A encruzilhada de Temer

João Domingos

20/05/2017

 

 

O presidente Michel Temer está numa encruzilhada. Ou renuncia, dizendo que não tem apego a cargos, que não precisa de foro privilegiado porque tem consciência de todos os seus atos, ou insiste em permanecer à frente da chefia de Estado e de governo e paga para ver o que acontecerá. Como toda aposta, poderá vencer ou perder. Uma certeza há: o preço será alto.

Na hipótese da renúncia, agora mais remota, porque já disse que não o fará, Temer poderá dizer que abandona a Presidência porque quer unificar o País, não dividi-lo. E que sua missão à frente do governo foi a de fazer as reformas que tragam de volta o equilíbrio das contas públicas. Algumas já conseguiu, como a do teto de gastos e a terceirização da mão de obra.

Outras, como a da Previdência e a trabalhista, estão bem encaminhadas. É bastante provável que a crise arrefecerá e a economia voltará a seu caminho natural, com a inflação baixa, queda nos juros e alguma melhoria na geração de empregos.

Ponto para a biografia de Temer. O presidente da Câmara assume interinamente os destinos da Nação e, em um mês, o Congresso elege um novo presidente e um vice. Provavelmente, alguém do grupo que está hoje no poder.

(Alguém pode perguntar: falar em renúncia por quê? Temer já disse que não renunciará. Acontece que a política não é uma ciência exata nem o político é totalmente dono de suas vontades. Muitas vezes a maré dos acontecimentos o leva para caminhos impensados. O estadista costuma saber a hora de fazer a opção).

Caso Temer aposte em permanecer na Presidência, o que é mais provável, o tempo de sacrifícios se imporá. Ele, que praticamente já tinha fechado apoio suficiente para aprovar as reformas da Previdência e trabalhista, terá, a partir de agora, de buscar ajuda para se sustentar no cargo. Será um recomeço difícil. Alguns partidos que deram apoio ao governo até agora podem desembarcar definitivamente. Um deles é o PSB, dono de 35 votos na Câmara e sete no Senado.

No cargo, Temer dará ainda uma bandeira aos partidos de oposição, que vão às ruas insistir para que saia.

Sem contar que Temer terá de se defender das acusações feitas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, da suspeita de crimes de corrupção passiva e obstrução aos trabalhos da Justiça. Um presidente da República investigado é sempre um problema. Para ele e para o País.

O encontro do empresário Joesley Batista com Temer, ocorrido tarde da noite, no início de março, e que deu origem à investigação, registra conversas para lá de esquisitas. Se delas não se pode concluir que Temer estava dando aval para a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), como insiste o MP, não é possível achar que o encontro foi normal. Numa intimidade estranha, porque todo mundo que conhece Temer sabe o quanto ele é reservado e o quanto se mantém distante, Joesley fala que está sendo investigado, que tem um juiz na mão, um procurador espião, para o qual paga R$ 50 mil, e assim vai. Temer às vezes fica calado, às vezes murmura alguma coisa. Não é uma conversa republicana. Nos lembra que valores morais e éticos devem valer para todos.

Quanto à JBS e aos irmãos Joesley e Wesley, que delataram o mundo da política, falaram em U$ 150 milhões para Lula e Dilma Rousseff em contas no exterior, compra de parte da legislação brasileira, tráfico de influência, cala-boca em presos, parecem ter se destacado no mar de lama dos últimos tempos. Até na suspeita de que transformaram o acordo de delação num grande e lucrativo negócio e, depois, deram uma banana para o Brasil e foram tocar a vida nos Estados Unidos.

_____________________________________________________________________________________________

Partido buscam uma saída negociada 

Alberto Bombig, Pedro Venceslau e Ricardo Galhardo

20/05/2017

 

 
Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, seria a continuidade da política econômica

Partidos aliados de primeira hora do presidente Michel Temer buscam uma saída negociada com o Planalto que seja uma continuidade do que, para eles, vem dando certo no atual governo. Diante da perspectiva de agravamento da crise deflagrada pelas delações da JBS, líderes de siglas como PSDB, PMDB e DEM pretendem bloquear qualquer iniciativa de realizar eleições diretas por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e articulam um nome de consenso para uma eventual disputa indireta no Congresso.

Nas últimas horas, ganhou força o nome de Henrique Meirelles, ministro da Fazenda de Temer, como uma alternativa viável para manter a base unida e a bandeira das reformas hasteada.

Se Temer renunciar, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), terá 30 dias para convocar o pleito, que contará apenas com senadores e deputados no colégio eleitoral.

