Barroso libera para julgamento ações que tratam de eleição diretas

Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro e Luísa Martins

23/05/2017

 

 

Com o agravamento da crise política e chance de afastamento do presidente da República, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional começaram a discutir a possibilidade de eleições diretas para substituir o presidente Michel Temer, o que, hoje, pela Constituição Federal, ocorreria por eleição indireta pelo Legislativo. Na Câmara, a base trabalha para evitar o avanço de qualquer projeto neste sentido.

No STF, o ministro Luís Roberto Barroso liberou na sexta-feira para julgamento ação sobre a possibilidade de eleições diretas em caso de cassação eleitoral de prefeitos nos dois últimos anos do mandato. O processo deve ser analisado junto a um outro, ajuizado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e liberado para pauta desde outubro, que discute a mesma situação para o presidente.

Cabe à presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, definir a data para julgamento das ações em plenário. A ação da PGR está pendente desde o ano passado, mas o assunto ganhou força com o debate sobre o que acontece caso Temer seja afastado do cargo por impeachment, renúncia ou cassação via Tribunal Superior Eleitoral (TSE) frente às suspeitas baseadas na delação premiada do grupo JBS.

Grupos de esquerda e movimentos sociais têm levantado a bandeira das "Diretas Já" e pressionam Congresso e Supremo por um posicionamento.

A Constituição Federal prevê que a eleição será indireta se o presidente for afastado a partir do terceiro ano do mandato, como poder ser o caso de Temer. Eleições diretas só se aplicam, segundo a Constituição, quando os cargos de presidente e vice ficam vagos ainda na primeira metade do mandato presidencial.

Para tentar alterar isso, a oposição ao governo Temer defende a aprovação de proposta de emenda à Constituição (PEC) do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) para que os eleitores possam escolher o substituto se a vacância ocorrer até os seis meses que faltam para encerrar o mandato. O projeto entrou como 13º item da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

O governo ainda não tinha orientado a base até a noite sobre qual a estratégia para a comissão: se obstruir a votação, impedir a inversão da pauta para que a proposta não seja nem discutida ou usar a maioria para derrotar o projeto desde o início. Mas levantamento do Valor com integrantes da CCJ e partidos mostra que a proposta dificilmente avançará.

Coordenador da bancada do PSDB na CCJ, o deputado Betinho Gomes (PE) ressaltou que a comissão faz apenas a análise sobre se a PEC não fere as cláusulas pétreas da Constituição - ou seja, se é admissível discutir o projeto. "Mas temos que discutir a conveniência desse debate do ponto de vista político e para nós parece que só servirá para prolongar a crise", afirmou. "É falso dizer que uma eleição direta será a solução para a crise política. A eleição vai parar o país e o Congresso por três meses, além do prazo que levará para a PEC tramitar", disse.

Parlamentares do DEM, PMDB, PP, PRB, PSC, PTB e PSD que fazem parte da CCJ também afirmaram ao Valor que pretendem votar contra a admissibilidade. "É casuísmo votar nesse momento", criticou o líder do PP e integrante da comissão, Arthur Lira (AL). O relator, deputado Esperidião Amin (SC), contudo, é do PP e deu parecer pela aprovação.

Há poucos dissidentes da base abertamente favoráveis à eleição direta. "Só a manifestação popular para sair dessa crise que a gente está", afirmou o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP). "As chances de aprovação aumentaram muito a partir do que vimos na semana passada", disse Lincoln Portela (PRB-MG). Ambos são contra a reforma da Previdência.

Primeiro na linha sucessória, e que assumiria pelo menos temporariamente com o afastamento de Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defende que a PEC pode tratar do próximo mandato, mas que é ilegal tentar mudar a legislação para um caso já em vigor. "Se for para a próxima legislatura pode. Para esta, a Constituição não permite, é inconstitucional", disse.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4260, 23/05/2017. Política, p. A8.