Correio braziliense, n. 20042, 05/04/2018. Economia, p. 8

 

Planalto faz projeto de autonomia do BC

Antonio Temóteo

05/04/2018

 

 

CONJUNTURA » Texto em discussão na Casa Civil, que pretende ser alternativa a propostas em discussão no Congresso, estabelece mandato fixo de cinco anos para diretores da autarquia. Instituição teria objetivo exclusivo de controlar a inflação

A Casa Civil da Presidência da República prepara uma proposta sobre a autonomia do Banco Central (BC) para ser encaminhada ao Congresso Nacional nas próximas semanas. A medida foi a solução encontrada pela equipe do presidente Michel Temer em meio à queda de braço entre o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o líder do governo no Senado Federal, Romero Jucá (MDB-RR), pela paternidade do projeto de lei.

Diferentemente das medidas defendidas pelos parlamentares, o texto do Executivo prevê mandatos de cinco anos para os dirigentes da autoridade monetária, não coincidentes com o do presidente da República, a partir de 2020. Além disso, a minuta do projeto não prevê a recondução dos diretores da autarquia e determina, como objetivo único e exclusivo do órgão, a garantia da estabilidade do poder de compra da moeda.

Na prática, caberia à autoridade monetária manter o controle da inflação. A prerrogativa de cumprir apenas o regime de metas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) também é defendido por Maia. Entretanto, o presidente da Câmara propõe mandatos de quatro anos para os dirigentes do BC, a partir de 2020, com a possibilidade de recondução.

Jucá, porém, defende um objetivo duplo para a autoridade monetária. Além de controlar a inflação, caberia ao BC levar em conta o crescimento econômico na hora de definir a taxa básica de juros (Selic). O líder do governo no Senado argumenta que o duplo mandato já é uma realidade no Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos. Conforme ele, essa previsão garantiria a aprovação do texto no Congresso.

O duplo mandato, entretanto, não é visto com bons olhos pelo presidente do BC, Ilan Goldfajn, que já se pronunciou publicamente contra essa alternativa. Em meio às divergências, a única pendência na proposta em debate pela Casa Civil é sobre como será feita a transição até a escolha dos dirigentes em 2020. Isso porque o próximo presidente da República tomaria posse em 2019 e as novas regras passariam a valer a partir do ano seguinte.

Uma possibilidade em discussão é a manutenção da atual diretoria até 2020. Entretanto, ainda não está claro se Ilan e os demais diretores continuariam à frente do BC durante a gestão de um chefe do Executivo sem compromisso com a continuidade de reformas e ajustes na economia. Auxiliares de Temer afirmam que o mais importante é que o texto garanta autonomia formal à autoridade monetária, com objetivo único. “A discussão sobre mandato de quatro ou cinco anos, com possibilidade de recondução é secundária”, disse um assessor palaciano.

Bancos públicos

Além da proposta sobre a autonomia do BC, o governo ainda trabalha em um projeto de lei que submeterá a escolha dos presidentes dos bancos públicos ao crivo da autoridade monetária. Pela norma atual, a nomeação é prerrogativa do presidente da República, sem que os nomes indicados sejam escrutinados pelo regulador do sistema financeiro. O Executivo avaliava a edição de um decreto presidencial sobre o tema, mas essa possibilidade foi abortada.

Outro tema de interesse do BC, o cadastro positivo, deve ser votado pela Câmara dos Deputados na próxima semana. O relator da proposta, deputado Walter Ihoshi (PSD-SP), leu o relatório em plenário, ontem. O texto define que todos os brasileiros podem fazer parte do ranking de bons pagadores. Caso não queiram, podem solicitar a exclusão.

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Fatura de R$ 20 bi

Hamilton Ferrari

05/04/2018

 

 

A União deve perder R$ 20 bilhões em arrecadação, nos próximos 15 anos, com o Refis para micro e pequenas empresas e com a renegociação de dívidas com o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). As duas propostas foram aprovadas na última terça-feira pelo Congresso, que derrubou os vetos presidenciais aos dois temas. Porém, se a sanção do projeto que dá descontos às companhias enquadradas no Simples Nacional ficar para maio, os prejuízos só devem ser sentidos a partir de 2019.

As micro e pequenas empresas têm prazo de 90 dias para aderir ao Refis. Além disso, poderão dividir a entrada em cinco parcelas. Dessa forma, as prestações da dívida tributária ficarão para o próximo ano. Mesmo assim, o governo federal vai deixar de ter um ganho considerável nos próximos exercícios.

Na equipe econômica, o tom é de crítica ao Congresso, mesmo tendo havido, no caso do Refis, acordo com o Executivo para a derrubada do veto. Para os técnicos, os parlamentares não prezaram pelo ajuste fiscal e deram benefícios tributários excessivos aos contribuintes irregulares.

O especialista em contas públicas Gil Castello Branco apontou que o Legislativo é “corresponsável” pela situação atual das contas públicas, que tiveram deficit de R$ 124 bilhões em 2017 e podem levar o governo a descumprir, em 2019, o teto dos gastos e a regra de ouro — que impede o Executivo de emitir dívida para pagar despesas correntes. “O governo é emparedado pelo Congresso em medidas para aumentar receita ou reduzir despesas”, apontou.