Câmara aprova PEC do teto em segundo turno

 

26/10/2016
Antonio Temóteo

 

A Câmara dos Deputados aprovou, ontem, em segundo turno, o texto base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 241, de 2016, com 359 votos favoráveis, sete a menos do que no primeiro turno, 116 contra e duas abstenções. O texto limita o crescimento dos gastos públicos e, apesar das traições da base aliada, o Palácio do Planalto comemorou a vitória. O porta-voz da Presidência, Alexandre Parola, disse que o presidente Michel Temer acompanhou com “satisfação” a aprovação da PEC. “Os votos obtidos refletem não apenas o convencimento em torno da iniciativa que todos sabemos que é essencial para a reconstrução da economia brasileira, mas indica também a existência de um consenso sólido em torno do prosseguir”, disse o porta-voz, em nome de Temer.

Até o fechamento desta edição seis destaques ainda não haviam sido votados pelos parlamentares e o governo trabalhava para barrar a aprovação de todos. A matéria segue agora para o Senado, que pretende deliberar sobre o tema em plenário em 29 de novembro e 13 de dezembro.

Mais uma vez, a oposição tentou obstruir a votação da matéria, mas foi derrotada pela base aliada, que precisava juntar pelo menos 308 votos favoráveis à proposta. A sessão foi interrompida diversas vezes por gritos de pessoas que ocupavam a galeria do plenário da Câmara, a maioria jovens. Muitos deles foram levados ao local pelo deputado Weliton Prado (PMDB-MG), que votou contra a PEC. Todos foram retirados pelos policiais legislativos. Xingamentos contra os parlamentares e contra o presidente  Michel Temer eram ouvidos por quem acompanhava a deliberação.

 

Regras

A PEC estabelece como limite para o aumento dos gastos públicos, em cada exercício, a inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior. Para 2017, será utilizada a taxa de 7,2%, prevista na proposta orçamentária. Para o relator da proposta, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), o governo teve mais uma vitória expressiva, mesmo com a redução do número de parlamentares favoráveis.

O prazo de vigência da PEC será de 20 anos, com possibilidade de alteração a partir do décimo ano. O texto aprovado exclui os gastos com saúde da regra do teto até 2018. Além disso, para 2017, foi aumentado de 13,2% para 15% da receita corrente líquida (RCL) o percentual mínimo que o governo precisa destinar a essa área. O reajuste do salário mínimo pela inflação está assegurado. Mas há vedações para aumentos superiores à inflação em caso de descumprimento do teto pelos Poderes. O texto ainda prevê que, em caso de violação do limite, os servidores terão os salários congelados, sem direito sequer à reposição inflacionária hoje garantida pela Constituição.

As despesas com saúde e com educação continuarão respeitando o mínimo constitucional em 2017 e, a partir de 2018, passarão a ser corrigidas pela inflação. No caso da saúde, os dispêndios ficarão em torno de R$ 112 bilhões, acima dos R$ 95 bilhões previstos para este ano.

 

Estratégia

O presidente Michel Temer participou das articulações para aprovação da matéria e, novamente, exonerou ministros para que reassumissem temporariamente os mandatos e engrossassem o placar a favor da proposta. Os ministros das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), e o de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho (PSB-PE), estiveram ontem na Câmara, mas nem isso impediu que traições ocorressem.

Além das articulações políticas, o Planalto manteve a estratégia de divulgar vídeos de integrantes da equipe econômica com manifestações favoráveis à PEC. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que a aprovação da medida coloca o Brasil na rota do crescimento sustentável. Ele ainda afirmou que a medida não terá efeito se a duração dela for menor que os 20 anos propostos. “Se fizéssemos um prazo muito curto, digamos metade desse, no momento em que a dívida começasse a se estabilizar para cair, já estaria terminado o prazo de vigência da PEC. Portanto, o efeito na economia seria inócuo. Nós faríamos um esforço grande para morrer na praia”, disse.

Apesar da vitória na Câmara, o temor de vários parlamentares é de que a tramitação do texto no Senado Federal seja emperrada diante da crise gerada pela prisão de quatro policiais legislativos. O presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), criticou duramente a ação da Justiça e uma reunião de emergência entre os chefes dos Três Poderes foi convocada para hoje às 11h, para aparar as arestas.

Líder do governo da ex-presidente Dilma Rousseff na Câmara, José Guimarães (PT-CE) afirmou que a PEC 241 traz prejuízos para país. “Não se faz ajuste desse jeito em nenhum país do mundo. Esse ajuste fiscal penaliza os de baixo, não mexe na despesa financeira da dívida, não mexe em nada, só corta daqueles que precisam das políticas públicas”, argumentou.

 

Manobras

Para garantir tramitação breve da Pec no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), fechou um acordo com os líderes partidários, incluindo a oposição. Em contrapartida à concessão das datas estabelecidas pelo presidente do Senado, a oposição pleiteou uma audiência pública, que acontecerá em 8 de novembro.  Sem perder o apoio da base de vista, o presidente Michel Temer usará do mesmo artifício com que operou na Câmara dos Deputados e convidou os senadores para um jantar em 10 de novembro. A data coincide com a votação do projeto na comissão e abre a semana de discussões da PEC no plenário, anterior à votação em primeiro turno.

 

Correio braziliense, n. 19511, 26/10/2016. Economia, p. 6