Valor econômico, v. 17, n. 4192, 09/02/2017. Política, p. A7

Alvo da Lava-Jato, Lobão comanda CCJ

Senador será responsável por sabatina de Moraes para Supremo

Por: Vandson Lima e Fabio Murakawa

 

Em uma das disputas mais acirradas no PMDB do Senado nos últimos tempos, a 'velha guarda' da legenda venceu. Respaldado pelos padrinhos Renan Calheiros (PMDB-AL), líder da bancada, e pelo ex-presidente José Sarney, Edison Lobão (PMDB-MA) ganhou a disputa interna e comandará a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa pelos próximos dois anos.

À frente do colegiado, caberá a Lobão, citado e/ou investigado por suposta participação em ilícitos diversos, da Petrobras a Belo Monte, passando por Angra 3, organizar a sabatina de Alexandre de Moraes, indicado para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) nas próximas semanas e, mais à frente, o processo de análise do substituto de Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da República (PGR). Eduardo Braga (PMDB-AM) é o mais cotado para ser o relator da indicação de Moraes.

Concorrente de Lobão, Raimundo Lira (PMDB-PB) se retirou da disputa acusando "ingerências externas" no processo. "Não do governo", adiantou-se. Questionado se falava de Sarney, respondeu: "Não sou eu que estou dizendo".

Abatido, Lira se negou a levar a decisão a voto dentro da bancada do PMDB, de 21 senadores. Ele queria fazer a disputa diretamente na CCJ, um colegiado suprapartidário. Mas só poderia fazê-lo se Renan o indicasse a uma das vagas na comissão. O líder deixou claro que não lhe daria essa possibilidade.

Dizendo não se sentir constrangido a ocupar o cargo, mesmo citado na Lava-Jato, Lobão prometeu acelerar os trâmites para votar a indicação de Alexandre de Moraes para a vaga de Teori Zavascki no STF. Pelos cálculos do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), a sabatina e votação em plenário deve ocorrer em 22 de fevereiro.

Ontem, os partidos decidiam os nomes que comporão a CCJ. O PMDB, maior bancada, ficará com sete cadeiras: além do presidente Lobão e do relator Braga, Simone Tebet (MT), Marta Suplicy (SP), José Maranhão (PB), Jader Barbalho (PA) e Valdir Raupp (RO) - os dois últimos aparecem na Lava-Jato, assim como os suplentes Renan e Romero Jucá (PMDB-RR). O PSDB também apresentou indicados: Aécio Neves (MG), Antonio Anastasia e Aloysio Nunes (SP).

Lobão teve dois inquéritos arquivados e é alvo de outros dois. Por ter foro privilegiado, será julgado pelo STF se as investigações se converterem em processo.

O senador maranhense foi citado em delação do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, por supostamente solicitar R$ 2 milhões em propina para campanha eleitoral da ex-governadora Roseana Sarney, em 2010. O então ministro do Supremo Teori Zavascki arquivou o inquérito no ano passado, por falta de provas.

"Os dois primeiros inquéritos, verdadeiramente da Lava-Jato, foram arquivados", afirmou Lobão enfaticamente. Questionado sobre outros inquéritos, respondeu, seco: "Isso são outras questões. A investigação não deve causar constrangimento a ninguém. É a forma, inclusive, de poder demonstrar que não se é responsável por aquelas alegações".

Um dos inquéritos em que Lobão ainda é investigado apura fraudes na Petrobras articuladas por um grupo do PMDB. O segundo investiga desvios em obras das usinas de Belo Monte e Angra 3, quando ele era ministro das Minas e Energia do governo Dilma Rousseff. "Se hoje há alguma alegação caluniosa contra mim, é bom investigar para que não haja calúnia", afirmou.

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ESCOLHA SEGUE ROTEIRO ANUNCIADO POR SÉRGIO MACHADO

Por: Raymundo Costa

 

Coincidência ou não, a escolha do senador Edison Lobão (PMDB-MA) segue rigorosamente o roteiro das gravações de áudio feitas pelo ex-senador Sérgio Machado a fim de conseguir um acordo de delação premiada com a Justiça Federal em Curitiba. Nos áudios, líderes do PMDB são flagrados tecendo uma trama para abafar a Lava-Jato.

À época, Lobão respondia a quatro inquéritos decorrentes da investigação. Um deles foi arquivado ainda no ano passado pelo ministro Teori Zavascki, morto em um acidente aéreo. Lobão não foi gravado por Machado, mas entra no enredo como legítimo representante do ex-presidente e ex-senador José Sarney.

O ex-presidente tem um papel central nas gravações. Ora aparece defendendo a necessidade de um "acordo geral" para abafar a Lava-Jato, ora dando conselhos sobre como atrapalhar as investigações de Curitiba. "Importante agora se nós pudermos votar que só pode fazer delação solto".

Outro protagonista das gravações de Machado, Renan Calheiros, à época presidia o senado e agora lidera a bancada do PMDB, que ontem escolheu Lobão para presidir a CCJ. Nos áudios, concorda sobre a aprovação de um projeto que impedisse pessoas presas de fazer delação premiada, o que tem sido um dos principais instrumentos da Lava-Jato.

"Isso é uma maneira sutil que toda a sociedade compreende que isso é uma tortura", diz Renan, justificando a iniciativa. No Congresso, atualmente tramitam mais de uma dezena de projetos que tratam do assunto, mas também de novas fórmulas para os acordos de leniência, também tratadas nos áudios de Machado.

Renan na liderança da maior bancada, os 21 senadores do PMDB, Lobão na presidência da CCJ, que dá a partida à tramitação das leis no Senado, outro senador no script de Machado ganhou mais poder desde as gravações: Romero Jucá (RR), que após a destituição de Dilma foi ministro do Planejamento nos primeiros dias do governo Michel Temer e caiu justamente pode ser ouvido nos áudios dizendo que era preciso "estancar a sangria" da Lava-Jato.