Principal aliado do governo, o PSDB ensaiou uma debandada após a divulgação do áudio da conversa entre o Joesley Batista, da JBS, e Michel Temer, mas recuou após um pedido de tempo para a construção de um consenso que evitasse a implosão da base e comprometesse as reformas.

Meirelles é filiado ao PSD, partido liderado por Gilberto Kassab, ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicação. Ele tem sido assediado por políticos para aceitar a missão. Os outros nomes ventilados nos bastidores da Congresso são o próprio Rodrigo Maia e o senador tucano Tasso Jereissati (CE).

Meirelles tem a seu favor a condução da política econômica, que começa a apresentar os primeiros resultados, e também um bom trânsito com setores da oposição.

Pressão. Na conversa que teve com Temer anteontem, Jereissati, que assumiu a presidência interina do PSDB no lugar do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), disse ao presidente que a sigla não tomaria nenhuma “medida precipitada”, mas esperaria e dialogaria com o governo antes de tomar qualquer medida.

Em entrevista ontem à rádio CBN, o tucano afirmou que não existe “apoio incondicional” a Temer. “Deixamos claro na conversa que o momento é grave.

Disse que não tomaríamos medida precipitadas, mas aguardaríamos os desdobramentos”, afirmou Jereissati.

Diretórios. Enquanto a cúpula do PSDB atua para evitar a implosão das reformas, a base do partido pressiona pelo rompimento com o governo. Diretórios estaduais do partido em todo o País estão se reunindo para ter posição oficial sobre o tema.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, o partido já se posicionou pelo desembarque. O diretório paulista vai se reunir na segunda-feira e deve seguir o mesmo caminho. “São Paulo não pode assistir a esse debate sobre ficar ou não no governo de camarote. Eu penso que é preciso recomeçar do zero e convocar eleições”, disse o deputado Pedro Tobias, presidente do PSDB paulista.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, por sua vez, optou por manter distância do movimento dos aliados.

Presidente do DEM, o senador José Agripino (RN) afirmou que qualquer decisão da legenda será tomada em conjunto com o PSDB. “Se Temer renunciar, Rodrigo Maia assume por 30 dias. Aí será o momento de criar o consenso.” PPS. Um dia depois de deixar o Ministério da Cultura, o presidente licenciado do PPS, Roberto Freire, disse que o partido não rompeu com o governo e vai continuar apoiando a aprovação das reformas no Congresso.

Ele deve retomar a sua vaga como deputado federal. O posicionamento de Freire contraria a nota divulgada pelo partido na noite de quinta-feira, dizendo que, tendo em vista a “gravidade” das delações da JBS envolvendo Temer, o PPS havia decido “deixar o governo federal”.

_________________________________________________________________________________

Delações podem levar Supremo a uma situação inusual

Eloísa Machado de Almeida

20/05/2017

 

 

O procurador-geral da República solicitou a abertura de inquérito contra Aécio Neves, Michel Temer e Rodrigo Loures pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva, organização criminosa e obstrução à justiça. A instauração de inquérito foi autorizada pelo ministro Edson Fachin “para apurar atos sob suspeição” e trouxe para dentro do Supremo Tribunal Federal informações sobre uma possível atuação – do lado de fora do tribunal – de alguns de seus ministros.

Os depoimentos de Joesley Batista, prestados em colaboração premiada, apresentam uma versão na qual, dentre outras condutas, os investigados estariam se movimentando para impedir avanços da Lava Jato ou dificultar suas investigações, gerando a acusação de obstrução de justiça.

De acordo com o inquérito da Procuradoria- Geral da República, isso se daria por meio da aprovação de medidas legislativas contrárias à Operação Lava Jato, como o projeto de lei de abuso de autoridade; ou ainda por influência junto a delegados federais responsáveis por investigações. Nos depoimentos e gravações de áudios que dão embasamento ao inquérito policial, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, ambos ministros do Supremo, são citados como participantes desses arranjos.

Por ora, é importante ressaltar, trata-se apenas de um inquérito em etapa inicial de apuração e os ministros do Supremo não são sequer investigados. Porém, há uma possibilidade de que, com o avanço das investigações, fique exposta alguma participação de ministros do Supremo em ações que podem ser consideradas criminosas.

Se isso ocorrer, o tribunal estará diante da inusual situação de precisar apurar condutas de seus ministros já que, pela Constituição, eles são julgados pelo próprio Supremo na hipótese de cometimento de infrações penais comuns.

*PROFESSORA E COORDENADORA DO SUPREMO EM PAUTA FGV DIREITO SP

 

O Estado de São Paulo, n. 45140, 20/05/2017. Política, p. A6