JULGAMENTO À VISTA

Carolina Brígido

André de Souza

Simone Iglesias

28/03/2017

 

 

Relator pede para TSE marcar votação em plenário da cassação da chapa Dilma-Temer

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deve julgar na próxima semana o processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer. Ontem, o relator do caso, ministro Herman Benjamin, enviou o relatório final para os demais integrantes do tribunal, e pediu para incluir o processo na pauta de julgamentos no plenário. Ele telefonou para o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, e ouviu dele a promessa de que convocaria sessões extraordinárias para a realização do julgamento. “Há possibilidade de o julgamento acontecer na próxima semana”, informou a assessoria do tribunal. Advogados da ex-presidente Dilma Rousseff e do presidente Michel Temer reclamaram da pressa em concluir logo o processo.

No Palácio do Planalto, a informação divulgada pelo TSE de que Gilmar está disposto a atender ao pedido de Benjamin causou preocupação e frustrou a expectativa de que o início do julgamento se estenderia um pouco mais. O governo Temer busca evitar que ao menos o ministro Henrique Neves, que deixa o tribunal no dia 16 de abril, vote, já que há sinalizações de que é favorável à condenação da chapa.

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PLANALTO TEME ALGUNS VOTOS

Outro voto que preocupa o Planalto é o da ministra Luciana Lóssio (ela deixa o tribunal dia 15 de maio), que também tenderia à cassação da chapa. A avaliação do governo é que o voto de Benjamin pela condenação da chapa será “muito duro” e, se acompanhado por Neves e Luciana, o placar já seria de três votos, num colegiado de sete ministros.

A Lei Complementar 64, que define os prazos para esse tipo de processo, estabelece que, quando o relatório for liberado para julgamento, depois de três dias é feito pedido de inclusão do caso “para julgamento na primeira sessão subsequente”. Com base nessa regra, Benjamin pediu que fosse marcada a data para o plenário analisar o processo. “Requeiro, assim, a inclusão do feito em pauta para julgamento, nos termos da legislação”, escreveu o relator em ofício enviado ao presidente do TSE.

A chapa é acusada de ter cometido abuso de poder político e econômico na campanha de 2014. O processo foi aberto no TSE pelo PSDB, que saiu derrotado do segundo turno, com a candidatura de Aécio Neves, e hoje integra o governo Temer. Se houver condenação, o presidente da República poderá perder o cargo. Se ficar comprovado que Temer e Dilma sabiam das ilegalidades supostamente praticadas na campanha, ambos podem ficar inelegíveis pelo prazo de oito anos.

Na semana passada, Benjamin já havia enviado um relatório parcial aos colegas. Agora, elaborou uma nova versão, com dados enviados em alegações finais pelo PMDB, PT e PSDB. O documento tem 1.086 páginas e está protegido pelo sigilo. O Ministério Público tem prazo até amanhã para se manifestar no processo.

Entre os ministros do TSE, havia expectativa de que não seria possível realizar o julgamento em abril, porque, recentemente, Benjamin resolveu incluir no processo depoimento de dez delatores da Odebrecht com fatos relacionados às investigações da Operação Lava-Jato. Ao todo, mais de 50 testemunhas prestaram depoimento ao longo do processo. Também foram feitas diligências e perícias — em especial, para investigar se gráficas que prestaram serviço para a campanha eram de fachada.

A defesa de Temer pediu que a prestação de contas dele seja separada da de Dilma. Com isso, os advogados querem colocar apenas do lado da petista as supostas ilegalidades cometidas. Essa tese deverá ser analisada pelo plenário do TSE durante o julgamento.

O advogado Gustavo Guedes, que defende Temer, questionou o calendário do julgamento.

— Não há razão para observância estrita da lei, se o relator não observou outros prazos estabelecidos. Não é razoável que um processo com tantas peculiaridades e da importância que este tem ser julgado neste prazo — disse Guedes.

A defesa de Dilma também criticou a pressa de Benjamin em pautar o caso. Na avaliação do advogado Flávio Caetano, o processo ainda não está maduro para ser julgado, uma vez que não teria sido garantido o direito à ampla defesa. Caso o processo seja levado mesmo a julgamento, sem atender os pedidos da defesa, o advogado de Dilma disse que vai levantar essa questão na sustentação oral, no julgamento.

