Correio braziliense, n. 19731, 04/06/2017. Política, p. 4

 

7 Juízes e 1 sentença para Temer

Paulo de Tarso Lyra 

04/06/2017

 

 

REPÚBLICA EM TRANSE » Na terça-feira, os integrantes do TSE reúnem-se para analisar o pedido de cassação da chapa encabeçada por Dilma. As atenções se voltam, porém, para o futuro do presidente da República, que enfrenta uma crise aguda

Depois de um hiato de dois meses, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) retoma, na próxima terça-feira, dia 6, a análise do pedido de cassação da chapa Dilma-Temer, feita pelo PSDB, por abuso de poder econômico. Interrompido no início de abril, após uma queixa dos advogados do PMDB e do PT em relação a um suposto cerceamento de defesa e de um pedido do Ministério Público Eleitoral para colher os depoimentos dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura, o julgamento se reinicia em um cenário completamente diferente. O governo de Michel Temer enfrenta uma crise política aguda após as delações da JBS, dois novos ministros compõem o colegiado e as respectivas defesas ressuscitaram a pressão para que o processo retomasse o escopo original — a campanha de 2014, desprezando delações da Odebrecht, e, obviamente, as acusações feitas pelo empresário Joesley Batista.

Com todas essas imponderabilidades, a única aposta mais concreta é de que esse julgamento não se encerrará esta semana. É muito provável que haja um pedido de vistas e as hipóteses mais recorrentes recaem sobre o ministro Napoleão Nunes Maia, ou os dois calouros do colegiado — Admar Gonzaga ou Tarcísio Vieira de Carvalho Neto. Um defensor que estará no centro da contenda rebateu a tese de que, se isso ocorrer, não será uma questão meramente protelatória. “O processo é complexo e só quem tem conhecimento do completo teor dele é o relator Hermann Benjamin e, em tese, os advogados das duas partes. Nenhum ministro tem completo domínio das acusações e das provas produzidas até o momento”, justificou esse advogado.

O governo sabe que o julgamento é delicado para a continuidade da crise ou a retomada da governabilidade de Temer, com menos solavancos. Não que eles não possam ocorrer, já que não se sabe se haverá uma delação premiada do ex-deputado Rodrigo Rochas Loures, se novos fatos contra o presidente aparecerão — como provas de envolvimento do coronel Lima, assessor pessoal do presidente, em esquemas de corrupção — ou a crise vivida pelo PSDB em torno da permanência ou não no governo.

Votos a favor

Discretamente, o Planalto contabiliza quatro votos a seu favor. Além dos já citados Napoleão Maia, Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira, interlocutores do presidente Temer acreditam que contarão com o apoio do presidente da Corte, Gilmar Mendes. Contrário, garantido, estaria apenas o voto do relator, Herman Benjamim. Mas os governistas mais ferrenhos consideram oscilante e imprevisível os votos de Rosa Weber e Luiz Fux. “Possivelmente o julgamento vai se alongar por mais tempo. Se for resolvido logo, será a nosso favor. Mas essa rapidez é pouco provável neste momento”, frisou um aliado próximo do presidente.

O governo considerou uma vitória importante a divulgação do PIB positivo no primeiro trimestre — 1% de alta, o melhor resultado dos últimos dois anos. Para os governistas, este é um sinal de que a economia está se recuperando, o que tornaria ainda mais importante a permanência de Temer para completar o que começou, especialmente a batalha pela aprovação das reformas. “Não há reforma sem Michel. Qualquer outro que entrar no lugar dele não vai conseguir dar andamento à agenda que estamos implementando”, defendeu o vice-líder do governo na Câmara, Darcísio Perondi.

O julgamento também deverá ser precedido por uma questão essencial: todos os fatos novos surgidos após o início do processo devem ou não ser acrescentados? A defesa do presidente Michel Temer, com uma ênfase maior até que a defesa petista, pede que tudo relativo à Odebrecht seja excluído do processo, por não fazer parte do escopo original. Com isso, seriam desconsiderados, por exemplo, os depoimentos mostrando que a empreiteira doou mais de R$ 10 milhões para o PMDB, em 2014, via caixa 2, para auxiliar na campanha nacional e de Paulo Skaff ao governo de São Paulo.

É uma forma de blindagem às tentativas de contaminação inevitáveis do processo, por exemplo, pelas denúncias da JBS — posteriores às delações da Odebrecht. Foi justamente essa crise que balançou o governo Temer e provocou ameaças de ruptura por parte do PSDB, especialmente da ala jovem do partido, os chamados cabeças pretas.

