Correio braziliense, n. 20026, 20/03/2018. Política, p. 4

 

Pedido negado, discussão aberta

Renato Souza

20/03/2018

 

 

PODERES » Gilmar Mendes rejeita habeas corpus coletivo contra a prisão em segunda instância, mas ministros querem que o tema seja reavaliado pelo plenário do Supremo, apesar de a presidente da Corte ter opinião contrário

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou ontem à noite um habeas corpus coletivo, apresentado pela Associação dos Advogados do Estado do Ceará (AACE), com a intenção de impedir a prisão de condenado em segunda instância da Justiça. Caso tivesse sido aceita, a medida poderia beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado a 12 anos e um mês pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) por corrupção e lavagem de dinheiro. Mesmo com a decisão, assuntos que fazem parte da pauta oficial do Supremo Tribunal Federal (STF) e mobilizações que ocorrem nos bastidores levam a Corte a se aproximar de uma nova análise que pode mudar o entendimento sobre o tema. Uma reunião informal para discutir o assunto vai ocorrer na tarde de hoje no Supremo.

Pressionados pelo caso do ex-presidente Lula, os ministros enfrentam diversas ações que podem beneficiar o petista. Além do habeas corpus apresentado pela defesa dele, ações de advogados e organizações pedem a revisão do julgamento realizado em 2016 que consolidou o entendimento para prisões após condenação em segunda instância. A ministra Cármen Lúcia mantém a opinião irredutível de que não se deve pautar no Supremo um assunto que já foi discutido em outras três ocasiões. Mas um grupo de magistrados, liderados pelo decano do STF, Celso de Mello, vê como inevitável que esse debate seja novamente levado ao plenário para ser avaliado. Os integrantes do tribunal analisam qual seria a melhor forma de fazer isso.

Cármen Lúcia destacou que só depende do ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF, para que o habeas corpus apresentado pela defesa de Lula seja votado. “O Supremo examinará assim que o ministro Edson Fachin levar à mesa, ou à segunda turma ou ao plenário. O relator é o responsável por levar o processo e dizer a importância do processo. Quando o relator levar, o habeas corpus tem preferência constitucional, porque lida com liberdade”, afirmou em entrevista à Rádio Itatiaia.

Fontes do Supremo, ouvidas pelo Correio, no entanto, destacam que não existe intenção de Fachin em discutir o assunto agora e que ele já teria informado isso para a presidente do tribunal. Outra possibilidade para pautar o assunto seria colocar na agenda uma das ações diretas de inconstitucionalidade (Adin) que já foram apresentadas ao Supremo. Além de afastar o trabalho dos ministros da figura do ex-presidente, manteria a imagem de que ao pautar o assunto, os magistrados estão avaliando o caso de milhares de presos em todo o Brasil e não apenas o do ex-presidente.

Um recurso apresentado na ação inicial, que deu origem à decisão que está em vigor sobre o momento do cumprimento da pena, também poderia livrar o petista da cadeia, pelo menos por alguns meses. O Instituto Ibero Americano de Direito Público ingressou, no dia 14, com embargos de declaração no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 43), que resultou na permissão para prisão após condenação em segunda instância, em 2016. Isso foi possível porque o STF demorou mais de um ano para publicar o acórdão, ou seja, a decisão que tinha sido tomada naquela data. Com a apresentação dos embargos, o ministro Gilmar Mendes, que até então era a favor da prisão antes da condenação nos tribunais superiores, poderá mudar seu voto.

Ao rejeitar o habeas corpus coletivo que tratava do tema, Gilmar Mendes afirmou que o assunto está sendo alvo de amplos debates no Supremo. “Convém destacar que a questão é das mais debatidas nesta Corte. A título exemplificativo, em 2009, nos autos do HC 84.078, de relatoria do ministro Eros Grau, o plenário decidiu, por maioria de votos, conceder ordem de habeas corpus, condicionando a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória, deixando assentado que a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar”. O magistrado afirmou que cada caso deve ser analisado individualmente, antes que o plenário se debruce sobre o assunto.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) deve concluir no dia 26 os embargos de declaração apresentados pelos advogados de Lula no processo em que ele foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro. Até lá, ele corre contra o tempo para garantir a liberdade.

No fim de semana, o ministro Celso de Mello convidou Cármen Lúcia para uma reunião, fora da agenda oficial, para debater como o STF deve se portar diante do impasse em relação à prisão em segunda instância. Ele convidou outros ministros e o encontro ocorre no fim da tarde de hoje. Ao ser questionada sobre o caso, Cármen Lúcia destacou que a ideia não partiu dela. “Não fui eu que convoquei a reunião. Celso de Mello achou conveniente conversar com os ministros”, afirmou.

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Ações pendentes

20/03/2018

 

 

O Instituto Ibero Americano de Direito Público ingressou com embargos de declaração no julgamento da ADC 43, que resultou na permissão de prisão após condenação em segunda instância

Com essa medida, o ministro Gilmar Mendes, que era a favor da prisão nesta etapa de um processo, antes do trâmite em julgado, pode mudar seu voto

Em outra frente, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo, pressiona para que seja pautada alguma ação que pode mudar o entendimento da Corte sobre o momento da prisão

Um habeas corpus coletivo apresentado pela Associação dos Advogados do Estado do Ceará (AACE) será analisado pelo ministro Gilmar Mendes

Se o pedido for aceito, réus condenados em segunda instância de Justiça que foram presos ou estão na iminência de serem encarcerados, se livram da cadeia

Está nas mãos do ministro Edson Fachin um habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele pode decidir levar o caso ao plenário ou à segunda turma