— Se o ministro não se sensibilizar com os argumentos e levar a julgamento, vamos sustentar isso no plenário. O processo não está maduro para ser julgado, porque ele ofende o contraditório, a ampla defesa — afirmou Caetano.

O advogado destacou que quando foram ouvidas dez pessoas ligadas à Odebrecht, não houve direito à ampla defesa. Ele disse que as testemunhas falaram por 19 horas e 30 minutos. Depois disso, a defesa de Dilma pediu que também fossem ouvidas pessoas mencionadas nos depoimentos. No entanto, só o prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva (PT), que foi tesoureiro da campanha de Dilma em 2014, foi ouvido.

No julgamento, a votação dos sete ministros do TSE começa pelo relator. O último a se pronunciar será o presidente do tribunal. Entre os dois, votam, pela ordem, Napoleão Nunes Maia, que também integra o Superior Tribunal de Justiça; Henrique Neves e Luciana Lóssio, que ocupam as duas vagas reservadas para advogados; e Luiz Fux e Rosa Weber, também ministros do STF.

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Perguntas e respostas

O que o TSE vai julgar?

Há quatro ações apresentadas pelo PSDB que pedem a cassação da chapa vencedora da eleição de 2014 por abuso de poder político e de poder econômico. Elas foram apresentadas quando Dilma era presidente. Como ela sofreu o impeachment, o julgamento poderá levar à saída de Temer do poder.

 

O que alega a defesa de Dilma?

Nega ter recebido doações ilegais, e diz que os gastos de campanha foram regulares. Isso porque, além das fontes de financiamento, também há questionamentos sobre a legalidade de parte das despesas, em especial com gráficas contratadas. A defesa argumenta ainda que não pesa contra a ex-presidente suspeitas de envolvimento direto em pedidos de propina. Dilma pediu a anulação dos depoimentos de ex-executivos da Odebrecht. Os advogados sustentam que o conteúdo dos depoimentos extrapola o objeto das ações.

 

Qual a estratégia da defesa de Temer?

Temer tenta separar as contas, alegando que não tem responsabilidade sobre eventuais ilegalidades cometidas pela titular da chapa. Ele também pediu a nulidade dos depoimentos de executivos e ex-executivos da Odebrecht.

 

O que acontece se houver condenação da chapa?

Dilma fica inelegível. Temer perde o mandato, mas poderá continuar disputando eleições. Isso porque o TSE costuma tornar inelegível apenas o titular da chapa. Caso Temer seja cassado, haverá uma eleição indireta no Congresso para a ocupação do cargo até o fim do mandato, 1º de janeiro de 2019.

 

E se houver condenação com as contas separadas?

Dilma fica inelegível e Temer continua no cargo de presidente da República.

 

Há jurisprudência para separar contas no TSE?

A jurisprudência no STF é que a cassação da chapa afeta o vice, mas ela vem sendo aplicada principalmente a prefeitos. Há um precedente que, embora diferente do caso atual, pode beneficiar Temer. Em 2009, o TSE julgou um caso que envolvia o ex-governador de Roraima Ottomar Pinto, já morto. O tribunal entendeu que as irregularidades não contaminaram o vice Anchieta Júnior, que assumiu o cargo com a morte do titular. Em fevereiro de 2017, o TSE mudou parcialmente uma decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Distrito Federal: manteve a inelegibilidade do ex-governador Agnelo Queiroz (PT), mas absolveu seu vice Tadeu Filippelli (PMDB), que hoje é assessor especial de Temer.

 

As delações complicam a situação dos dois?

Até agora, os depoimentos complicam mais a vida de Dilma Rousseff. Marcelo Odebrecht, por exemplo, afirmou que 80% do doado à campanha foi caixa 2. Ele afirmou que a ex-presidente tinha conhecimento do uso de dinheiro de caixa 2 para pagar o marqueteiro João Santana, responsável por sua campanha à reeleição em 2014, mas que não chegou a conversar diretamente com ela sobre esse assunto. Em relação a Temer, ele disse que não tratou de doações ou propina diretamente com o candidato a vice. Segundo ele, a negociação com o PMDB foi feita por meio do ministro licenciado da Casa Civil, Eliseu Padilha.

O globo, n.30549 , 28/03/2017. País, p.3