Resultado

Para o cientista e professor de Ciência Política do Insper Carlos Melo, não são poucas as chances de os tucanos ficarem com o relatório de Hermann e não se preocuparem com o resultado final da votação, o que significaria um rompimento com o Executivo e a perda da governabilidade de Michel Temer. “O PSDB, até o momento, só tem o ônus de apoiar as reformas, sem o bônus se a economia melhorar por completo. Se eles desembarcarem, Temer ficará na mão apenas dos fisiológicos”, avalia Melo.

Na opinião do diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Augusto de Queiroz, a tendência, de fato, é que haja um pedido de vista, o que adiaria a conclusão do processo. Mas, na visão dele, se, mesmo após esse pedido, os demais ministros anteciparem seus votos — o que é muito comum nos julgamentos em tribunais superiores — essa poderá ser uma senha para o desembarque dos tucanos. “A situação de Temer segue frágil em várias frentes. Além do julgamento do TSE, existe o risco do desembarque do PSDB, uma possível delação de Rocha Loures e a divulgação de todos os documentos e áudios da delação da JBS”, completou Queiroz.

Três caminhos

O que pode acontecer no pedido de cassação

Pedido de vista

Essa possibilidade acontecerá após a leitura do relatório pelo ministro Hermann Benjamim, a sustentação oral feita pelos advogados de acusação e defesa, a intervenção do procurador-geral eleitoral e o voto dado pelo relator.

As suspeitas do pedido de vistas recaem sobre os ministros Napoleão Maia ou os novatos Admar Gonzaga e Tarcísio Carvalho. Caso isso aconteça, não há prazo definido para que o processo retorne ao plenário. Se o julgamento não for retomado no fim de junho, deverá ficar para agosto, já que, em julho, o Judiciário entrará em recesso.

Chapa cassada

Caso seja seguido o entendimento do procurador-geral eleitoral Nicolao Dino, a chapa é cassada, mas apenas a ex-presidente Dilma se torna inelegível. Caberá ainda recurso ao Supremo Tribunal Federal e o Michel Temer pode recorrer dessa decisão no cargo, caso obtenha um efeito suspensivo da decisão.

Se a decisão for mantida, assume a presidência da República interinamente o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que terá até 30 dias para marcar uma eleição indireta para completar o mandato até 31 de dezembro de 2018.

Chapa absolvida

Temer e Dilma não perdem os direitos políticos e o peemedebista fica no cargo até o fim, caso não venha a ser condenado pelo STF no processo de obstrução de Justiça. Alguns especialistas acreditam que, se vencer no TSE, Temer pode ganhar uma blindagem no STF.

Quem são os juízes

Gilmar Mendes,

61 anos

Presidente do TSE, foi indicado para o STF em 2002 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, de quem era advogado-geral da União. Também foi subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil na gestão tucana. É crítico sobre o PT, e próximo do atual chefe do Executivo, Michel Temer.

Herman Benjamin,

59 anos

Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), está na Corte no assento destinado ao STJ e seu mandato vai até outubro de 2017. Corregedor-geral da Justiça Eleitoral e relator do processo, também relata, no STJ, a Operação Acrônimo, que investiga um esquema de lavagem de dinheiro para campanhas eleitorais, entre elas, a do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel.

Tarcísio Carvalho Neto,

44 anos

Formado em Direito pela Universidade de Brasília, mestrado em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo e doutorado em Direito do Estado também pela Universidade de São Paulo. Exerce os cargos de ministro substituto do TSE, subprocurador-geral do Distrito Federal, Procuradoria-Geral do Distrito Federal e de professor adjunto da Universidade de Brasília.

Rosa Weber,

68 anos

Ex-ministra do Tribunal Superior do Trabalho, foi indicada para o STF por Dilma. Aprovada em primeiro lugar no vestibular, graduou-se em direito, em 1971, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Seis anos depois, ingressou na magistratura como juíza do trabalho. Em 1991, foi promovida, tornando-se juíza do TRT da 4ª Região. Em 2005, foi indicada por Lula para o TST.

Luiz Fux,

63 anos

Vice-presidente do TSE, é ex-ministro do STJ, e foi indicado para o STF pela ex-presidente Dilma, em 2011. Formado em direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, é doutor pela mesma faculdade em direito processual civil. Antes de ser juiz, foi promotor de Justiça do Ministério Público.

Napoleão Nunes,

71 anos

Ministro do STJ, é autor de vários livros e integrante da Academia Cearense de Letras. Bacharel e mestre em direito pela Universidade Federal do Ceará, foi advogado, procurador do estado do Ceará, assessor da presidência do TJ daquele estado e juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará e juiz federal.

Admar Gonzaga Neto, 57 anos

Com carreira eleitoral desde 1993, em junho de 2013, foi empossado por Dilma para o primeiro biênio, como ministro substituto do TSE. Em 1998, advogou para a campanha da reeleição de FHC e, em 2010, advogou para a campanha de Dilma. Também foi o advogado da conversão do PFL para o DEM.