O Estado de São Paulo, n.45194 , 13/07/2017. Política, p.A9

 

Condenação traz alívio a aliados de Temer

 

EX- PRESIDENTE SENTENCIADO / Com Lula no foco, pressão da oposição e críticas ao presidente perderiam fôlego; mas há quem veja com cautela ações contra políticos

Por: Carla Araújo / Thiago Faria / Rafael Moraes Moura / Bernardo Gonzaga / Mariana Machado

 

BRASÍLIA

 

Aliados do presidente Michel Temer avaliaram que a decisão do juiz Sergio Moro de condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser positiva para o governo já que tiraria o Palácio do Planalto do foco da crise política. A posição, no entanto, enfrenta divergência dentro do governo. Parte dos auxiliares vê com cautela a sentença.

Para alguns interlocutores de Temer, com Lula no foco do noticiário político, a oposição concentrará esforços na defesa do petista e as críticas ao presidente perderiam fôlego. Por outro lado, um auxiliar reconhece que a decisão mostra que há mudança de paradigma, apontando que políticos estão cada vez mais sujeitos a condenações.

A preocupação do Planalto envolve, além de Temer, os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência), alvos da Operação Lava Jato no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Há ainda a avaliação de que é preciso cautela ao se posicionar a favor ou contra da decisão já que políticos estão em disputa com o Ministério Público Federal. Após ser denunciado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Temer tem feito acusações de abuso por parte do MPF.

Oficialmente, o Planalto não comentou a decisão de Moro.

 

Congresso. Vice-líder do PSDB na Câmara, o deputado Pedro Cunha Lima (PSDB-PB) disse que a condenação é um “ganho institucional e democrático”. “O principal ganho é que mostra que ninguém está acima da lei”, afirmou o deputado.

Já aliados de Lula disseram acreditam que a condenação vai ser revertida em segunda instância por falta de provas.  Para petistas , o futuro do processo vai ter o mesmo destino do ex-tesoureiro João Vaccari, que foi absolvido no mês passado pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região. “A condenação é política e não jurídica”, disse o deputado Henrique Fontana (PT-RS).

“É subestimar a inteligência do povo achar que essa condenação aconteceu por acaso neste momento”, disse a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), fazendo referência à articulação do governo para garantir maioria na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que discute a admissibilidade ou não da denúncia contra Temer.

Aliado de governos petistas, mas apontado como um dos responsáveis pelo impeachment de Dilma Rousseff, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) saiu em defesa de Lula no plenário. Sem citar o petista, criticou o que chamou de “condenação sem provas”. A defesa de Lula por Renan ocorre após o peemedebista adotar uma postura crítica ao governo Temer, principalmente em relação às reformas. A reaproximação com o petista, porém, tem cálculo político - a preocupação com a reeleição ao Senado. /CARLA ARAÚJO, THIAGO FARIA, RAFAEL MORAES MOURA, BERNARDO GONZAGA E MARIANA MACHADO, ESPECIAL PARA O ESTADO

 

FRASES

"É subestimar a inteligência do povo achar que essa condenação aconteceu por acaso neste momento."

Jandira Feghali (PC DO B-RJ), DEPUTADA

 

"Primeiro cortam o financiamento da CUT , depois condenam o chefe da quadrilha. É bom demais!"

Roger Moreira, MÚSICO

 

"Lula condenado! Moro não tá pra brincadeira, certo ele"

José Luiz Datena, APRESENTADOR DE TV

 

 

 

'Prudência' de Moro não impedirá Lula de autovitimização

Por: Vera Magalhães

 

ANÁLISE:  Vera Magalhães

 

A primeira sentença de Lula na Lava Jato, no caso do triplex no Guarujá, já era aguardada para antes do início do recesso do Judiciário. Sua consumação, portanto, não foi surpresa. Tampouco foi a condenação do ex-presidente: a própria cronologia do processo, didaticamente incluída pelo juiz Sérgio Moro na caudalosa decisão proferida ontem, já levava a prever esta decisão.

Moro foi comedido na sentença. Tanto na pena imposta a Lula, de 9 anos e 6 meses de prisão, quanto na decisão, sobretudo política, de não determinar sua prisão imediata, embora em vários momentos diga que havia elementos a corroborar essa decisão. Essa “prudência”, como o próprio Moro definiu, não impedirá, no entanto, a estratégia de vitimização de Lula e a tentativa de desqualificar o juiz, já colocada em prática pelo PT.

Por mais que o juiz tenha sido exaustivo na apresentação das provas de que o triplex foi oferecido, negociado, reformado e visitado como um mimo da OAS à família Lula, e que o fato de ele não ter a propriedade não o inocenta, mas, pelo contrário, é a principal prova do crime de lavagem de dinheiro, o PT manterá Lula no palanque porque a candidatura se tornou seu único salvo-conduto.

O Brasil chegou ao paroxismo de ver um ex-presidente recorrer a uma candidatura como estratégia de defesa. Afinal, com a rejeição nas alturas, o vaidoso Lula jamais se arriscaria a perder nas urnas novamente, como ocorreu em 1989, 94 e 98.

Mas a candidatura é a única forma de manter uma narrativa para os que ainda seguem convertidos ao petismo. Mais do que isso: uma maneira desesperada de tentar frear um processo, em caso de uma improvável eleição do cacique.

O Brasil viveria, assim, mais um ineditismo vergonhoso: o de um cidadão condenado em primeira instância por corrupção e lavagem, mas que não pode ter o julgamento concluído porque foi eleito presidente da República. Cabe ao Tribunal Regional Federal da 4.ª Região cumprir seu dever de analisar os recursos em tempo hábil para evitar essa aberração.

 

 

Sentença provoca recorde de acessos no portal ‘Estadão’

A condenação de Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá teve forte impacto na internet. Foram 69.521 acessos simultâneos, ontem, no portal Estadão, uma audiência superior às registradas na posse do petista como ministro (58.638), em março de 2016; no 2º turno das eleições (45.120), em outubro de 2014; no impeachment de Dilma Rousseff (44.277), em agosto de 2016; e na morte do candidato à Presidência Eduardo Campos, em agosto de 2014 (37.000).

Nas redes sociais, assim que a notícia foi divulgada, o nome do petista chegou ao primeiro lugar nos trendings topics do Twitter mundial. Minutos mais tarde, “Sérgio Moro” passou a figurar entre os assuntos mais comentados em todo o mundo. No perfil do Estado no Twitter, a notícia foi retuitada 4.500 vezes.

 

 

Bolsa tem melhor resultado desde divulgação de gravação de Joesley

Mercado, que já havia reagido à aprovação da reforma trabalhista, sobe 1,57%, com o anúncio de condenação de Lula
Por: Douglas Gavras

 

Douglas Gavras

 

A condenação do ex-presidente Lula pelo juiz Sérgio Moro deu impulso extra à Bolsa ontem. O Ibovespa atingiu o maior patamar desde 17 de maio, quando foi divulgado o áudio da conversa entre Michel Temer e o empresário Joesley Batista, da JBS.

O indicador já operava em alta no momento da notícia, embalado pela aprovação da reforma trabalhista no dia anterior, e fechou o dia com ganhos de 1,57%, aos 64.835,55 pontos. O volume de negócios somou R$ 9,95 bilhões. O dólar reagiu caindo 1,36% e fechou a R$ 3,2090.

A alta da Bolsa privilegiou as ações que melhor refletem o risco político, como as da Petrobrás, que também acompanhavam a alta do petróleo e subiram 3,90% (ON) e 4,95% (PN), respectivamente. Banco do Brasil (ON) subiu 2,85%.

Gustavo Cruz, da XP, lembra que os investidores veem o discurso do ex-presidente Lula, contrário à política econômica do governo, com receio. “A interpretação é que o maior nome contra a agenda econômica atual perdeu pontos, ainda que muito irá acontecer até 2018.”

Para Fabio Silveira, da Macrosector, a reação da Bolsa abre uma oportunidade para que Lula modere o discurso, como em 2003, e deixe claro que está disposto a discutir alguma reforma para a Previdência.

“A condenação do ex-presidente foi entendida como evidência da continuidade de uma agenda considerada importante para o País”, avalia André Perfeito, da Gradual. Segundo ele, a perspectiva para os próximos dias é positiva para a Bolsa, já que as notícias devem ser boas, com inflação baixa e mais queda de juros./ COLABORARAM PAULA DIAS E NIVIANE MAGALHÃES