Crivella quer rever contratos e garante: "É proibido gastar"

Cristian Klein, André Ramalho, Robson  Sales e Rodrigo Carro

31/012

 

 

Com muitas citações a Deus, à família e a ensinamento do tio, o bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), o novo prefeito do Rio Marcelo Crivella (PRB) tomou posse ontem na Câmara Municipal e anunciou a determinação de austeridade, justificada pela crise econômica. "É proibido gastar", afirmou, pela manhã, no discurso para a casa legislativa no qual fez menções exaustivas a cada área de governo e agradecimentos a categorias profissionais ou religiosas, de garçons a médicos, de judeus e católicos a evangélicos, sua base social.

Para a área econômica, Crivella - bispo licenciado da Universal - adiantou, sem entrar em detalhes, que a secretária de Fazenda, Maria Eduarda Gouvêa Berto, será responsável por uma reforma tributária, para tornar o "regime mais justo, buscando maior correspondência entre os níveis de contribuição e a capacidade contributiva". Depois, especificamente sobre IPTU, disse: "A ideia não é aumentar o IPTU e sim adequar a contribuição de acordo com a capacidade do contribuinte. Se for necessário rever a planta de valores, vamos fazer isso".

Em edição extraordinária do Diário Oficial de ontem, com 78 decretos, Crivella estabeleceu a meta de corte de 50% dos cargos comissionados, com a expectativa de economizar R$ 300 milhões por ano. Por outro lado, o prefeito se dispõe a estudar a "eventual municipalização" de uma gama de políticas e órgãos estaduais, como o Maracanã, o Theatro Municipal e o Museu da Imagem e do Som (MIS), por meio de parcerias público-privadas, além das 16 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).

Entre a série de medidas, estão ainda a exigência para que a Secretaria de Saúde amplie em 20% até o fim de 2018 o número de leitos nos hospitais municipais, o fim do processo de "racionalização das linhas de ônibus" implantado pelo ex-prefeito Eduardo Paes (PMDB), a revisão de diversas despesas criadas nos últimos oito meses, e auditoria sobre o critério de seleção e o desempenho das organizações sociais (OSs) de saúde. Quanto aos subsídios dados como contrapartida à instalação de ar-condicionado em ônibus, disse: "É preciso conferir se esses subsídios estão gerando emprego, arrecadação".

Apesar da revisão de políticas do antecessor, Crivella protagonizou com Paes, à tarde, na transmissão do cargo, uma cerimônia amistosa, com troca de elogios. O pemedebista, cujo governo foi criticado pelo então senador durante a campanha eleitoral, lembrou que desde 1996 não se fazia no Rio o ato da passagem do cargo entre ex e atual prefeito. Crivella qualificou o antecessor de "grande prefeito".

A cerimônia no Palácio da Cidade, onde os secretários foram empossados, refletiu o ecletismo dos grupos políticos e dos apoios recebidos por Crivella. Na primeira fila, além do governador Luiz Fernando Pezão, estava o cardeal Dom Orani Tempesta, arcebispo da cidade. No meio da plateia, o pastor Silas Malafaia, alvo de condução coercitiva pela Polícia Federal, há duas semanas, mereceu uma homenagem, quando Crivella saudou os evangélicos em seu nome. "Preciso de sua ajuda no dia a dia. Vamos continuar no Whatsapp. O Rio de Janeiro precisa de fé", disse. Neta do sambista Cartola e de dona Zica, da Mangueira, Nilcemar Nogueira, titular da Cultura, fez um discurso em nome do secretariado feminino, que lidera quatro das 12 pastas. Indio da Costa (PSD) falou em nome da ala masculina.

Em sua vez, Crivella fez piada ao lembrar eleitor que durante a campanha dizia que agora, na terceira tentativa, ele ganharia a prefeitura, por conseguir o apoio "do Indio ao cardeal".

Mais cedo, na Câmara, Crivella anunciara que apoiará 'startups' em um centro na região do Porto Maravilha. Em mensagem direta aos empresários fornecedores da prefeitura, os conclamou a colaborar "para superarmos a crise", reduzindo seus lucros. "Reconheço no lucro o prêmio da eficiência e o motor da atividade econômica. Mas o momento requer diminuir a margem, dividindo o sacrifício com seus fornecedores em cadeia, de tal forma que, uma vez diluída a parcela do ajuste, não se prejudique a qualidade dos serviços prestados ao nosso povo", disse.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4164, 31/12/2016. Política, p. A5.