte do país der uma liminar permitindo isso.

5 APÓS O ACÓRDÃO SER PUBLICADO, ELE SERÁ PRESO?

Depois que o processo no TRF-4 for finalizado, em situações normais, não há impedimentos para a Corte mandar ofício a Sergio Moro para que ele possa decretar a prisão. Mas, no caso de Lula, há um habeas corpus preventivo cujo julgamento será retomado no STF em 4 de abril. Enquanto a Corte não decidir, Lula tem salvo conduto para continuar livre.