O buraco da Previdência e como caímos nele

Cláudio Damasceno

17/06/2016

 

 

Seminário realizado semanas atrás pela Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Privada (Abrapp) trouxe uma pesquisa com resultados estarrecedores. Um deles: 94% dos brasileiros não têm a menor noção de onde vem o dinheiro para pagar as aposentadorias. E agora que o governo Temer estuda a reforma na seguridade social, percebe-se que um dos seus principais problemas da Previdência é a desinformação. Se é assim, vamos mostrar como foi possível construir tal armadilha.

O agravamento do setor começou com a concepção do atual modelo de pagamento e arrecadação, previsto na Constituição de 1988. Ainda que quase 30 anos atrás não se pudesse prever que a população brasileira envelheceria mais e melhor, ali se deixou de olhar para o restante do mundo. Vários dos países percebiam que para a Previdência pública tornar-se sustentável seria necessário tomar algumas medidas.

Nosso sistema de assistência social beneficia aproximadamente 22 milhões de cidadãos, dos setores público e privado. E não apenas com aposentadorias. Nesta conta entram ainda auxílio-doença, auxílio-acidente, auxílio-adoção, auxílio-reclusão, salário-família e pensão por morte. Mas nem tudo que é arrecadado junto ao contribuinte é ali aplicado.

Uma das causas de deficit são os 20% da DRU (Desvinculação de Receitas da União) subtraídos da Previdência. A situação só piora quando se sabe que a arrecadação para os pagamentos do INSS é aplicada em outros setores do governo — quando é de fato aplicada, porque, se incluirmos a gatunagem nessa conta, veremos que o buraco é mais profundo.

A inclusão dos trabalhadores rurais no seu rol de beneficiários é outro fator para o aperto nas contas. Tal despesa não é Previdência, mas sim Assistência Social. Ainda que se trate de uma questão de humanidade com aqueles que passam grande parte da vida no campo — muitos sequer estão cientes dos seus mais básicos direitos —, a concessão do benefício aumenta o gasto e contribui para o discurso apocalíptico do deficit. Como esses trabalhadores jamais contribuíram com o INSS, a balança se desequilibra. O prato da previdência urbana fica “mais leve”, mesmo sendo superavitária.

Quando se pensa que o rol de problemas acabou, vem o governo é dá sua parcela de desarranjo. A equipe econômica de Dilma Rousseff teve uma ideia formidável para promover o consumo, “esverdear” as contas públicas, consolidar a chamada “Nova Matriz Econômica” e distribuir alegrias: a desoneração bilionária da folha de pagamentos. Tentou-se criar um círculo virtuoso por meio da ingenuidade (ou irresponsabilidade?) monetária. Acreditou-se que, ao desonerar os empregadores, haveria mais contratações de trabalhadores, que assim consumiriam, cujo resultado direto é a arrecadação de impostos que resulta da compra de bens e produtos. Hoje sabemos que deu errado, mas não temos ideia de quanto tempo levaremos pagando a conta.

Fosse somente esse o único efeito do voluntarismo econômico, seria tolerável. O problema é que as desonerações impactaram pesadamente o caixa da Previdência Social. E turbinaram o rombo nas contas do país, que num “cálculo honesto” está em R$ 170,5 bilhões. O governo formou uma comissão para estudar de que forma a Previdência pode ser reformada. Não parece, porém, que esteja na pauta o ataque às causas que tornam eternamente insuficientes os recursos para a seguridade social. Se no topo da lista de medidas corretivas não estiver o combate à má gestão, à concessão de benefícios fiscais incabíveis e ao desvio de finalidade, que diminuem o bolo, tudo será provisório.

Podem elevar para 65 a idade mínima de aposentadoria para homens e mulheres que, em até duas décadas, a rediscutiremos. Também de nada adianta o apoio popular para tal aumento, como aponta pesquisa do Ibope encomendada pela Confederação Nacional da Indústria. Novamente a desinformação induz à ilusão. O Sindifisco Nacional é enfático ao dizer que uma reforma previdenciária, se quiser obter sucesso, deve resumir os recursos arrecadados apenas à finalidade essencial.

CLÁUDIO DAMASCENO
Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional).