O Estado de São Paulo, n. 45190, 09/07/2017. Política, p. A6.

 

Fachin tira ‘selo Lava Jato’ de políticos no STF

 Rafael Moraes Moura / Breno Pires

09/07/2017

 

 

De 84 inquéritos instaurados com base nas delações da Odebrecht, 24 ganharam novos relatores; parlamentares comemoram mudança

 

 

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin de redistribuir inquéritos instaurados com base nas delações da Odebrecht faz deputados federais e senadores comemorar a perda do “selo Lava Jato”.

Dos 84 procedimentos autorizados pela Corte, 24 (28,57%) já saíram do gabinete do relator da operação.

Com o repasse dos inquéritos para colegas de Fachin, políticos apostam na redução do desgaste perante a opinião a um ano das eleições.

A Lava Jato virou uma marca negativa para os parlamentares e o descolamento do esquema de desvios na Petrobrás é uma prioridade na estratégia de defesa.

Na Corte, colegas de Fachin avaliam que a redistribuição pode desafogar o gabinete do ministro e dar mais celeridade aos inquéritos fundamentados nas delações de 78 executivos e exexecutivos da empreiteira, cujo conteúdo foi revelado pelo Estado no dia 11 de abril.

Entre os casos que trocaram de relatoria, por consentimento de Fachin e determinação da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, estão suspeitas de fraude nos processos licitatórios de construção da Cidade Administrativa de Minas e do Rodoanel Sul em São Paulo e caixa 2 em eleições.

“A gente precisa separar o joio do trigo. Todo político tem de estar plenamente à disposição para ser investigado, mas você não pode ser envolvido naquilo que você não tem nenhuma relação. Nunca botei o pé na Petrobrás, não tenho nada a ver com a Lava Jato”, disse o deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ). O inquérito que investiga o peemedebista apura contratos da Olimpíada e agora está com Marco Aurélio Mello.

Acusado por delatores da Odebrecht de receber caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014, o deputado Jutahy Magalhães Júnior (PSDB-BA) disparou mensagens a conhecidos e jornalistas pelo celular para comemorar a troca de relator. “Fora da Lava Jato. Agora é definitivo”, escreveu o tucano após a decisão de Fachin.

 

Imagem. O advogado Daniel Gerber, que defende o ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil, e o deputado Marco Maia (PT-RS), obteve decisão favorável à redistribuição do inquérito que apura desvio de recursos em obras do metrô de Porto Alegre. “Existe um selo do qual todos querem estar distantes, mas, ao fim e ao cabo, a existência de investigação já prejudica. Então, independentemente de ser ou não Lava Jato, temos de buscar a Justiça e trabalhar com a possibilidade de arquivamento”, afirmou.

O senador Dalirio Beber (PSDB-SC) também reconhece danos à imagem. “Prejuízo em função disso eu já tive e continuo tendo. Já estou pagando um preço. Espero muito em breve ter esse episódio esclarecido”, disse o tucano, cujo inquérito foi entregue a Rosa Weber. Ele é acusado de participar de um encontro em que foram tratados repasses de R$ 500 mil a um candidato a prefeito de Blumenau.

O Estado apurou, porém, que houve caso de parlamentares que decidiram não pedir a redistribuição por temor de que o sistema eletrônico do STF sorteasse como novo relator um ministro da Primeira Turma, colegiado considerado mais duro em suas decisões que a Segunda Turma – à qual pertence Fachin. Além disso, nem todos os pedidos de redistribuição são aceitos por Fachin.

 

Relator. Fachin comanda Lava Jato

 

FORA DA LAVA JATO

● Dos 84 inquéritos instaurados no Supremo com base nas delações da Odebrecht, 24 foram redistribuídos na Corte

84

INQUÉRITOS

24

REDISTRIBUÍDOS

 

Por ministro

Luiz Fux -  4

Gilmar  Mendes -  4

Luís Roberto Barroso -  4

Rosa Weber -  3

Alexandre de Moraes -  3

Ricardo Lewandowski -  2

Dias Toffoli -  2

Marco Aurélio Mello - 1

Celso de Mello -  1

Os inquéritos redistribuídos dizem respeito aos seguintes políticos, entre outros:

 

Ministros

Aloysio Nunes

PASTA

Relações Exteriores

PARTIDO

PSDB-SP

 

Ministros

Eliseu Padilha

PASTA

Casa Civil

PARTIDO

PMDB-RS

 

Ministros

Gilberto Kassab

PASTA

Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações

PARTIDO

PSD-SP

 

Deputados federais

Nomes/Partidos

Betinho Gomes - PSDB-PE

Carlos Zarattini  - PT-SP

Daniel Vilela PMDB-GO

Dimas Fabiano PP-MG

Fábio Faria PSD-RN

João Carlos Bacelar PR-BA

José Carlos Aleluia DEM-BA

José Reinaldo PSB-MA

Julio Lopes PP-RJ

Jutahy Júnior PSDB-BA

Marco Maia PT-RS

Paulo Pereira da Silva SD-SP

Pedro Paulo PMDB-RJ

Vicente Cândido PT-SP

Yeda Crusius PSDB-RS

 

Senadores

Aécio Neves - PSDB-MG

Antonio Anastasia PSDB-MG

Dalirio Beber PSDB-SC

Eduardo Braga PMDB-AM

José Serra PSDB-SP

Omar Aziz PSD-AM

 

 

Governador

Nome

Robinson Faria

Estado

Rio Grande do Norte

Partido

PSD

 

Secretário de governo

Nome

Arnaldo Jardim*

Pasta

Agricultura e Abastecimento de São Paulo

Partido

PPS-SP

 

Prefeitos

Nome

Napoleão Bernardes

Cidade

Blumenau

Partido

PSDB-SC

 

Nome

Rosalba Ciarlini

Cidade

Mossoró

Partido

PP-RN

 

*O deputado federal se licenciou para atuar como secretário no governo Alckmin

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Ministros veem maior controle sobre inquéritos

Rafael Moraes Moura / Breno Pires

09/07/2017

 

 

A redistribuição dos inquéritos é elogiada por integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF). Para o ministro Gilmar Mendes, a livre distribuição dos processos permitirá o surgimento de “múltiplas visões do problema”, uma vez que diversos gabinetes cuidarão dos casos.

“Haverá gabinetes mais lentos, outros mais rápidos, mas a redistribuição permite um maior controle. Isso poupa o relator (Edson Fachin) dessa sobrecarga e permite um controle geral da matéria pelos diversos ministros do STF”, afirmou Gilmar ao Estado. Sobre a tramitação dos processos, Gilmar disse que todos os inquéritos têm “prioridade total” no gabinete.

O ministro Marco Aurélio Mello vê com “bons olhos” a redistribuição.

“Toda centralização é perniciosa. No caso, qualquer um dos 11 ministros estará habilitado a funcionar como relator”, disse.

Marco Aurélio reconheceu que o estigma de “investigado na Lava Jato”, que paira sobre políticos, pode despertar os ânimos da opinião pública, mas garante que isso não influencia os juízes. “Processo não tem capa, tem conteúdo”, afirmou.

Até sexta-feira, Gilmar, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso foram os ministros que receberam mais inquéritos redistribuídos da Odebrecht – quatro cada um .

Com quase 30% já redistribuídos, a lista de inquéritos baseados na Odebrecht ainda pode ter mais trocas de relator, diante de eventuais pedidos formulados pela defesa ou pelo próprio Ministério Público Federal (MPF). É com base nessas manifestações que Fachin decide se tem ou não a prevenção para seguir relator do caso.