Jucá não é mais ministro, mas continua com influência no Planejamento e virou líder do governo no Congresso, o líder que vai encaminhar a favor da aprovação do nome do ministro licenciado da Justiça, Alexandre Moraes, para a vaga de Teori Zavascki.

No enredo traçado pelas gravações de áudio, Sérgio Machado sugere a Sarney que o PMDB deve se aproximar de Teori Zavascki, então o relator da Lava-Jato. Sarney responde que o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Cesar Asfor Rocha poderia ser procurado, pois era muito próximo de Teori. "Tem total acesso ao Teori".

Em outra gravação, em conversa na qual estava presente também Renan Calheiros, o ex-presidente diz que o atual líder do PMDB fizera "uma lembrança que pode substituir o César", um prestigiado advogado de Brasília. Renan adverte que deveria ser "uma coisa confidencial", para ficar apenas entre os três.

Ouvidos hoje, os áudios de Machado parecem dispensar a clássica advertência de que qualquer semelhança com fatos da vida real seria mera coincidência. Mas um delator da Lava-Jato avisou recentemente os investigadores de Curitiba: eles precisavam se preparar para lidar com os verdadeiros profissionais da política. Perto do PMDB, a turma de Dilma era fichinha.

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Moraes percorre Senado em busca de apoio a nomeação

Por: Fabio Murakawa, Vandson Lima, Andrea Jubé e Luísa Martins

 

Indicado pelo presidente Michel Temer para ser ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes fez ontem um périplo pelo Senado, que dará a última palavra sobre sua nomeação para a vaga deixada por Teori Zavascki na mais alta Corte do país.

Moraes esteve com o presidente da Casa, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), líder da maior bancada do senado, e com a bancada do PSDB - partido ao qual era filiado até anteontem, quando sua indicação foi oficializada no "Diário Oficial".

No encontro com os tucanos, no gabinete do senador Aécio Neves (MG), o provável futuro ministro do Supremo fez um apelo: "Não se pode discriminar o fato de ter atividade jurídica e ter atividade política".

A frase pôde ser ouvida por repórteres do lado de fora da reunião. Moraes buscava, assim, repelir as afirmações de que sua nomeação é inadequada por conta de sua militância política e da proximidade com o presidente Michel Temer e a cúpula do governo, citados em delações na Lava-Jato. Ele será o revisor dos processos da Operação que tramitam na Corte, caso seja aprovado primeiro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que irá sabatiná-lo, e, depois, pelo plenário do Senado.

Momentos antes, ao sair do encontro com o presidente do Senado, Moraes afirmou que pretende fazer um corpo a corpo com todos os 81 senadores, a fim de defender sua nomeação.

"A partir da indicação oficial, ontem [anteontem] foi publicada no 'Diário Oficial', a documentação já chegou ontem [anteontem] à tarde, vim fazer uma primeira visita, apresentar minhas credenciais, meu currículo", disse Moraes. "A partir de agora, vou visitar os 81 senadores, não só os senadores da CCJ, porque é constitucionalmente a função do Senado analisar meu currículo, minha experiência para votar eventual aprovação."

Presidente do PSDB, Aécio rechaçou que a ligação de Moraes com os tucanos o coloque em posição de desconfiança.

"Mais 30% dos ministros dos últimos 20 anos tinham filiação ou serviram a governo. Isso não é demérito algum", avaliou Aécio. "Um dos mais homenageados e completos ministros é Celso de Mello, que assessorou o presidente [José] Sarney até o momento de sua nomeação."

Enquanto Temer diz que o substituto de Moraes sairá de sua "cota pessoal", a saída de Moraes da Esplanada dos Ministérios para o Supremo abriu uma disputa entre PMDB e PSDB pelo cargo. Aécio procurou negar que o PSDB esteja requisitando manter o posto. "O PSDB não pressiona. Disponibiliza seus quadros. O partido não constrangerá o presidente em busca de nomeações", disse o senador.

Um senador tucano, em conversa com o Valor, também disse que o partido não vai pressionar Temer. Mas afirmou que o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) "seria um excelente nome" para o ministério.

Primeiro vice-presidente da Câmara, o deputado Fábio Ramalho (PMDB-MG), por sua vez, afirma que o partido do presidente está "insatisfeito". E queixou-se do fato de que seu Estado não tem nenhum ministro no atual governo.

"A bancada de Minas deu 47 votos para o impeachment", disse, referindo-se à votação que, em 17 abril do ano passado, deu início ao processo que levou à cassação de Dilma Rousseff.

Ramalho trabalha para que Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), a quem define como "um grande criminalista", substitua Moraes. Outro nome cogitado entre os deputados pemedebistas para assumir o ministério é o de Osmar Serraglio (PMDB-PR).

Ontem, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que congrega mais de 14 mil juízes em todo o país, manifestou-se favorável à nomeação de Moraes.

Para a entidade, a indicação "demonstra a preocupação" de Temer "com a qualidade técnica na composição da Corte (...), pois Alexandre de Moraes há muito vem construindo uma sólida carreira jurídica".

A nota pormenoriza os passos da carreira de Moraes, citando suas conquistas nas áreas acadêmica, docente e política.

"Sua capacidade técnica certamente o credencia para a condução dos processos existentes na Corte constitucional, sobremaneira nas ações que inquietam a sociedade brasileira e exigem pronta resposta do Poder Judiciário, como é o caso da operação Lava Jato", diz o texto, assinado pelo presidente da entidade, Jayme de Oliveira.