Valor econômico, v. 18, n. 4432, 30/01/2018. Política, p. A7.

 

 

Base aliada reage a corte de financiamentos

Andrea Jubé e Edna Simão

30/01/2018

 

 

A suspensão temporária da concessão de empréstimos para Estados e municípios, pela Caixa Econômica Federal, irritou aliados do presidente Michel Temer, que contavam com investimentos em obras de infraestrutura do programa Avançar para atender suas bases em um ano eleitoral. O impacto negativo da medida sobre os parlamentares da base aliada pode prejudicar a votação da reforma da Previdência Social, que Temer tentará aprovar em fevereiro. "A suspensão desses contratos enterra a Previdência", advertiu, ontem, um importante líder partidário.

Anunciada na sexta-feira, a suspensão por prazo indeterminado atinge os empréstimos sem garantia da União.

A Caixa está em uma corrida para cumprir os requerimentos de capital de Basileia 3 até 1º de janeiro de 2019. A suspensão dos contratos dos empréstimos é parte de um leque de alternativas que o banco está lançando mão, já que não haverá aporte de capital pelo Tesouro Nacional.

Só com a limitação dos gastos com plano de saúde dos seus funcionários a 6,5% da folha de salários a instituição deverá liberar cerca de R$ 5 bilhões em provisionamentos que passam a compor o capital.

A Caixa deverá, ainda, vender carteiras de crédito, emitir bônus perpétuos no mercado internacional e incorporar 100% de seu lucro no ano passado, estimado em R$ 13 bilhões, segundo fontes do governo. Esse número será divulgado após o Carnaval.

Feudo político do PP, partido responsável pela indicação do presidente Gilberto Occhi, em um consórcio com outras siglas aliadas, como MDB, DEM, PR e PRB, que indicaram os vice-presidentes da instituição, a Caixa vai recorrer, também, a um novo programa de demissão voluntária (PDV) para cortar despesas.

A suspensão da liberação de empréstimos sem garantia, que exigem mais capital do que os que têm aval da União, atinge diretamente o Programa Avançar, lançado com alarde pelo presidente Michel Temer no início de novembro, para revigorar o governo após o desgaste do julgamento, pela Câmara dos Deputados, de duas denúncias contra o presidente.

O Avançar é um programa de destina R$ 130,9 bilhões para 7.439 projetos nos Estados e municipios do país. Da Caixa e do BNDES estão previstos R$ 29,9 bilhões até o fim deste ano. O restante são recursos orçamentários e do setor privado alocados para projetos de duplicação de rodovias à pequenas obras em municípios, como creches e quadras de esporte, passando por contratos de financiamento do Minha Casa, Minha Vida.

Os parlamentares contavam com esses recursos para agradar prefeitos às vésperas da campanha de reeleição. A paralisação dos contratos neste momento deixa os deputados insatisfeitos e coloca em risco a já difícil votação da reforma da Previdência.

Para poder cumprir o cronograma de empréstimos a Caixa tentou negociar com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) a troca de uma dívida do banco por bônus perpétuos, títulos sem data de vencimento.

A proposta não teve aprovação do Ministério da Fazenda e foi enterrada. Ao mesmo tempo, houve a exoneração de três vice-presidentes da Caixa por suspeitas de irregularidades, o que aborreceu os aliados do PP, PR e PRB, que haviam indicado os executivos. O ministro Carlos Marun (Secretaria de Governo) reconheceu que o afastamento dos apadrinhados deixou um "gosto amargo" na boca dos aliados.

É clara a intenção do governo de reduzir o tamanho da Caixa, que se agigantou a partir de 2007 com objetivo de deter 20% do mercado de crédito do país. Simultaneamente, distribuiu gordos dividendos ao Tesouro e cumpriu determinação do governo para reduzir os juros. Foi uma combinação insustentável que só seria possível com novo aporte de capital. Na avaliação de fonte graduada da equipe econômica, o banco poderá apenas manter o ritmo de crescimento do crédito do ano passado.

Técnicos do governo reconhecem que a decisão da Caixa vai comprometer o início de novas obras em um momento de retomada do crescimento. Mas a avaliação é de que o impacto não será tão expressivo no Programa Avançar, pois muitas obras já estão em andamento e com previsão de conclusão em 2018.

Desde o ano passado, a Caixa vem desacelerando o ritmo de concessão das operações de crédito para se preparar para o cumprimento das regras prudenciais de Basileia, que ficam mais restritivas a partir de 2019. Isso porque, diante da restrição orçamentária, a equipe econômica tinha avisado que não há espaço para capitalização de suas empresas.